Vírus da discórdia: entenda a crise da PF que separou Moro de Bolsonaro
Às 11h da manhã de 24 de abril, Sergio Moro, o ministro mais popular do presidente Jair Bolsonaro, deixou o governo acusando o chefe de tentar interferir na Polícia Federal. O ex-juiz da Lava Jato e um dos símbolos do combate à corrupção mostrou-se ressentido com uma série problemas que enfrentou desde o início da gestão.
Deflagrou uma crise que envolve a polícia, o governo, os filhos do presidente, o Supremo Tribunal Federal (STF), o Coaf e as leis anticrime e de abuso de autoridade.
Mas nada se compara ao estresse vinculado à PF, tensão que começou, na manhã de 15 de agosto do ano passado, com uma declaração do presidente sob a mangueira da entrada do Palácio da Alvorada.
Os reflexos desse episódio, que poderia se chamar "Vírus da discórdia", não têm prazo para terminar.
Primeira temporada: Briga pelo Rio
Pomo da discórdia
15.ago.2019. Debaixo da mangueira do Alvorada, onde costuma cumprimentar apoiadores e fazer declarações aos repórteres que o esperam, Bolsonaro diz que vai trocar o chefe da Polícia Federal no Rio de Janeiro, Ricardo Saadi, por "motivos" de "gestão e produtividade".
"Todos os ministérios são passíveis de mudança. Vou mudar, por exemplo, o superintendente da Polícia Federal no Rio de Janeiro. Motivos? Gestão e produtividade."
PF desmente presidente
No fim da tarde, a Polícia Federal, comandada pelo delegado Maurício Valeixo, uma indicação pessoal do ministro da Justiça, divulga nota desmentindo os motivos alegados pelo presidente da República.
"A troca (...) já estava sendo planejada há alguns meses e o motivo da providência é o desejo manifestado, pelo próprio policial, de vir trabalhar em Brasília, não guardando qualquer relação com o desempenho do atual ocupante do cargo", afirmou a corporação.
A PF ainda indicou o substituto de Saadi, e disse que a escolha foi feita por Valeixo. "O nome do substituto, escolhido pela Direção Geral da Polícia Federal, é o do delegado de Polícia Federal Carlos Henrique Oliveira Sousa."
Bolsonaro bate o pé
16.ago.2019. No dia seguinte, mesmo após a nota da PF, Bolsonaro afirma que é outro policial quem vai assumir o cargo no Rio. Tratava-se de Alexandre Saraiva, superintendente da corporação no Amazonas.
"O que eu fiquei sabendo... Se ele resolver mudar, vai ter que falar comigo", disse Bolsonaro. "Quem manda sou eu... deixar bem claro. Eu dou liberdade para os ministros todos. Mas quem manda sou eu. Está pre-acertado que seria o lá de Manaus."
E citou Sergio Moro: "Pergunta para o ministro da Justiça, Sergio Moro. Já estava há três, quatro meses para sair o cara de lá. Quando vão nomear alguém, falam comigo. Eu tenho poder de veto ou vou ser um presidente banana. Agora, cada um faz o que bem entende e tudo bem? Não."
Aparentemente, PF vence a batalha
Após a declaração do presidente, Maurício Valeixo ameçou se demitir - conforme Moro contaria em depoimento prestado à PF em 2 de maio de 2020. Mas o ministro conseguiu demover Bolsonaro. Carlos Henrique seria mesmo nomeado, apesar de o presidente preferir Alexandre Saraiva.
Bolsonaro ameaça demitir Valeixo
22.ago.2019. Jair Bolsonaro diz que, se não pode trocar um superintendente no Rio, vai mudar o diretor geral da Polícia Federal. "Se eu trocar (o diretor-geral da PF) hoje, qual o problema? Está na lei que eu que indico, e não o Sergio Moro. E ponto final." E continuou: "Ele (Valeixo) é subordinado a mim, não ao ministro. Deixo bem claro isso aí."
Clima esquenta; Moro quase é demitido
No mesmo dia, policiais reunidos em Salvador (BA) aumentam críticas a Bolsonaro. Culpam também Moro, por falta de ação na defesa da corporação. Mas, segundo o livro "Tormenta", de Thaís Oyama, naqueles dias o presidente ameaçara demitir Sergio Moro por causa do impasse na polícia. O general Augusto Heleno teria impedido a saída do ministro da Justiça.
Flávio Bolsonaro investigado pela PF
26.ago.2019. Um inquérito da PF estava pendente de análise pela Polícia Federal do Rio. Ele apurava a suspeita de que o filho mais velho do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), lavou de dinheiro com imóveis após esquema de "rachadinha" de salários de assessores na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj). O caso também é apurado na Polícia Civil e no Ministério Público Estadual.
Troca é efetivada
28.ago.2019. O Diário Oficial publica a saída de Saadi da chefia da PF. Conforme Moro contaria em 2 de maio de 2020, "principalmente, a partir dessa época o presidente passou a insistir" na troca de Valeixo. Ele disse que "conseguiu demover o presidente dessa substituição por algum tempo".
A troca não foi simples. Saadi sai em 28 de agosto e o delegado Tacio Muzzi ocupa o cargo interinamente, porque Carlos Henrique só assumiria em 20 de novembro.
Segunda temporada: A fritura
Bolsonaro pressiona Moro a tirar Valeixo
Janeiro.2020. Em uma reunião no Palácio do Planalto, informa o depoimento de Sergio Moro, Jair Bolsonaro diz ao ministro que deseja trocar Valeixo pelo diretor geral da Abin, Alexandre Ramagem. Bolsonaro indicou ainda outros dois nomes: o secretário de Segurança do DF, Anderson Torres, e um subordinado dele, Alfredo Carrijo (na foto abaixo, com o líder do governo na Câmara, Vítor Hugo, PSL-GO). Moro disse que Torres e Carrijo dois não tinham "qualificação necessária"
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