Bolsonaro não pode manter 'bicefalia' como presidente e cidadão, diz Mendes
Gilmar Mendes, ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), afirmou que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) vive uma "bicefalia" ao se colocar em uma posição na qual se comporta diferentemente como chefe de Estado e como cidadão ao tratar de temas como isolamento social.
"O presidente — vamos chamar assim, na pessoa natural, física —, por palavras e também por gestos, acabava por sinalizar no outro sentido", disse Gilmar a respeito do isolamento social proposto pelo Ministério da Saúde. "É preciso que, em uma concordância prática, tenhamos a proteção à saúde e a proteção à economia", acrescentou.
A questão das duas posições de Bolsonaro veio à tona no UOL Debate de hoje. Além de Gilmar Mendes, o programa reuniu Carlos Ayres Britto, ex-ministro do STF; deputado federal Felipe Francischini (PSL-PR), presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara; e Felipe Santa Cruz, presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). A mediação fica por conta do colunista do UOL Reinaldo Azevedo.
"Os gestos e as condutas do presidente neste contexto levaram a essa visão e é claro. Nós falamos pelos nossos atos. Mas nós falamos também — especialmente líderes, como é o caso do presidente — pelos nossos gestos, pelas nossas condutas. O cidadão comum, ele fica perplexo diante desse tipo de atitude", acrescentou o ministro do STF.
A avaliação diz respeito principalmente ao conflito que Bolsonaro protagonizou com o ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. A decisão de demitir Mandetta, segundo o presidente, foi tomada diante da postura do ministro de se concentrar nas questões de sua pasta envolvendo o novo coronavírus, principalmente a respeito do isolamento social, sem foco nas questões econômicas.
Em 12 de abril, em entrevista à Rede Globo, Mandetta expressou descontentamento e cobrou uma posição única do presidente com o ministério. "[A diferença nas orientações] preocupa porque a população olha e fala assim: Será que o ministro da Saúde é contra o presidente? E não há ninguém contra ou a favor de nada. O nosso inimigo é o coronavírus, ele que é o nosso principal adversário", afirmou Mandetta na ocasião.
Dias depois, à revista Veja, o próprio Mandetta demonstrou contrariedade frente às posições de Bolsonaro em reuniões e em público. "Você conversa hoje, a pessoa entende, diz que concorda, depois muda de ideia e fala tudo diferente. Você vai, conversa, parece que está tudo acertado e, em seguida, o camarada muda o discurso de novo", desabafou.
Hoje, de acordo com Gilmar Mendes, a confusão criada pelos gestos do presidente da República gera um senso de perplexidade nas pessoas. "A rigor, medida de isolamento não depende de medidas de poder de polícia. Depende de efetiva persuasão", explicou.
Diante do cenário incerto, Gilmar Mendes vê "a sanidade do sistema de saúde" em jogo, lembrando casos como o de Manaus — a capital amazonense já tem enterrado vítimas da covid-19 em valas comuns.
"Precisa discutir isso e, de fato, dosar, censurar, esse tipo de atitude ainda no campo do debate político. Não quero criminalizar condutas, nem no plano penal, nem no crime de responsabilidade", alertou.
"São atitudes incompatíveis. Não podemos ter essa 'bicefalia', como se a gente dissesse 'não, agora é o cidadão e não o presidente'. Presidente e cidadão estão confundidos; não podem ser distinguidos, como se quer fazer", acrescentou.
Orçamento de Guerra
Gilmar Mendes ainda defendeu uma orientação única para a população, superando diferenças políticas que poderiam desencadear questões jurídicas.
"Há um sentimento de insegurança jurídica que é perceptível e me é natural que ocorra diante do ambiente. Há necessidade diante da pandemia de superar pequenas travas", disse.
Entre as diferenças, o ministro alertou a respeito "do excesso da diminuição da receita dos estados e municípios". Houve, segundo ele, uma queda de 30% na arrecadação de estados e municípios.
"A ideia era dar ao governo um instrumental para lidar com essa crise numa visão mais ampla", lembrou, em referência ao PEC do Orçamento de Guerra.
"O assunto chegou à Câmara dos Deputados, chegou ao presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ), que então consultou os técnicos, abriu conversa com os técnicos do governo pra que a ideia fosse consolidada."
"Depois, o projeto foi para o Senado, sofreu alterações, novas considerações. E o tema agora volta para a Câmara para eventuais ajustes para aprovações", acrescentou.
Também de acordo com Gilmar Mendes, "ao lado desse Orçamento de Guerra, há de se pensar também em uma economia de guerra. É preciso que haja uma gestão específica para se ativar a economia, para que se faça uma economia de conversão", analisou.
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