Sem Maia nem consenso, reforma política volta a ser discutida hoje; veja o que pode mudar
Está marcado para esta terça-feira (29), no plenário da Câmara dos Deputados, o reinício da votação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) 77/2003, que trata de diversas mudanças no sistema eleitoral brasileiro a partir de 2018. Um grande impasse entre os principais pontos da proposta, porém, pode fazer com que a reforma política não venha desta PEC, mas sim de uma outra e de um plano que está em tramitação no Senado Federal.
Na quarta-feira da semana passada (23), os deputados decidiram fatiar o texto-base da PEC 77/2003, de relatoria de Vicente Cândido (PT-SP), e votar separadamente as partes da proposta, para que ela não fosse rejeitada integralmente.
O primeiro ponto analisado --e rejeitado - foi a vinculação de um fundo público de financiamento de campanhas eleitorais, cuja criação ainda vai ser colocada em votação, às receitas tributárias do governo federal. Os deputados decidiram retirar do texto o índice fixo de 0,5% da receita líquida anual do país que serviria para abastecer o fundo.
O plenário da Câmara também decidiu, por maioria, retirar do texto as propostas relativas ao poder Judiciário, entre elas o prazo de 10 anos para mandatos de ministros do STF (Supremo Tribunal Federal).
Os próximos passos da votação são a definição sobre a proposta de um novo sistema eleitoral brasileiro – o “distritão ou o distrital misto – e a criação do próprio fundo público de campanha. Após semanas de discussão e negociação, porém, os deputados ainda não chegaram a consenso sobre essas duas propostas, e a PEC pode ser enterrada.
Outro ponto que pode pesar contra a continuidade da votação é a “promoção” de Rodrigo Maia (DEM-RJ) à presidência interina da República, já que Michel Temer (PMDB) embarca nesta terça para a China. Maia tem sido o principal articulador da reforma, e vai se reunir com líderes das bancadas nesta manhã para tentar uma definição sobre o tema, mas ele estará fora oficialmente da presidência da Câmara nesta semana, dando lugar a André Fufuca (PP-MA), segundo vice – o primeiro, Fábio Ramalho (PMDB-RJ), vai integrar a comitiva de Temer na Ásia.
Sem consenso nem a presença de Maia, a Câmara pode passar na frente da PEC 77/2003 outra proposta de emenda, a 282/2016, que já vem sendo considerada mais plausível dentro do curto espaço de tempo que o Congresso tem para aprovar uma reforma política – mudanças no sistema eleitoral a partir de 2018 só entrarão em vigor se forem aprovadas, em dois turnos, na Câmara e no Senado até a primeira semana de outubro.
Na quarta passada, uma comissão especial aprovou e enviou para o plenário o texto-base da PEC 282/2016, de relatoria da deputada Shéridan (PSDB-RR), que acaba com as coligações partidárias e institui uma cláusula de desempenho eleitoral para que partidos tenham acesso a recursos públicos e a tempo de rádio e TV. Nesta segunda (28), Maia disse que a matéria está "mais harmonizada" e que as duas podem ser votadas em plenário apenas na quarta (30).
"Apesar de toda a polêmica, tem coisas muito boas nas duas PECs que precisam ser aprovadas pelo Parlamento brasileiro", declarou o presidente da Câmara. "A articulação é dele [Fufuca], mas eu como presidente em exercício acho que tenho o direito de continuar participando dos debates, colaborando, e tenho certeza que a gente vai conseguir avançar numa pauta que é a do Brasil".
Diante do impasse em relação ao fundo na Câmara, do outro lado do Congresso os senadores correm contra o tempo para tentar aprovar um fundo público já para as eleições do ano que vem. Um requerimento de urgência para o PL 206/2017 foi aprovado e quer criar o Fundo Especial de Financiamento de Campanha, de R$ 2 bilhões, de autoria do senador Ronaldo Caiado (DEM-GO), que usaria o dinheiro da veiculação da propaganda eleitoral gratuita. O projeto também pode ser discutido nesta terça (29) e está na pauta da sessão que começa às 14h.
Veja abaixo o que o Congresso ainda pode mudar no sistema eleitoral brasileiro pelas propostas de emenda e projetos de lei:
Eleição de deputados e vereadores
Atualmente: No sistema atual, o proporcional, o candidato conta com os seus votos e com aqueles dados ao partido ou à coligação para ser eleito. Neste modelo, candidatos com poucos votos podem acabar se elegendo se parceiros de sigla tiverem obtido votações maciças, que garantiram uma cota grande de cadeiras para o partido, enquanto políticos com uma votação mais expressiva podem ficar de fora.
Como pode ficar: A partir do ano que vem, se a proposta for aprovada, os parlamentares das câmaras municipais, assembleias legislativas e a Câmara dos Deputados serão escolhidos por um modelo eleitoral majoritário, apelidado de “distritão”, em que são eleitos os deputados mais votados em cada Estado. Neste modelo, não há votos em partidos.
A partir de 2022, o distritão daria lugar ao distrital misto. Nele, o eleitor dá dois votos para o Legislativo: um para o candidato do partido no distrito dele e outro para qualquer candidato do partido na cidade ou no Estado que ele mora. O candidato mais votado em cada distrito é eleito para metade das vagas na casa legislativa. A outra metade é preenchida pelos mais votados dos partidos.
Financiamento público de campanha
Atualmente: Só é permitido aos partidos usar valores do Fundo Partidário - fundo anual de manutenção dos partidos -, doações de pessoas físicas e recursos do próprio candidato para custear as campanhas.
