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Aécio recebeu caixa 2 via obra da Cidade Administrativa de MG, diz delator da Odebrecht

Aécio durante sessão no Senado em julho de 2016 - Alan Marques - 6.jul.2016/ Folhapress
Aécio durante sessão no Senado em julho de 2016 Imagem: Alan Marques - 6.jul.2016/ Folhapress

Bernardo Barbosa

Do UOL, em São Paulo

12/04/2017 18h35Atualizada em 12/04/2017 19h20

Campanhas eleitorais do senador Aécio Neves (PSDB-MG), ex-governador de Minas, foram abastecidas ilegalmente com R$ 5,2 milhões oriundos de dinheiro público pago à Odebrecht pelas obras da Cidade Administrativa de Minas Gerais, em Belo Horizonte, segundo a delação do ex-executivo da empreiteira Benedicto Júnior e um pedido de abertura de investigação feito pela PGR (Procuradoria-Geral da República).

O relato de Benedicto teve o sigilo suspenso nesta terça-feira (11) pelo ministro Edson Fachin, relator da operação Lava Jato no STF (Supremo Tribunal Federal), junto com outras delações premiadas feitas por ex-executivos do grupo Odebrecht e as solicitações de inquérito feitas pela Procuradoria.

Aécio é alvo de cinco inquéritos abertos a pedido da PGR e autorizados por Fachin. O senador negou, por meio de nota enviada por sua assessoria de imprensa, contrapartidas à Odebrecht por doações de campanha (leia íntegra abaixo). Na terça (11), quando os pedidos de investigação vieram a público, o senador disse considerar importante o fim do sigilo sobre o conteúdo das delações e afirmou que “assim será possível desmascarar as mentiras e demonstrar a absoluta correção de sua conduta”.

Cidade Administrativa Presidente Tancredo Neves, em Belo Horizonte - Alex de Jesus - 4.mar.2010/O Tempo - Alex de Jesus - 4.mar.2010/O Tempo
Cidade Administrativa de Minas Gerais em 2010, quando foi inaugurada
Imagem: Alex de Jesus - 4.mar.2010/O Tempo

Benedicto --também conhecido como BJ--, contou ter autorizado a Odebrecht a pagar um valor correspondente a 3% da participação da companhia no contrato da Cidade Administrativa, "sob a alegação de que seria destinado às campanhas futuras de Aécio Neves". A construtora integrou o consórcio que ganhou o lote 2, no valor de R$ 367.665.732,05.

Segundo a PGR, a Odebrecht recebeu cerca de R$ 90 milhões pelas obras, dos quais R$ 5,2 milhões foram revertidos em propina. Os pagamentos foram organizados por Sérgio Neves, então diretor superintendente da Odebrecht em Minas Gerais, e por Oswaldo Borges da Costa Filho, então presidente da estatal mineira Codemig (Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais), “utilizando-se da equipe de Hilberto Silva”, diz o depoimento.

Hilberto comandava o Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht --na prática, um departamento criado apenas para o pagamento de propinas a agentes públicos.

Já Oswaldo seria casado com uma filha do padrasto de Aécio, segundo BJ. A proximidade entre Oswaldo e Aécio não deixou dúvidas, para o ex-executivo da Odebrecht, de que os pagamentos tinham o senador como destinatário, diz a PGR. De acordo com Benedicto, vários pagamentos foram feitos em uma concessionária de carros em Belo Horizonte da qual o ex-presidente da Codemig é dono.

Segundo informações disponíveis no site da Codemig, a empresa foi a responsável por licitar, coordenar a execução das obras, no valor de R$ 1 bilhão.

Aécio venceu a eleição para o Senado em 2010 e ficou em segundo lugar na disputa presidencial de 2014. Seu nome sempre é lembrado como um dos "presidenciáveis" do PSDB para o pleito de 2018. 

