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Para se distanciar do Centrão, siglas nanicas planejam bloco "independente"

Grupo tenta se distanciar do "centrão" e ganhar espaço nas discussões políticas - Pedro Ladeira/Folhapress
Grupo tenta se distanciar do 'centrão' e ganhar espaço nas discussões políticas Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

Guilherme Mazieiro e Luciana Amaral

Do UOL, em Brasília

17/05/2019 04h00

Ao menos cinco partidos - Podemos, PSC, Cidadania, Patriota e PV - planejam a criação de um bloco "independente" na Câmara dos Deputados para ganhar mais espaço político e por insatisfação com a condução da articulação política pelo Palácio do Planalto.

Apesar de ainda não terem se unido formalmente e serem partidos relativamente pequenos na Casa, os integrantes do grupo foram um dos principais responsáveis por pautar o debate nacional desde a semana passada. O grupo se reúne há cerca de 40 dias. Na última semana, o Novo se aproximou das conversas. Juntos, os seis partidos somam 43 dos 513 deputados federais.

Mesmo sem atingir 10% dos votos da Casa, essas legendas expuseram desentendimentos internos do governo e tumultuaram o cenário político. Na terça-feira (14), líderes desse grupo confirmaram ao UOL que, durante reunião no Planalto para a qual foram convidados, Bolsonaro ligou para o ministro da Educação, Abraham Weintraub, e ordenou que não houvesse mais bloqueio de verbas para pasta.

Após a publicação de reportagem do UOL, a Casa Civil, o MEC e o Ministério da Economia emitiram nota desmentindo os deputados, que depois subiram à tribuna da Câmara indignados com a atitude e fizeram críticas pesadas ao governo. O desencontro de versões expôs a falta de articulação do Planalto e se arrastou pela sabatina com Weintraub no plenário na Câmara nesta quinta (15).

As lideranças dos partidos envolvidos têm se reunido com frequência para discutir o novo bloco e devem anunciá-lo nas próximas semanas, afirmaram ao UOL. Atualmente, as siglas são consideradas possíveis aliados do Planalto nas pautas legislativas, embora não integrem a base do governo.

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Segundo os líderes das siglas, o objetivo é se firmar como "independente", distanciando-se do Centrão, que tem em torno de 170 deputados de PP, PSD, PRB, DEM e Solidariedade, e da oposição, além de ressaltar que não se alinharão automaticamente ao presidente Jair Bolsonaro (PSL).

O líder do Podemos, José Nelto (GO), afirmou que as seis siglas votarão de acordo com cada projeto apresentado e entende que reúnem correntes de pensamento diferentes. Mas, politicamente, têm um objetivo em comum.

Líder do Podemos, José Nelto (GO), ajuda a criar grupo e é próximo de Bolsonaro - Divulgação/Facebook José Nelto - Divulgação/Facebook José Nelto
Líder do Podemos, José Nelto (GO), ajuda a criar grupo e é próximo de Bolsonaro
Imagem: Divulgação/Facebook José Nelto

"Nós queremos oferecer uma alternativa para o Brasil. Não queremos participar do governo. A prova que não participaremos do governo é que não vamos pedir cargos", disse.

Um dos motivos de o bloco querer fugir da identificação como Centrão é pelo fato de essa assimilação ser malvista na sociedade, justificam.

"Nós queremos mostrar para a sociedade que o país mudou. A crise é grande, aumenta a cada dia e o governo só se mete em confusão. Nós queremos ajudar a construir um caminho para o país, que ajude nos projetos e discussões relevantes", completou Nelto.

Para o líder do Novo, Marcel Van Hattem (RS), há espaço para a consolidação de um movimento político que fuja dos grupos já estabelecidos dentro da Câmara.

"Há um grupo de partidos que está se reunindo para se conversar. É uma aproximação que começa a acontecer, porque vemos que podemos ser uma alternativa para construir um diálogo", falou.

Reservadamente, membros do novo grupo dizem que as siglas tradicionais da Casa bloqueiam qualquer atuação que não esteja alinhada ao centro tradicional. O receio é de que o Centrão aja politicamente para minar a organização dessas novas bancadas.

Um líder de um dos principais partidos do Centrão, que preferiu não ter o nome identificado, afirmou acreditar que a criação do bloco alternativo é algo "momentâneo" e minimizou a iniciativa. Ele analisou que a união surge na esteira dos desentendimentos entre o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM), e o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO).

"Eles viram uma oportunidade, mas não têm expressão. Ali você tem vários partidos juntos por motivos diferentes. Cada um tem uma mágoa ou queixa com o governo e a Câmara. Então, esse grupo não vai adiante", disse.

Na avaliação do deputado federal Diego Garcia (Podemos-PR), há uma "desconexão muito grande" entre a vontade do Planalto e o dia a dia da Câmara por falta de uma atuação mais firme de lideranças do governo na Câmara. Segundo ele, não é possível continuar mais no que definiu como "espiral".

"Se alguém disser que o relacionamento está bem, está mentindo. Não está bem. Há um silêncio muito grande de parte de quem deveria estar conversando com os parlamentares. A gente não precisa de líderes escondidos atrás de smartphones. A gente quer saber o porquê de que o Coaf [Conselho de Controle de Atividades Financeiras] deve ficar com o Moro no Ministério da Justiça para poder defender isso na comissão, por exemplo. Semana passada tive de fazer várias defesas sozinho, sem apoio de quem deveria orientar", reclamou.

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A atuação do grupo ganhou os primeiros holofotes na semana passada e, apesar do discurso de "independente", uma das ações beneficiou o governo. O próprio deputado Diego Garcia, em consenso com as demais siglas envolvidas no bloco, questionou a votação imediata em plenário da MP (Medida Provisória) 870, que trata da reestruturação ministerial proposta por Bolsonaro ao iniciar o mandato, pois o regimento interno da Câmara não estaria sendo seguido.

Devido à atitude, o plenário terá de votar outras MPs antes da 870. Isso deu tempo para o governo tentar contornar alterações feitas a contragosto por parlamentares em uma comissão especial. Entre elas, a transferência do Coaf do Ministério da Justiça para o da Economia.

Antes, havia um acordo da oposição e do Centrão com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para que o relatório da MP 870 fosse aprovado logo como veio da comissão especial, minimizando as chances do Planalto de reverter pontos de interesse.

Ainda assim, o cenário é de preocupação para o governo, pois o calendário para mudanças está apertado. A MP perde a validade em 3 de junho. Se não for aprovada até lá, o governo poderá ter de seguir com 29 ministérios, como era no governo anterior, de Michel Temer (MDB), ao invés dos 22 atuais.

Em abril, Diego Garcia protocolou pedido para que o ministro da Educação, Abraham Weintraub, fosse convidado a ir à comissão do setor na Câmara prestar esclarecimentos. Diante da polêmica sobre o corte orçamentário na Educação, o Centrão, porém, conseguiu impor uma derrota maior ao governo e, por 307 votos a 82, Weintraub foi convocado - quando passa a ser obrigado a comparecer - para sabatina no plenário na quarta (15) passada.