Como pode ficar pela proposta da Câmara: os deputados querem criar o FFD (Fundo Especial para o Financiamento da Democracia), que seria um fundo com dinheiro público. A proposta é que o valor do Fundo seja decidido anualmente na Lei Orçamentária, pela Comissão Mista de Orçamento do Congresso. A ideia de vincular este fundo a uma porcentagem fixa da receita anual da União já foi rejeitada.
Como pode ficar pelo projeto do Senado: os senadores querem criar o Fundo Especial de Financiamento de Campanha, de R$ 2 bilhões, que usaria o dinheiro da veiculação da propaganda eleitoral gratuita.
Saem coligações. Entram federações e subfederações
Atualmente: Os partidos podem se unir tanto na esfera municipal, quanto na estadual e na federal formando as chamadas coligações. As uniões feitas nos municípios não são obrigatórias para os Estados e para a eleição presidencial. Além disso, os votos obtidos pelas coligações servem para eleger os candidatos a deputados e vereadores pelo atual sistema proporcional.
Como pode ficar: A PEC 282/2016 propõe acabar com as coligações já a partir de 2018. Como forma de substituí-las, os partidos políticos que tenham afinidade ideológica poderão se unir em grupos chamados "federações". A federação será formada antes das eleições e seus partidos membros deverão continuar atuando em conjunto ao longo dos quatro anos seguintes. Por exemplo, PMDB, PSDB e DEM poderão formar uma federação e terão de seguir os mesmos posicionamentos na Câmara o no Senado até as próximas eleições.
Dentro das federações, poderão ser formadas "subfederações". Estas serão compostas por dois ou mais partidos da federação da qual fazem parte, mas somente para o período de campanha eleitoral. Como ilustração tomando-se o exemplo dos partidos citados, o PSDB e o PMDB poderão se unir e enfrentar o DEM em um Estado ou no Distrito Federal para eleger um candidato. No entanto, após o fim da campanha, as três siglas terão de voltar a trabalhar juntas.
Nova cláusula de barreira
Atualmente: Todos os partidos têm acesso ao fundo partidário, mas respeitando suas cotas de presença na Câmara e no Senado. Mesmo os que não têm representantes no Congresso recebem pequenas fatias.
Como pode ficar: O parecer estabelece uma cláusula de barreira para que as siglas tenham acesso aos recursos do Fundo Partidário e à propaganda gratuita no rádio e na televisão. Isto é, partidos que não alcançarem determinadas cotas, não terão direito a recursos do Fundo. A iniciativa terá exigências progressivas de 2018 até 2030 e que vão ficando cada vez mais rígidas.
Doações de pessoas físicas
Atualmente: Pessoas físicas podem contribuir com doações para qualquer candidato, desde que não ultrapasse, para cada cargo em disputa, 10% do rendimento bruto do doador no ano anterior ao da eleição. Além disso, todos os doadores têm seus nomes obrigatoriamente divulgados.
Como pode ficar: Continua o limite de 10% do rendimento bruto do doador. Esse valor, no entanto, seria limitado a 10 salários mínimos por cargo ou chapa majoritária. A ideia de o doador se manter no anonimato foi retirada do projeto.
Teto para gastos com campanha
Atualmente: Candidatos e partidos não têm limite mínimo ou máximo de investimento nas campanhas. Em 2014, a campanha vitoriosa de Dilma Rousseff (PT) na eleição presidencial declarou ter gastado R$ 384 milhões, em valores atualizados.
Como pode ficar: Os parlamentares querem estabelecer teto para os gastos com campanha dos candidatos. A proposta é que nas eleições para presidente da República não sejam gastos mais de R$ 150 milhões. Os limites de gastos de campanhas para governador e senador vão depender do número de eleitores em cada Estado.
Pesquisas eleitorais
Atualmente: Hoje, institutos de pesquisa podem divulgar suas campanhas eleitorais a qualquer momento, desde que elas estejam devidamente registradas na Justiça Eleitoral.
Como pode ficar: Se o texto da reforma for aprovado, o instituto vai ter que informar, até dez dias antes da divulgação do resultado do levantamento, o nome do estatístico responsável pela pesquisa e o número de registro do profissional no Conselho Regional de Estatística. A Justiça poderá impedir cautelarmente a divulgação dos resultados. Além disso, os institutos estarão proibidos de divulgar pesquisas eleitorais a partir do domingo anterior à data das eleições.
Uso de telemarketing e redes sociais nas campanhas
Atualmente: Os partidos são proibidos de usar recursos de telemarketing e fazer propaganda paga na internet (inclusive nas redes sociais) para fazer a propaganda dos seus candidatos.
Como pode ficar: Ligações por telemarketing poderão ligar para o eleitor das 9h às 20h, de segunda a sábado, desde que sejam realizadas pelo próprio comitê de campanha ou por iniciativa de pessoal do candidato. Deverá ser dada ao eleitor a opção de não receber novas chamadas. Além disso, poderá aparecer uma postagem patrocinada de candidatos no seu feed de notícias no Facebook, por exemplo. O limite de gastos para o uso desses recursos de propaganda é de 5% do teto de gastos para o cargo, ou R$ 2 milhões, o que for menor.
Participação das mulheres nas eleições
Atualmente: Hoje, os partidos são obrigados ter ao menos 10% da participação feminina nas suas propagandas partidárias.
Como pode ficar: Esse número deve subir para 30%. Quem descumprir tem que pagar uma multa de R$ 50 mil. Além disso, será obrigatório que todas as chapas de candidatos a prefeito, governador e presidente (e seus vices) tenham um homem e uma mulher.
Vaquinha online
Os partidos poderão organizar campanhas de financiamento coletivo por meio de sites, aplicativos eletrônicos e outros recursos similares, mas esses meios deverão ter cadastro prévio na Justiça Eleitoral e informar o nome completo e o CPF de cada um dos doadores, além das quantias doadas. Hoje isso não é previsto em lei.
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