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Bendine diz que processo na Lava Jato é "piada" e chama Odebrecht de "calhorda"

Daniela Garcia e Mirthyani Bezerra

Do UOL, em São Paulo

16/01/2018 19h00Atualizada em 16/01/2018 19h04

Aldemir Bendine, ex-presidente da Petrobras e do Banco do Brasil, disse nesta terça-feira (16) que é alvo de uma "perseguição brutal" por ter assumido a petroleira em um momento de crise, quando a Operação Lava Jato já estava em curso. Bendine também chamou o delator Marcelo Odebrecht de "calhorda" e negou ter recebido uma propina de R$ 3 milhões do grupo Odebrecht.

Em tom de desabafo, Bendine afirmou que destruíram sua vida “sem nenhuma prova”. “Eu não sei por que essa tortura. Há seis meses eu estou preso, vim parar num presídio. Toda uma história de vida foi desmontada”, lamenta.

Bendine é reu em um processo na 4ª Vara da Justiça Federal de Curitiba sob acusação de corrupção passiva, lavagem de dinheiro, pertinência a organização criminosa e embaraço à investigação no período que estava no comando do Banco do Brasil e da Petrobras. Ele nega as acusações.

No primeiro interrogatório ao juiz Sergio Moro, o ex-presidente ficou em silêncio. Nesta segunda oportunidade requerida pela defesa de Bendine, ele respondeu as perguntas do magistrado e dos próprios advogados. Ele rejeitou responder as questões do MPF (Ministério Público Federal) e das defesas de outros réus.

Bendine negou “veementemente” ter recebido propina por parte de Odebrecht, para não atrapalhar os negócios da empresa com a Petrobras, ao ser questionado pelo juiz federal Sergio Moro.

A informação foi dada por Odebrecht durante sua delação premiada e confirmada em depoimento por André Gustavo Vieira, apontado como o operador financeiro de Bendine, segundo a Lava Jato.

“Não só não procede, nego veementemente, como nada da declaração dele faz qualquer sentido. Ela é totalmente mentirosa, acho que fez visando buscar algum tipo de acordo ou coisas da espécie”, afirma o ex-presidente da Petrobras.

Odebrecht disse que Bendine requisitou uma propina de R$ 17 milhões ao grupo empresarial, quando ainda estava no comando do Banco do Brasil. De acordo com o delator e com o MPF, o pedido foi feito no primeiro semestre de 2014. Ele assumiu a Petrobras em fevereiro de 2015 e, só um tempo após sua posse, que os pagamentos começaram a ser feitos.

Segundo o delator, a propina foi paga por medo que os negócios do grupo com a Petrobras fossem prejudicados. “Não houve nenhum apoio [de Bendine à questão da rolagem da dívida]. Sempre discordamos disso", disse, justificando por que se negou a pagar propina enquanto Bendine estava no banco.

"Na prática, a razão que eu estava aceitando discutir esse assunto [propina] era a posição dele de presidente da Petrobras”, disse o ex-presidente da Odebrecht.

Odebrecht é acusado dos crimes de corrupção ativa e lavagem de dinheiro. Segundo denúncia da força-tarefa do MPF (Ministério Público Federal) na Operação Lava Jato, o executivo pagou R$ 3 milhões a Bendine, o que foi confirmado por Odebrecht no interrogatório. Os pagamentos, em três parcelas iguais, foram feitos em meados de 2015.

"Esse processo é uma piada"

Moro perguntou a Bendine se Odebrecht tentou confirmar detalhes da suposta propina durante uma reunião. O ex-presidente afirmou que o relato do empresário não é verdadeiro e o processo ao qual responde é uma "piada".

“É por isso que eu falo que esse processo é uma piada. Um calhorda que foi considerado o maior corruptor do país, que se vangloriou de ter corrompido presidentes até de outros países e parlamentares, ia ter um determinado pudor, uma dificuldade de fazer uma abordagem dessas que seria uma coisa tão simples?”, questionou.

Por duas vezes, Bendine afirmou ser alvo de "perseguição brutal" da acusação dos outros réus. Disse que assumiu a Petrobras como uma "missão pública" e não entende como passou de "organizador da empresa" para "contraventor".

"Eu fui colocado lá para organizar a empresa. A empresa sequer ir ter um balanço se não fosse o trabalho árduo que a gente fez (...) A empresa está hoje firme, forte, sólida e eu tendo que passar isso aqui de contraventor", desabafou.

Insistência de Dilma

Bendine contou durante o depoimento que a então presidente da República Dilma Rousseff (PT) insistiu para ele assumisse a presidência da Petrobras durante um café da manhã com ele no Palácio da Alvorada, no dia 4 de fevereiro de 2015. Ele disse que no ano anterior, quando ainda era presidente do Banco do Brasil, havia expressado à então presidente o desejo de se aposentar, mas que ela não aceitou sua renúncia.

“Ela não aceitou essa renúncia naquele momento, disse para eu tirar umas férias, espairecer e depois a gente voltaria a conversar sobre isso quando eu retomasse as atividades”, conta.

Ele afirmou que no dia 3 de fevereiro recebeu uma ligação de parte de Dilma convidando-o para o café da manhã.

“Ela me fez um apelo muito forte em relação a que eu assumisse a Petrobras, comunicando que naquele momento ia ser divulgada a renúncia de toda a diretoria da Petrobras. Eu expliquei para ela que não era o que eu desejava. Falei que seria uma missão muito difícil, muito árdua. Ela insistiu muito. Eu não queria de forma alguma assumir, mas não tive como deixar de atender, até porque eu entendi o ponto de vista da avaliação dela, que ela teria dificuldade em buscar um sucessor para a empresa”, disse.

Entenda o caso

As investigações da PF apontam que Bendine e pessoas ligadas a ele teriam solicitado vantagem indevida, em razão dos cargos exercidos, para que a Odebrecht não viesse a ser prejudicada em futuras contratações da Petrobras. Em troca, o grupo empresarial teria efetuado o pagamento de ao menos R$ 3 milhões, em espécie.

Ainda de acordo com a PF, os pagamentos só foram interrompidos depois da prisão de Marcelo Odebrecht, ex-presidente do grupo Odebrecht, em junho de 2015.

Bendine esteve à frente do Banco do Brasil entre abril de 2009 e fevereiro de 2015, quando deixou o banco para assumir a presidência da Petrobras. O executivo renunciou ao cargo de presidente-executivo da Petrobras em carta enviada ao Conselho de Administração em maio de 2016.

Segundo o MPF-PR, há evidências indicando que um pedido de propina no valor de R$ 17 milhões foi feito por Bendine na época em que era presidente do Banco do Brasil para viabilizar a rolagem de dívida de um financiamento da Odebrecht Agroindustrial.

Além disso, a investigação aponta que, na véspera de assumir a presidência da Petrobras, Bendine teria voltado a solicitar propina a executivos da Odebrecht para que a empresa não fosse prejudicada em contratos com a petroleira. Delatores indicam que, desta vez, a Odebrecht aceitou pagar a propina de R$ 3 milhões, com a atuação do doleiro Álvaro Novis.