Vereadora filha de Beira-Mar teve 48% dos votos de favela dominada pelo CV
A votação expressiva na comunidade Parque das Missões —controlada por seu pai de dentro da cadeia, segundo a PF (Polícia Federal)— foi decisiva para que a dentista Fernanda Costa, filha do chefe do tráfico Fernandinho Beira-Mar, fosse empossada nesta segunda-feira (4) como vereadora em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense.
No Ciep 350 Tulio Roberto Quintaliano Cardoso, que fica dentro do Parque das Missões, Fernanda colheu um terço dos seus 3.999 votos nas eleições de 2020. Na comunidade, localizada às margens da Linha Vermelha —uma das principais vias expressas do Rio— a dentista recebeu 1.346 dos 2.769 votos válidos para vereador no local, ou 48,6% do total. Apenas dois outros candidatos superaram a marca dos cem votos na comunidade —um deles conquistou o apoio de 402 eleitores, e a outra, de 118.
O Parque das Missões é vizinho da favela Beira-Mar —onde Luiz Fernando da Costa começou a atuar como traficante de droga, e da qual herdou o apelido. Preso desde 2001, Fernandinho Beira-Mar é chefe do CV (Comando Vermelho), principal facção criminosa do Rio de Janeiro e uma das maiores do país.
Em 2017, a PF deflagrou a Operação Epístolas, que prendeu 24 pessoas acusadas de integrar o grupo de Beira-Mar, entre elas sua irmã e advogada, além de cinco filhos do chefe do tráfico. Fernanda Costa não foi alvo da operação.
As investigações revelaram que Fernandinho Beira-Mar seguida ditando as ordens em comunidades do Rio de dentro da prisão, sobretudo na favela Beira-Mar, no Parque das Missões e no Parque Boavista —esta última também em Duque de Caxias.
O UOL tentou contatar Fernanda Costa, mas não conseguiu localizá-la.
MDB repassou R$ 100 mil para campanha
Para conseguir uma vaga de vereadora em sua segunda tentativa, a filha de Fernandinho contou com o apoio decisivo do prefeito Washington Reis (MDB), reeleito no primeiro turno do último pleito.
Hoje um dos principais caciques políticos do Rio de Janeiro, Reis foi integrante da tropa de choque do ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha —ele foi um dos nove parlamentares que votaram contra a abertura do processo de cassação de Cunha no Conselho de Ética da Casa.
Como candidata, Fernanda recebeu R$ 100 mil do MDB —a quinta que mais recebeu recursos do diretório estadual do partido. O campeão de recursos foi justamente Washington Reis, que ocupa o posto de vice-presidente estadual da sigla.
Em suas redes sociais, Fernanda publicou fotos de diversas agendas na companhia de Reis durante a campanha e a pré-campanha. Esteve com ele na posse, no sábado passado (1) e, no dia seguinte, postou no Facebook imagens de uma reunião na casa de Reis. Segundo ela, o objetivo foi fortalecer "meu compromisso em representar as comunidades na Câmara Municipal".
Dois dias depois, Reis nomeou como secretário um vereador do MDB, o que permitiu que Fernanda, que era primeira suplente do partido, assumisse o mandato de vereadora.
Em nota, o prefeito nega que tenha agido deliberadamente para que Fernanda conseguisse uma vaga na Câmara Municipal e disse que "nomeou Sandro Lelis para o cargo de secretário municipal de Transportes e Serviços Públicos devido ao seu notório conhecimento e capacidade de gerir com excelência a pasta".
Reis também disse não ter nenhum "constrangimento" em lidar com a colega de partido por conta do envolvimento de sua família com o tráfico de drogas.
"A vereadora foi eleita legítima e democraticamente pelo povo e teve sua candidatura homologada pela justiça. O fato de o prefeito conviver bem com a vereadora e cirurgiã dentista não tem nenhuma relação com a família da mesma", diz a nota da prefeitura.
A aproximação com o grupo político do prefeito de Duque de Caxias é recente. Em sua primeira disputa eleitoral, em 2016, Fernanda concorreu pelo PP. O partido é comandado na cidade pelo ex-prefeito José Camilo Zito, principal adversário político de Reis. Na ocasião, a filha de Fernandinho Beira-Mar exaltou a parceria com Zito.
Jogo de empurra sobre financiamento
Reis e Leonardo Picciani —ex-deputado federal e presidente estadual do MDB no Rio— divergem sobre quem foi o responsável por repassar R$ 100 mil do partido para Fernanda Costa.
Procurado, Washington Reis afirmou "que cabe ao partido, e não ao prefeito, a decisão sobre o uso do recurso". Já Picciani atribuiu o pedido de repasses ao diretório municipal —comandado pelos dois irmãos do prefeito, o deputado federal Gutemberg Reis e o deputado estadual Rosenverg Reis.
"A decisão pela distribuição do fundo partidário em Duque de Caxias foi definida pelo diretório municipal, o diretório estadual apenas formalizou os repasses aos candidatos e nos valores indicados pelo diretório local, de acordo com os percentuais das cotas previstas na legislação", afirmou Picciani à reportagem.
O UOL procurou Gutemberg Reis, presidente municipal do partido, mas não obteve resposta até o momento.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.