Bolsonaro usa lei da ditadura para intimidar quem discorda dele, diz HRW
A organização não governamental (ONG) de direitos humanos HRW (Human Rights Watch) criticou, em nota divulgada em seu site, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) pelo uso da Lei de Segurança Nacional pelo seu governo para investigar críticos.
Desde junho de 2020, a Polícia Federal instaurou, a pedido do governo, pelo menos quatro inquéritos com base na lei que entrou em vigor em 1983, durante a ditadura militar.
"O governo do presidente Jair Bolsonaro está usando uma lei repressiva promulgada durante a ditadura (1964-1985) para pedir sentenças de prisão contra pessoas que criticaram sua resposta desastrosa à pandemia de covid-19", diz a nota da HRW.
Em um dos casos envolvendo a Lei de Segurança Nacional que ganhou notoriedade, o ministro da Justiça, André Mendonça, ordenou a abertura de um inquérito em agosto de 2020 para investigar o advogado Marcelo Feller por críticas dirigidas a Bolsonaro no quadro "O Grande Debate", da emissora CNN.
Na última semana, a procuradoria da República no Distrito Federal se manifestou pelo arquivamento do caso. Durante o debate, o criminalista usou termos como "genocida, politicamente falando", "criminoso" e "omisso" para se referir ao presidente.
Para o diretor da divisão de Américas da Human Rights Watch, José Miguel Vivanco, a lei concede proteções especiais à reputação do presidente ou de outras autoridades do alto escalão, e das Forças Armadas;
"Em um país democrático que protege a liberdade de expressão, a população deveria ser capaz de monitorar e criticar autoridades, e debater livremente questões de interesse público, sem medo de retaliação ou punição", disse.
Outros casos
Além do inquérito contra Marcelo Feller, a Lei de Segurança Nacional já foi usada ou citada por André Mendonça em outras situações, a maioria para investigar profissionais da imprensa:
- O cartunista Renato Aroeira por uma charge e o jornalista Ricardo Noblat por compartilhá-la nas redes sociais
- O colunista da Folha de S.Paulo Helio Schwartsman por coluna em que sugeria que a morte de Bolsonaro poderia salvar vidas
Dois artigos em especial da Lei de Segurança Nacional são alvos de críticas da HRW: Um deles é o artigo 26, que pune com até quatro anos de prisão calúnias ou difamação contra o presidente da República, do Senado, da Câmara dos Deputados e do Supremo Tribunal Federal.
Já o artigo 23, que pune pune com até quatro anos de prisão quem "incitar à animosidade entre as Forças Armadas ou entre estas e as classes sociais ou as instituições civis", foi utilizado em um pedido da Procuradoria-Geral da República para investigar o ministro do STF Gilmar Mendes.
Na ocasião, ele disse que "o Exército está se associando a esse genocídio" ao criticar as ações do governo da pandemia. O ministério da Saúde é comandado por Eduardo Pazuello, um general da ativa, o que gerou reação do Ministério da Defesa.
José Miguel Vivanco vê uma tentativa de intimidação. "O presidente Bolsonaro, um defensor declarado do regime militar brasileiro, está usando uma lei repressiva da ditadura para tentar intimidar e silenciar as pessoas que discordam dele", disse o diretor da organização.
"O Congresso deveria fazer com que as leis do Brasil estejam em conformidade com as normas internacionais de direitos humanos e deveria revogar os artigos 23, 26 e outras disposições da Lei de Segurança Nacional que violam a liberdade de expressão", completou.
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