Autor de música cantada para Bolsonaro reclama do uso político da obra
O autor da música cantada para o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) hoje no Alvorada reclamou do uso político de sua obra. O compositor João Alexandre Silveira, 56 anos, disse que "Pra cima, Brasil" não foi feita para fazer homenagens a pessoas, sejam eles de esquerda, centro ou de direita.
"Jamais faria isso, nem que fosse o melhor presidente da República de todos os tempos. Jamais faria essa música para homenagear um presidente", afirmou ele ao UOL. "Essa música não foi feita para qualquer homem, foi feita para olhar para cima"
Hoje, Bolsonaro reclamou de governadores que, dos próprios cofres estaduais, pagam auxílio emergencial a pessoas atingidas economicamente na pandemia de coronavírus. As críticas foram feitas no jardim do Palácio da Alvorada nesta sexta-feira (12). Logo depois, uma mulher cantou "Pra cima, Brasil".
Silveira a compôs em 1992, quando assistia ao noticiário sobre o impeachment do então presidente Fernando Collor (PTB).
Dois versos dizem: "Homens com tanto poder e nenhum coração/ gente que compra e que vende a moral da nação". No entanto, hoje, no Alvorada, a apoiadora disse entender que o primeiro verso "não é o caso" de Bolsonaro.
Evangélico presbiteriano de 56 anos, Silveira afirma não ter preferência política. Ele acredita que Bolsonaro tem tentado fazer um bom governo. Mas é crítico à forma como ele conduz o país, principalmente na pandemia de coronavírus.
Canção já foi usada politicamente antes, lembra
Silveira destacou que o objetivo da música é mostrar Deus como a solução para problemas do país. A canção pede que as pessoas olhem "para cima", não para a esquerda ou direita, destacou Silveira.
No entanto, a canção já foi usada politicamente outras vezes, recorda. Uma delas foi na campanha eleitoral do ex-governador Anthony Garotinho (ex-PSB, PR). Outro personagem foi o ex-deputado e bispo da igreja Sara Nossa Terra, Robson Rodovalho (ex-DEM-DF).
Em tempos mais recentes, Silveira processou judicialmente um grupo de militantes bolsonaristas. Eles usaram um vídeo com sua canção sem autorização para homenagear Bolsonaro. Eles editaram as cenas com imagens do músico e de seu filho misturando-as com fotos do presidente.
"É como se eu tivesse feito uma homenagem ao Bolsonaro", explicou o músico à reportagem. "Você não deve pegar música de ninguém para homenagear ninguém sem que o autor saiba."
Bolsonaro deveria ter comprado vacina antes, diz
Silveira é crítico da atuação de Bolsonaro na vacinação. Para ele, o presidente demorou a contratar os imunizantes, o que está atrasando as entregas agora. "Ele deveria ter tomado atitudes mais cedo. Você não compra vacina hoje e chega amanhã. Você tem que pedir com meses de antecedência."
O músico também critica o presidente pela forma "ideológica" como enxerga as críticas recebidas. Reclama dos arroubos da família, como o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP). "Como é que você manda alguém enfiar a máscara no rabo? Tá louco, cara? Tá com a cabeça aonde? Todo mundo morrendo. Os dias estão muito tristes."
Apesar disso, acredita que o presidente tenta fazer um governo bom. Para ele, Bolsonaro enfrenta problemas herdados do passado. "Nada contra ele [Bolsonaro]. Ele está tentando ser presidente." Para Silveira, "o discurso dele é em cima da pessoa de Deus". "Saber até onde isso tem base, não posso afirmar", continuou.
Decepção com Lula tirou músico das urnas
Silveira foi eleitor de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 1998 e 2002, mas depois nunca mais foi às urnas. Decepcionou-se quando viu o petista em fotos ao lado de Collor e José Sarney (MDB-AP).
"Tem muitos erros. Qualquer um que pegue um país com 20 anos de roubalheira e tenha um mandato para resolver, não vai conseguir. Pode ser ele, pode ser o Ciro Gomes [PDT], pode ser a Marina Silva [Rede], pode ser o Lula. O Lula, não: ele seria a continuidade."
Ele diz não ser ligado a partidos, mas sem demonizar siglas. "Não acho que a toda a esquerda seja demoníaca, nem que toda a direita seja sacrossanta." Por outro lado, entende que muita gente quer tirar Bolsonaro do cargo não por causa dos erros da administração dele, mas devido à guerra ideológica pelo poder.
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