Anistia repudia fala de Bolsonaro sobre a morte do pai do presidente da OAB
A diretora executiva da Anistia Internacional, Jurema Werneck, repudiou na tarde de hoje sobre a declaração do presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), em relação à morte de Fernando Augusto Santa Cruz de Oliveira, um dos desaparecidos políticos durante a ditadura militar. Fernando era pai do atual presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Felipe Santa Cruz.
Jurema afirmou que o Estado brasileiro deveria assumir as suas responsabilidades em relação às mortes ocorridas durante o regime militar.
O Brasil deve assumir sua responsabilidade, e adotar todas as medidas necessárias para que casos como esses sejam levados à justiça. O direito à memória, justiça, verdade e reparação das vitimas, sobreviventes e suas famílias deve ser defendido e promovido pelo Estado Brasileiro e seus representantes
Jurema Werneck, diretora da Executiva Internacional
Para ela, "é terrível que o filho de um desaparecido pela ditadura tenha que ouvir do presidente do Brasil, que deveria ser o defensor máximo do respeito e da justiça no país, declarações tão duras", e completou dizendo que o Estado brasileiro deveria assumir a sua responsabilidade pelos crimes ocorridos neste período.
Mais cedo, ao reclamar sobre a atuação da OAB na investigação do caso de Adélio Bispo, autor do atentado à faca do qual foi alvo, Bolsonaro disse que poderia explicar a Santa Cruz como o pai dele desapareceu.
Um dia se o presidente da OAB [Felipe Santa Cruz] quiser saber como é que o pai dele desapareceu no período militar, eu conto para ele. Ele não vai querer ouvir a verdade. Eu conto para ele"
presidente Jair Bolsonaro
A diretora da Anistia reiterou o posicionamento da organização que luta pela elucidação de casos que envolvem violações aos direitos humanos.
"Defendemos a revogação da Lei de Anistia de 1979, eliminando os dispositivos que impedem a investigação e a sanção de graves violações de direitos humanos, a investigação e responsabilização dos crimes contra a humanidade cometidos por agentes do Estado durante o regime militar", afirmou.
Integrou "grupo sanguinário", diz Bolsonaro
Fernando Augusto Santa Cruz de Oliveira desapareceu em fevereiro de 1974, depois de ter sido preso por agentes do DOI-CODI, no Rio de Janeiro. Na época, Felipe tinha apenas 2 anos.
Fernando era integrante da Ação Popular Marxista-Leninista. Apesar dos relatórios da Comissão da Verdade não apresentarem provas da sua participação em lutas armadas, Bolsonaro deu a entender que o militante participou deste tipo de ato.
"Não é minha versão. É que a minha vivência me fez chegar às conclusões naquele momento. O pai dele integrou a Ação Popular, o grupo mais sanguinário e violento da guerrilha lá de Pernambuco, e veio a desaparecer no Rio de Janeiro", complementou.
O presidente também atacou a OAB sobre o caso Adélio. "Por que a OAB impediu que a Polícia Federal entrasse no telefone de um dos caríssimos advogados [do Adélio]? Qual a intenção da OAB? Quem é essa OAB?", questionou o presidente.
A reportagem entrou em contato com Felipe Santa Cruz mas não obteve resposta. A OAB informou que pretende divulgar nota sobre o tema ainda hoje.
OAB também se manifestou
Em nota, a OAB também se manifestou em relação às falas de Bolsonaro. A Ordem dos Advogados do Brasil afirmou que "todas as autoridades do país, inclusive o senhor presidente da República, devem obediência à Constituição Federal, que tem entre seus fundamentos a dignidade da pessoa humana, na qual se inclui o direito ao respeito da memória dos mortos", diz um trecho do comunicado.
A OAB também questiona a condução do cargo por Bolsonaro. "O cargo de mandatário da chefia do poder Executivo exige que seja exercido com equilíbrio e respeito aos valores constitucionais, sendo-lhe vedado atentar contra os direitos humanos, entre os quais os direitos políticos, individuais e sociais, bem assim contra o cumprimento das leis", completa o texto que também apresenta solidariedade à família de Santa Cruz.
"Solidariedade a todas as famílias daqueles que foram mortos, torturados ou desaparecidos, ao longo de nossa história, especialmente durante o golpe militar de 1964, inclusive a família de Fernando Santa Cruz, pai de Felipe Santa Cruz, atingidos por manifestações excessivas e de frivolidade extrema do senhor presidente da República", conclui.
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