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Governo se nega a revelar exame de Bolsonaro por Lei de Acesso: "Sigiloso"

Presidente Jair Bolsonaro no Palácio da Alvorada - ADRIANO MACHADO
Presidente Jair Bolsonaro no Palácio da Alvorada Imagem: ADRIANO MACHADO

Guilherme Mazieiro

Do UOL, em Brasília

14/04/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Governo nega pedido de acesso a resultados de exames para detectar coronavírus realizados por presidente
  • Bolsonaro diz que os dois testes a que foi submetido tiveram resultado negativo, mas não tornou pública a informação
  • Secom afirma que os exames são pessoais, e que dados devem ser tratados com cautela e segurança institucional
  • Presidente cobrou que médicos que foram infectados revelassem se usaram cloroquina em seus tratamentos
  • O ministro de Bolsonaro Augusto Heleno (GSI) divulgou nas redes sociais o seu exame negativo, após ficar curado

A Presidência da República classificou como "sigilosos" os exames que Jair Bolsonaro (sem partido) fez para detectar o novo coronavírus e se negou a divulgar os resultados dos testes. O pedido foi feito pelo UOL ao governo via LAI (Lei de Acesso à Informação) no dia 23 de março.

O presidente fez os exames em 12 e 17 de março, após voltar de missão oficial nos Estados Unidos. Ao menos 23 autoridades que estavam na comitiva presidencial naquela viagem contraíram o vírus. Bolsonaro afirmou que o teste deu resultado negativo para coronavírus nas duas vezes, mas nunca apresentou os documentos.

Defensor do uso da cloroquina e da hidroxicloroquina no tratamento contra o coronavírus, medicamentos cuja eficácia não é consenso na comunidade científica, Bolsonaro recentemente cobrou de médicos de São Paulo que revelem o receituário de seus tratamentos.


Transparência

No pedido de informação feito pelo UOL, a reportagem justificou que a informação de realização do exame é pública e foi divulgada pelo próprio presidente. O questionamento se baseou também nos princípios de transparência de informações da administração pública, previstos na Constituição Federal.

O pedido foi encaminhado à Secretaria Especial de Comunicação Social da Secretaria de Governo da Presidência da República que negou a informação no dia 9 de abril. A pasta disse se basear na legislação que regula o acesso a informações pública (Lei 12.527/2011).

"As informações individualizadas sobre o assunto dizem respeito à intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas", informou na resposta.

O UOL fez o pedido dos exames via Lei de Acesso à Informação três dias após o presidente dizer, em entrevista coletiva, que, depois da facada, não seria uma gripezinha que o derrubaria. Naquela dia, o presidente foi questionado por jornalistas, mas não respondeu por que não apresentava o resultado dos testes.

Na ocasião o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, que participava da coletiva, disse que os exames são da "intimidade do paciente".

Bolsonaro cobra médicos

Entre os médicos infectados por coronavírus cobrados por Bolsonaro a revelar seus tratamentos está o coordenador do Centro de Contingência do Coronavírus em São Paulo, David Uip, ligado ao governador João Doria (PSDB). O infectologista se negou a responder Bolsonaro e pediu "respeito".

O outro médico é o cardiologista Roberto Kalil Filho, que confirmou o uso da cloroquina e foi citado por Bolsonaro em pronunciamento oficial.

Já o ministro Augusto Heleno (Gabinete de Segurança institucional), que estava na missão dos EUA e foi um dos infectados, revelou que um segundo exame deu negativo, após ser curado. A postagem foi feita em rede social.

Rival político de Bolsonaro, Doria também divulgou seu exame.

Sigilo

O HFA (Hospital das Forças Armadas), onde Bolsonaro fez os exames, omitiu dois nomes da lista de contaminados. A unidade foi obrigada a revelar a lista após decisão da juíza da 4ª Vara da Justiça Federal em Brasília, Raquel Soares Chiarelli.

Ela havia determinado que o hospital apresentasse a relação dos pacientes com coronavírus ao governo do Distrito Federal. Foi entregue uma relação de 15 nomes, dos 17 pacientes, que até então tinham casos confirmados. O nome de Bolsonaro não aparecia entre os 15 nomes divulgados.

Ao blog da Carla Araújo, no UOL, diretor do HFA, general Rui Yutaka Matsuda, também disse que o resultado dos exames do presidente é um documento pessoal e que, quando o hospital recebe do laboratório Sabin, o envelope vem lacrado.

Em meio aos questionamentos sobre o exame e com o avanço da crise de coronavírus, em 24 de março Bolsonaro editou uma medida provisória que suspendia o atendimento do serviço de acesso à informação. Dois dias depois, o serviço foi reestabelecido por decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes.

De acordo com a LAI, os órgãos públicos devem responder em até 20 dias todo e qualquer pedido feito por um cidadão envolvendo dados, documentos ou informações públicas. O prazo pode ser estendido por mais dez dias corridos.

Ontem, ao ser questionada sobre por que o resultado do exame de Bolsonaro não é público, a Secom reiterou que a justificativa de é "uma informação a respeito da vida privada do senhor presidente, o que deve ser tratado com a devida cautela e segurança institucional".