Topo

Deputados do PSL-RJ têm acusados de tráfico, roubo e "máfia" em gabinetes

Os deputados estaduais Anderson Moraes e Dr. Serginho, do PSL-RJ - Divulgação/Alerj
Os deputados estaduais Anderson Moraes e Dr. Serginho, do PSL-RJ Imagem: Divulgação/Alerj

Constança Rezende e Flávio Costa

Do UOL, em Brasília e São Paulo

01/12/2019 04h01Atualizada em 02/12/2019 14h18

Resumo da notícia

  • Governador Witzel tentou cancelar cessão de servidores à Alerj
  • Fato foi retaliação ao PSL após acusações do presidente Bolsonaro
  • UOL checou antecedentes dos nomes cedidos aos gabinetes
  • Deputados do partido do presidente solicitaram policiais com ficha criminal
  • Redação do UOL procurou os gabinetes citados, mas não obteve resposta

Deputados estaduais do PSL-RJ solicitaram e receberam do governador Wilson Witzel (PSC) servidores para seus gabinetes na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro), cargos que se tornaram alvo de disputa após os desentendimentos entre o governador e o presidente Jair Bolsonaro (PSL).

O UOL examinou documentos ligados aos servidores e constatou que três deles têm passagem pela polícia, por crimes como associação criminosa, narcotráfico, assassinato e participação em esquema ilegal de transporte de vans. O levantamento foi feito pela reportagem com base em diários oficiais, processos da Justiça e denúncias do Ministério Público do Rio.

Nos pedidos de deslocamento dos servidores à Alerj, os gabinetes dos deputados pediram nominalmente para contar com os serviços do policial civil Ricardo Wilke, do inspetor da Polícia Civil Rodrigo Correa Lima Furtado e do policial militar Hugo Werneck Cordeiro da Cruz.

Gabinete do deputado Anderson Moraes

Dois dos servidores citados, Wilke e Furtado, foram solicitados pelo gabinete do deputado Anderson Moraes (PSL-RJ).

Empresário e alinhado com o presidente, Moraes também emprega em seu gabinete a ex-mulher de Bolsonaro e mãe de seus três primeiros filhos, Eduardo, Carlos e Flávio, Rogéria Bolsonaro. Ela ocupa um cargo comissionado de R$ 7.300.

O chefe de gabinete é Wilke, preso em abril de 2015, acusado por tráfico de drogas e roubo, junto com outras 40 pessoas, devido a uma denúncia movida pelo Ministério Público (MP-RJ). No último mês, ele recebeu o salário de R$ 9.776.

De acordo com o MP-RJ, Wilke fazia parte de um grupo que traficava drogas no Rio de Janeiro e em São Paulo, ligado às facções criminosas Comando Vermelho e PCC (Primeiro Comando da Capital).

A denúncia contra o policial foi no âmbito da operação Adren, que teve como alvo policiais corruptos, que, associados a outros traficantes transportavam, guardavam e mantinham entorpecentes em depósito, para fins de tráfico e sem autorização legal. Depois, o material era repassado a integrantes da quadrilha para revenda, segundo a investigação, muitas das vezes, transportado em carros da polícia.

Ele acabou sendo absolvido em julho de 2017, mas o Ministério Público entrou com um recurso que tramita até hoje. Atualmente o processo encontra-se na Defensoria Pública para apresentação de contrarrazões da apelação do MP e da defesa.

Caso Marielle: Bolsonaro e Witzel trocam farpas

Band Notí­cias

Desde 2015, Wilke responde também a um processo disciplinar na Polícia Civil. Antes de entrar para a Alerj, ele estava em "conveniência disciplinar", afastado do dia a dia da corporação. Wilke já havia sido preso em 2000, por suspeita de extorquir dinheiro do traficante Fernandinho Beira-Mar.

Também está no gabinete de Moraes o inspetor da polícia civil Rodrigo Correa Lima Furtado, que até junho exercia a função comissionada de auxiliar 1 e recebia R$ 4.381 líquidos.

Em 2004, Furtado foi preso temporariamente, acusado de matar a estudante Aline Gonçalves Lima, 16, e o pastor evangélico Marcelo Salgueiro de Menezes durante uma incursão de agentes da Delegacia de Repressão a Entorpecentes à favela Beira-Mar, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense.

Segundo moradores da favela, os policiais chegaram atirando no local. A prisão foi decretada pela 4ª Vara Criminal do município de Duque de Caxias.

A perícia, realizada pelo Instituto Médico-Legal, demonstrou que as duas mortes foram causadas pelo mesmo projétil disparado pelo fuzil Colt M-16, calibre 22, que estava de posse do policial.

Os legistas informaram que o tiro atingiu primeiro as costas de Aline, que voltava da escola, e depois de atravessar o corpo da menina acertou o pastor, que também trabalhava como vendedor de cloro, de acordo com reportagem do jornal "Estado de S. Paulo".

A defesa do policial sempre contestou o resultado da perícia.

Gabinete do deputado Dr. Serginho

Já o deputado Dr. Serginho (PSL) requisitou dos quadros da Polícia Militar o policial Hugo Werneck Cordeiro da Cruz, que hoje é lotado como auxiliar 1 no Departamento de Assistência Médica com salário de R$ 4.805,94 líquidos.

O policial foi preso em maio de 2013 pelos crimes de associação criminosa e corrupção passiva.

Ele foi acusado pelo MP-RJ de participar de um esquema ilegal de transporte alternativo nas cidades de Araruama, Saquarema, Iguaba e São Pedro D'Aldeia, na região dos lagos do Rio.

Segundo a denúncia, os integrantes da denominada ´Máfia das Vans´ ostentavam características próprias de controle territorial.

O objetivo do grupo, segundo MP, era garantir o exercício do transporte coletivo alternativo de passageiros por meio de vans e veículos similares, através de motoristas e cooperativas não autorizados para tal atividade pelo poder público, com o respaldo de policiais e bombeiros militares.

Os policiais seriam responsáveis pela facilitação da fiscalização quanto à circulação destes veículos ilícitos de transporte, sendo certo que todos os envolvidos se beneficiariam financeiramente do negócio escuso.

"A quadrilha é composta de elementos armados, em especial os policiais militares [...] os quais, entre outras, se encarregam da atividade de impor o temor aos motoristas de van, objetivando que estes participem da arrecadação de propina destinada à fiscalização", diz a denúncia.

Em abril de 2016, o juiz Leandro Loyola de Abreu, da Vara Criminal de Araruama, absolveu os acusados, afirmando falta de provas e que "a inexistência, até então, de transporte alternativo legalizado neste município e a notória deficiência na locomoção de pessoas não autorizam a realização do transporte irregular de passageiros, o que representa uma infração administrativa e não penal". O MP recorreu da sentença sobre o suposto esquema e o processo tramita em sigilo.