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SSP-BA rebate Flávio Bolsonaro sobre Adriano: 'Tenta trazer dúvidas'

Adriano Nóbrega era acusado de chefiar milícia no Rio de Janeiro - Reprodução
Adriano Nóbrega era acusado de chefiar milícia no Rio de Janeiro Imagem: Reprodução

Alexandre Santos*

Colaboração para o UOL, em Salvador

18/02/2020 20h09Atualizada em 19/02/2020 09h22

Resumo da notícia

  • Senador publicou vídeo de suposta autópsia e documentos questionando laudos
  • Filmagem não é reconhecida pelas perícias da Bahia ou do Rio de Janeiro
  • Secretário acusa tentativa de "criar questionamento sobre trabalho não concluído"

A SSP-BA (Secretaria de Segurança Pública da Bahia) divulgou um vídeo no início na noite de hoje em que desmente as acusações feitas pelo senador Flávio Bolsonaro (sem partido) por meio de um vídeo que mostra o suposto corpo do ex-capitão do Bope (Batalhão de Operações Especiais) Adriano da Nóbrega durante um procedimento de autópsia.

A pasta diz que a filmagem, publicada no Twitter do parlamentar, não é reconhecida como autêntica pelas perícias da Bahia e do Rio de Janeiro. "As imagens não foram feitas nas instalações oficiais do Instituto Médico Legal. Então, nós temos a clara convicção de que isso é para trazer algum tipo de dúvida, de questionamento, a um trabalho que ainda não foi concluído", afirma o secretário da Segurança Pública da Bahia, Maurício Teles Barbosa.

Acusado de chefiar a milícia Escritório do Crime, Adriano morreu no último dia 9 em um confronto policial na zona rural de Esplanada, cidade a 170 quilômetros de Salvador.

Na publicação em seu Twitter, Flávio insinuou que o miliciano foi torturado antes de ser morto na operação realizada por forças de segurança baianas em conjunto com agentes de inteligência da Polícia Civil do Rio. E questionou: "Quem mandou matar Adriano?".

A hipótese, sustentada em reportagem publicada pela revista Veja, é descartada pela versão oficial —laudo de necropsia divulgado pelo DPT (Departamento de Polícia Técnica) da Bahia aponta que o miliciano foi morto por dois tiros de fuzil, disparados a, no mínimo, um metro e meio de distância.

O vídeo tem 21 segundos de imagens sem áudio. O cadáver é filmado de costas com uma etiqueta em que é possível ler 'Adriano Magalhães'. Embora contenha cenas fortes, o senador não avisa previamente sobre o conteúdo das imagens. Ele também não esclarece como teve acesso ao vídeo.

"Perícia da Bahia (governo PT), diz não ser possível afirmar se Adriano foi torturado. Foram 7 costelas quebradas, coronhada na cabeça, queimadura com ferro quente no peito, dois tiros a queima-roupa (um na garganta de baixo p/cima e outro no tórax, que perfurou coração e pulmões", escreveu Flávio.

Horas mais tarde, o senador postou na mesma rede social uma suposta guia para exame pericial e laboratorial expedida pelo DPT (Departamento de Polícia Técnica) baiano.

"E agora o registro de ocorrência do governo petista da Bahia, genérico e relatando uma suposta troca de tiros. Quem está fraudando os registros? Para esconder o quê? Quem mandou matar Adriano?", publicou Flávio.

Adriano era ex-capitão do Bope e estava foragido havia cerca de um ano após operação do Ministério Público do Rio de Janeiro para prender integrantes da milícia de Rio das Pedras. O ex-PM possuía ligações com o senador Flávio Bolsonaro, filho do presidente da República, Jair Bolsonaro.

Flávio chegou a empregar a ex-mulher e a mãe de Adriano em seu antigo gabinete na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, mas afirma não possuir qualquer ligação com a milícia e desconhecer as suspeitas contra Adriano.

"Argumentações de leigos"

No comunicado, Barbosa reforça "o posicionamento das instituições": "Não vamos deixar que, por uma questão política, ou por qualquer outro motivo, qualquer outro interesse que esteja por trás disso tudo, venham trazer qualquer tipo de questionamento prévio, sem antes termos a conclusão da nossa investigação, das nossas perícias, e que o Ministério Público e a Justiça se posicionem quanto a isso".

O secretário também voltou a defender o trabalho da Polícia Militar baiana e das demais instituições do Estado, como o órgãos de perícia técnica. "Nós temos ainda um prazo para concluir a nossa investigação. Nós fomos instados a comentar o resultado da perícia, e foi claramente indicado pelo perito que não havia sinais de execução nem sinais de tortura no corpo que foi avaliado", disse.

Barbosa acrescentou que aguarda o resultado de perícias a serem realizadas e afirmou que outras pessoas estão sendo ouvidas acerca do caso. "O que nós queremos é dar continuidade ao trabalho sério de investigação que a nossa polícia já faz, sem nenhum tipo de indagação ou questionamento prévio antes da conclusão da autoridade policial."

O diretor do IML baiano, Mário Câmara, se disse surpreso com as imagens que circulam na internet e afirmou não ser possível analisar um vídeo não autenticado pela perícia.

"Não sabemos se foi adulterado, onde foi feito, não sabemos se o corpo é realmente do senhor Adriano. Então não faremos comentários sobre o vídeo. O que eu posso é reiterar que o laudo pericial foi feito por um perito médico-legal especialista na área, com formação e balística, muito experiente em casos como este", afirmou.

Para Câmara, o caso de Adriano não é tecnicamente difícil de ser esclarecido. "O laudo pericial descreve exatamente os orifícios de entrada, os orifícios de saída, a trajetória dos projéteis, a angulação, não há nenhum sinal de tortura no corpo, não há sinal, no corpo, de execução. Há sinais sim, pela angulação dos projéteis, de um confronto com a polícia. Agora é preciso complementar com outros laudos, com a investigação policial", diz.

"Daqui saíram os especialistas que formaram a medicina legal em São Paulo, no Rio de Janeiro. Todos os nossos peritos são pós-graduados, têm mestrado, doutorado. Não é gente que não tem experiência no assunto. Ninguém tem mais experiência para fazer esse tipo de procedimento do que o perito médico legista. Então, nós estamos seguros do que nós fizemos e responderemos perante o juiz como sempre fizemos. Vamos esclarecer ao juízo eventuais dúvidas que por acaso apareçam", afirma Câmara.

"Essa história toda, essas filmagens que estão aparecendo, não são técnicas, são argumentações de leigos que nos ofendem bastante", conclui.

Outro lado

Procurada pelo UOL, a assessoria do senador Flávio Bolsonaro não informou como ele conseguiu acesso ao vídeo. A assessoria também não informou se ele teve acesso prévio aos resultados de perícia e autópsia para apontar eventual tortura sofrida por Adriano da Nóbrega.

*Colaborou Luciana Amaral, do UOL, em Brasília