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Bolsonaro prepara corte em área social para dar cargos a padrinho de Flávio

Marcelo Magalhães (ao centro) com o presidente Jair Bolsonaro e o senador Flávio Bolsonaro durante audiência - Alan Santos/Presidência da República
Marcelo Magalhães (ao centro) com o presidente Jair Bolsonaro e o senador Flávio Bolsonaro durante audiência Imagem: Alan Santos/Presidência da República

Igor Mello

Do UOL, no Rio

26/03/2021 04h00

Resumo da notícia

  • O governo elabora um decreto para dar mais 30 cargos para a Secretaria Especial do Esporte
  • O órgão é comandado por Marcelo Magalhães, padrinho de casamento de Flávio Bolsonaro
  • As mudanças, se confirmadas, resultarão em menos cargos para a área social em meio à pandemia
  • O número de cargos foi selado após reuniões de Magalhães e do ministro da Cidadania, João Roma, com Bolsonaro em 10 de março
  • O Ministério da Cidadania relacionou o plano ao fim de um contrato de terceirização

O presidente Jair Bolsonaro deve assinar nos próximos dias um decreto que prevê mudança na estrutura de cargos do Ministério da Cidadania, responsável por toda a área social do governo.

O texto prevê redução no tamanho de áreas técnicas responsáveis pela política de Assistência Social e pelo combate a fraudes para dar 30 novos cargos subordinados a Marcelo Reis Magalhães, secretário especial do Esporte e padrinho de casamento do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho mais velho do presidente.

As mudanças devem ocorrer em meio à fase mais aguda da pandemia de covid-19, quando o governo se prepara para voltar a pagar o auxílio emergencial.

Segundo a minuta do decreto, obtida pelo UOL por meio do SEI (Sistema Eletrônico de Informações), o número de cargos comissionados da Secretaria Especial do Esporte subirá de 80 para 110. A reportagem confrontou o quadro demonstrativo de cargos contido na minuta do decreto com a última relação de ocupantes desses postos, publicada pela pasta em outubro de 2020.

Procurado pelo UOL, o Ministério da Cidadania afirmou que as mudanças têm o objetivo de restabelecer o quadro de funcionários da Secretaria Especial do Esporte, afetado pelo fim de um contrato de terceirização.

A justificativa, porém, não está nos pareceres técnicos sobre a reformulação. Em nota, a pasta também diz que "continuará trabalhando sistematicamente para fortalecer os programas sociais e estabelecer uma rede de proteção para a população mais vulnerável do país".

Na reforma administrativa feita por Bolsonaro ao assumir o governo, a área do Esporte perdeu o status de ministério e foi incorporada ao recém-criado Ministério da Cidadania —que também ficou com as funções do antigo Ministério do Desenvolvimento Social.

As mudanças

Entre as mudanças previstas no texto, estão reduções em equipes de áreas técnicas responsáveis por políticas públicas para a população mais pobre.

Se o texto original do decreto for aprovado, a Sagi (Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação), responsável por monitorar a efetividade das políticas adotadas e por combater fraudes em programas, terá seu número de funcionários reduzido de 38 para 34 cargos.

Outro órgão a ser afetado é a Secretaria Nacional de Assistência Social. A área é responsável pela coordenação do Suas (Sistema Único de Assistência Social) e pela gestão do FNAS (Fundo Nacional de Assistência Social). Na secretaria, é prevista redução no número de cargos de 68 para 64.

Reuniões com Bolsonaro

O plano de realizar cortes na área social da pasta ocorre em meio ao mais grave momento da pandemia de covid-19, com prefeitos, governadores, parlamentares e especialistas cobrando o governo federal sobre políticas públicas que viabilizem as medidas de isolamento social.

Na semana passada, Bolsonaro entregou ao Congresso uma Medida Provisória para a retomada do auxílio emergencial —benefício operacionalizado justamente pela área social do Ministério da Cidadania.

Segundo fontes no Ministério da Cidadania, as mudanças têm como objetivo aumentar o poder de Magalhães —indicado por Flávio Bolsonaro (Republicanos) para o cargo.

Uma pessoa com acesso direto às discussões sobre o decreto diz que, diante de divergências entre o ministro da Cidadania, João Roma (Republicanos-BA), e o padrinho de Flávio sobre o número de cargos a serem transferidos, o próprio presidente da República definiu a questão.

Bolsonaro recebeu separadamente ambos no Palácio no Planalto em 10 de março para bater o martelo sobre o número de cargos que Magalhães ganharia. Os encontros constam na agenda oficial da Presidência da República. Dois dias depois, o presidente voltou a receber João Roma.

O plano de turbinar a Secretaria Especial do Esporte está em curso desde janeiro, mas teve que ser adiado diante da mudança de comando —Roma, que é muito próximo a ACM Neto (DEM), ex-prefeito de Salvador e presidente Nacional do DEM, substituiu Onyx Lorenzoni (DEM) no cargo em fevereiro.

O parecer técnico que justifica a mudança tem apenas seis páginas e não detalha possíveis impactos na área social da pasta com a mudança.

Segundo o documento, "a atual estrutura da Secretaria [Especial do Esporte] é insuficiente para atender de forma satisfatória a todas as demandas existentes".

Segundo uma fonte, a necessidade de dar um verniz técnico à mudança provocou constrangimento entre os funcionários de carreira na pasta.

Outro lado

Procurado, o Ministério da Cidadania afirma que as mudanças estão em estudo desde o ano passado e têm como objetivo "recompor o quadro da secretaria, que perdeu diversos profissionais em 2020, após o encerramento da vigência do contrato com uma empresa terceirizada". Ao todo, foram desligadas do Ministério da Cidadania cerca de 500 pessoas, segundo a pasta.

Ainda de acordo com o ministério, "é compromisso da atual gestão" fortalecer a área. O aumento no número de cargos "busca garantir uma estrutura adequada para o Esporte, principalmente neste ano, em que deverão ser realizados os Jogos Olímpicos e Paralímpicos de Tóquio", diz.

Por fim, o Ministério da Cidadania afirma que "continuará trabalhando sistematicamente para fortalecer os programas sociais e estabelecer uma rede de proteção para a população mais vulnerável do país".

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do informado, ACM Neto (DEM) é ex-prefeito de Salvador, e não mais prefeito. O texto corrigido.