PF investiga áudio em que delegado manda colega falsificar assinatura
A Corregedoria da PF (Polícia Federal) investiga um áudio de WhatsApp em que um delegado manda um subordinado falsificar sua assinatura para entregar um documento à Justiça. As conversas circularam por grupos de mensagens de policiais e foram reveladas à reportagem do UOL. Em 1º de novembro, o delegado em questão precisava autorizar quinze dias de escutas telefônicas em uma investigação.
Para não comprometer uma operação em andamento da Polícia Federal, a reportagem do UOL optou por omitir o nome e o estado de atuação dos policiais envolvidos.
De acordo com o delegado, que conversou com a reportagem, o escrivão deveria imprimir os papéis, encontrar um outro delegado na Superintendência da PF para assiná-los, digitalizá-los e entregá-los à Justiça.
No entanto, não foi encontrado nenhum oficial da PF para assinar o documento, segundo o delegado, que afirma que o prazo das escutas venceria no mesmo dia.
O delegado disse ainda que um magistrado já aguardava a chegada do pedido para autorizar ou negar a continuidade dos grampos telefônicos.
Num dos áudios enviados ao escrivão, o delegado afirma que colocaria a culpa no subordinado em caso de problemas. “Não dá pra esperar, cara”, explica. “Vai dar nulidade e eu vou botar na tua conta. Tu tem que prestar atenção, cara. Não tem outra forma. É hoje. Vai perder o trabalho."
Em outro áudio, o delegado pede que o escrivão simule sua assinatura no documento. “Falsifica minha assinatura, cara. Você sabe mais ou menos como é que faz. E toca a ficha por favor.”
A discussão começou às 16h e só terminou à noite. A Justiça aceitou receber o documento sem assinatura, atestando no processo que ele tinha sido enviado pelo delegado, e autorizou a continuidade das escutas.
Repercussão
Pela Lei 9.296/96, os pedidos de interceptação podem ser feitos até “verbalmente” em alguns casos considerados excepcionais.
A Corregedoria da Superintendência da PF envolvida abriu procedimento para apurar os fatos. O delegado disse que o caso “está em andamento, mas já está entendido”.
O presidente da Fenapef (Federação Nacional dos Policiais Federais), Luís Boudens, afirmou que a entidade vai “pedir instauração de procedimento contra esse delegado” na próxima segunda-feira. O vice-presidente do sindicato dos policiais federais do estado em questão afirmou que o delegado cometeu “abuso” ao fazer uma “ameaça” ao escrivão e ao solicitar a falsificação da assinatura. “É a tentativa de dar um jeito que não é próprio ao sistema da PF”, contou à reportagem.
O delegado afirmou ao UOL que ficou “surpreso” com a reação da federação e a proporção que o caso tomou. Para ele não houve ilegalidade, porque o pedido de continuidade dos grampos foi feito por ele mesmo e seria ratificado depois. “Não há qualquer intenção de prática ilícita. Nós estamos aqui para praticar justiça.”
O policial afirma ainda que a questão foi superada com o colega escrivão, que na ocasião dos áudios havia trabalhado durante doze horas depois de um flagrante pela manhã. “Foi um equívoco, uma figura de linguagem.”
A ADPF (Associação Nacional dos Delegados da PF) afirmou que o comportamento do delegado foi normal e vai defendê-lo judicialmente se for necessário. “Era um contexto de conversa informal”, disse o presidente da entidade, Edvandir Paiva. "O colega não tinha a menor intenção de falsificar nada. Ali, no calor dos fatos, deu essa confusão. É um delegado muito trabalhador, sério, tem sido bem respeitado. Não vejo repercussão penal."
A Polícia Federal, através de assessoria de imprensa, afirma que instaurou procedimento administrativo para apurar os fatos.
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