Aécio “indicou” Odebrecht para obra, diz ex-executivo

Benedicto Júnior conta que a negociata começou no início do segundo mandato de Aécio como governador de Minas, em 2007. Segundo o ex-executivo da Odebrecht, o próprio Aécio “indicou que a CNO (Construtora Norberto Odebrecht) participaria da obra” da Cidade Administrativa. A comunicação foi feita a BJ durante reunião no Palácio das Mangabeiras, sede do Executivo mineiro.

No mesmo encontro, Aécio disse a BJ que Oswaldo Borges da Costa, da Codemig, deveria ser procurado “para que fossem definidos os detalhes da participação da companhia no projeto”. Daí em diante, Sérgio Neves e Oswaldo começaram a tratar do tema.

De acordo com o relato de Benedicto, Oswaldo também fraudou a licitação da Cidade Administrativa junto com as construtoras vencedoras. O ex-presidente da Codemig decidiu que a Odebrecht lideraria um dos consórcios, formado também por Queiroz Galvão e OAS. Da mesma forma, decidiu a participação da Odebrecht no consórcio.

“Ao final, a licitação foi concluída exatamente com resultado final conforme desejado por Oswaldo Borges. Sérgio Neves me relatou que os consórcios contemplados com os três lotes do Centro Administrativo de Minas Gerais apresentaram propostas de cobertura uns para os outros”, disse Benedicto na delação.

Ou seja: as empreiteiras envolvidas combinaram as propostas a serem apresentadas com o objetivo de manipular o resultado da licitação. Assim, cada consórcio ficaria com um dos três lotes da Cidade Administrativa.

O lote 1 ficou com o consórcio formado por Camargo Corrêa, Santa Bárbara e Mendes Júnior, que fez proposta de R$ 187 milhões. O 2, com o consórcio de Odebrecht, Queiroz Galvão e OAS, com proposta vencedora de R$ 367 milhões. E o lote 3 caiu nas mãos de Andrade Gutierrez, Via Engenharia e Barbosa Mello, com proposta de R$ 393 milhões.

De acordo com o pedido de abertura de investigação feito pela PGR, Sérgio Neves relatou em sua delação que as empresas “qualificaram” o edital da licitação da Cidade Administrativa para impedir que outras companhias participassem da disputa.

A PGR diz que o senador e Oswaldo Borges da Costa podem ter cometido crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Já Benedicto Júnior e Sérgio Neves podem ter incorrido, além dos delitos citados, em corrupção ativa, cartel e fraude de licitação.

Aécio nega contrapartida e cita Marcelo Odebrecht

Em nota ao UOL, a assessoria de imprensa de Aécio Neves citou depoimento do ex-presidente da Odebrecht, Marcelo Odebrecht, preso há mais de um ano e condenado por corrupção e lavagem de dinheiro em primeira instância.

"É fundamental registrar que, em vídeo divulgado hoje, Marcelo Odebrecht afirma em sua delação que doações feitas às campanhas do PSDB através do senador Aécio Neves nunca envolveram nenhum tipo de contrapartida", diz a nota. "O senador Aécio não se recorda de reunião supostamente ocorrida 10 anos atrás e reafirma que todos os interessados em participar da licitação da Cidade Administrativa foram encaminhados à época, à Codemig, empresa responsável pelo projeto e presidida pelo sr. Oswaldo Borges."

Ainda segundo o comunicado, "o edital de licitação da obra foi previamente apresentado ao Ministério Público e Tribunal de Contas e todas as etapas de execução da obra foram acompanhadas em tempo real por empresa de auditoria externa. Registre-se que o arquiteto responsável pelo projeto, Oscar Niemeyer, já havia manifestado sua preocupação de que as obras fossem executadas por empresas de grande experiência técnica em função da complexidade do projeto. A Lei 8.666, que rege licitações no país, é clara ao exigir patamares de larga experiência para execução de grandes obras."

Por volta das 17h45 desta quarta (12), o UOL tentou contato com Oswaldo Borges da Costa Filho em três números de telefone diferentes, sem sucesso. A reportagem também procurou o ex-presidente da Codemig por e-mail, ainda sem resposta.

Marcelo Odebrecht explica relação com políticos

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