Previdência, armas, Coaf: o que foi destaque no 1º semestre no Congresso
Quase seis meses se passaram desde que, em fevereiro, deputados e senadores tomaram posse na atual legislatura, marcada por uma renovação recorde nas eleições do ano passado --47,3% na Câmara e 85% no Senado. Nesse período, o Parlamento travou embates com a Presidência da República, recusou-se a ficar em segundo plano na agenda do país e, apesar da falta de articulação do governo, atuou fortemente para aprovar a principal pauta econômica: a reforma da Previdência.
Sob outra perspectiva, o Congresso continua marcado por práticas que, nos últimos anos, foram anseios de mudança de setores da sociedade.
O chamado "toma lá, dá cá", que Jair Bolsonaro (PSL) criticou desde sua campanha eleitoral, ainda é vigente a olhos nus. Isso ficou evidente com a liberação desenfreada de emendas parlamentares para garantir, em primeiro turno, a aprovação da nova proposta para a Previdência na Câmara. Foram R$ 2,7 bilhões empenhados em apenas dez dias.
Se, por um lado, a tática da liberação de emendas dá luz a uma contradição do presidente da República, por outro, o Parlamento se coloca novamente na condição de fiador da "velha política".
Foi nesse ambiente que, na última quarta-feira (10), deputados aprovaram o texto-base da nova Previdência por 379 votos a 131. A PEC (Proposta de Emenda Constitucional) sofreu modificações e ainda passará por um segundo turno de votação antes de ser encaminhada ao Senado. Para a maioria dos congressistas, há um entendimento que a proposição avançou não em função do governo, e sim "apesar" dele.
Esse sentimento foi expresso algumas vezes pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Em 14 de junho, por exemplo, ele declarou que "pela primeira vez o Parlamento vai ser bombeiro, e não incendiário".
O comentário, postado em sua conta no Twitter, foi feito antes da votação em plenário. "Se fôssemos depender da articulação do governo, teríamos 50 votos e não os 350 que esperamos."
Previdência e a troca de farpas
Logo no fim de fevereiro, em ato simbólico, o próprio Bolsonaro foi pessoalmente à Câmara para entregar o texto da reforma, elaborada pelo seu guru econômico, o ministro Paulo Guedes (Economia). Depois, a proposição passou pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) e foi distribuída a uma comissão especial.
Toda a tramitação foi marcada por vaivém de polêmicas entre os dois Poderes, com alfinetadas de parte a parte e batidas de cabeça constante da base governista na Câmara.
Até junho, as críticas mútuas davam o tom da relação entre os deputados e o governo no contexto da Previdência. Ao rebater as reclamações de Guedes em razão de mudanças no texto, por exemplo, Maia afirmou que o governo havia se transformado em uma "usina de crises".
Para o ministro, as alterações feitas pela comissão especial na Câmara desidrataram a reforma. "Houve um recuo que pode abortar a nova Previdência", comentou Guedes em 14 de junho. Posteriormente, Maia não escondeu a insatisfação com as declarações do economista.
"Nós blindamos a reforma da Previdência de crises que são, muitas vezes, geradas quase todos os dias pelo governo. Cada dia um ministério gerando uma crise. Hoje, infelizmente, é o meu amigo Paulo Guedes, gerando uma crise desnecessária."
O clima hostil também foi em parte fomentado por algumas declarações de personagens que orbitam pela gestão Bolsonaro, como um dos filhos do presidente, o vereador carioca Carlos Bolsonaro (PSC). "Carluxo", como ficou conhecido nas redes sociais, tem sido desde o começo do ano pivô de polêmicas pelos ataques pessoais e críticas publicadas no Twitter.
Em 25 de junho, ele postou um tuíte em que dizia que "todos os vagabundos do país se uniram contra o governo para tentar torná-lo inviável".
A declaração ocorreu exatamente na semana em que parlamentares eram pressionados para negociar mudanças no texto da Previdência. Em resposta, o presidente da comissão especial, Marcelo Ramos (PL-AM), disse que não era possível discutir com o vereador por ele ser "inimputável".
Decreto das armas
O debate sobre o decreto das armas de Bolsonaro foi outra pauta que acirrou os ânimos no Parlamento nesse primeiro semestre do ano. Em 19 de junho, depois de muita discussão e na contramão da pressão pública do eleitorado bolsonarista, o Senado aprovou a derrubada da medida, que ainda seguiria para a Câmara. No entanto, o presidente se antecipou e revogou por iniciativa própria o decreto.
A queda de braço, porém, estava apenas começando. Uma semana depois, Bolsonaro editou novos decretos com a mesma finalidade: flexibilizar regras de posse e porte de arma de fogo. A Consultoria do Senado elaborou então um parecer no qual dizia que as medidas repetem os erros das iniciativas anteriores, com os mesmos "aspectos inconstitucionais". A discussão sobre o tema deve ser retomada no Parlamento no segundo semestre.
Coaf
Em maio, o Congresso desarmou no apagar das luzes uma bomba que estava prestes a explodir no colo de Bolsonaro: a expiração da MP (medida provisória) que reduziu o número de ministérios, de 29 para 22 pastas. Na ocasião, o botão de acionamento era o pleito de vários senadores pela transferência do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) para as mãos do ministro Sergio Moro (Justiça e Segurança Pública).
Antes defendida a plenos pulmões pelos bolsonaristas, a ida do Coaf para a pasta de Moro quase detonou toda a estrutura do Executivo. Correndo contra o relógio, já que MP estava prestes a caducar, o presidente enviou uma carta de socorro ao Congresso e contou com uma manobra do líder do governo na Casa para garantir a aprovação da medida provisória em tempo hábil.
Se a maioria do Senado tivesse aprovado a proposta de deslocamento do Coaf para o Ministério da Justiça, a MP teria que retornar à Câmara dos Deputados --de acordo com o processo legislativo, qualquer mudança necessita do aval das duas Casas. Mas não havia tempo para a conclusão dessa tramitação.
Ou seja, o fim do prazo obrigaria o governo a recriar sete ministérios --número de pastas existentes antes de Bolsonaro assumir.
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