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'Distopia sem fim', fala cientista político sobre governo Bolsonaro

Jair Bolsonaro aglomera durante a pandemia - Diego Gurgel/ISHOOT/Estadão Conteúdo
Jair Bolsonaro aglomera durante a pandemia Imagem: Diego Gurgel/ISHOOT/Estadão Conteúdo

Colaboração para o UOL

07/04/2021 09h56

Em coluna do The New York Times, o cientista político Gaspard Estrada chamou o governo de Jair Bolsonaro (sem partido) de "distopia aparentemente sem fim". No texto, ele analisou o atual cenário da gestão da covid-19 e apontou um autoritarismo crescente na política brasileira. O franco-mexicano avaliou que a saída em massa de ministros na semana passada foi um desequilíbrio provocado pelo presidente para retomar protagonismo após a volta política de Lula.

"Ao fabricar uma nova crise através destas mudanças em seu gabinete, Bolsonaro parece querer semear o medo na sociedade, intimidar seus oponentes e impedir os partidos de centro-direita que apoiam seu governo de apoiar seu impeachment", pontuou. "A aposta fracassada acabou revelando a crescente fragilidade política do capitão aposentado, em um momento em que o número de mortos devido à covid-19 atingiu um novo recorde e as perspectivas econômicas continuam a escurecer, com o desemprego e a inflação das commodities em alta", escreveu Estrada. Ontem foi registrado um novo recorde: 4.211 mortes por coronavírus em 24 horas.

Com a pressão crescente das eleições de 2022, o cientista político se preocupa com as posições que o presidente brasileiro pode tomar, já que ele não possui um plano claro de ação contra a pandemia e a popularidade de Lula, seu maior rival político, só cresce. "O que não sabemos é o que ele fará de agora em diante para permanecer no poder, se o fará por voto ou força. Diante da irresponsabilidade crônica do executivo federal, os governos estaduais e locais, juntamente com a sociedade civil e a oposição, devem agir para evitar que o caos sanitário se aprofunde e que os impulsos autoritários do presidente se materializem", completou.

Para piorar o cenário presidencial, Estrada notou que Bolsonaro vem perdendo apoio do centrão, inclusive do presidente da Câmara, Arthur Lira. "O aliado do presidente havia deixado clara sua insatisfação com o tratamento da pandemia pelo governo. É um sinal preocupante", disse. Além dos agentes políticos, o presidente tem recebido menos apoio do povo, com a insatisfação chegando a empresários e camadas mais ricas da sociedade. Ao mesmo tempo que o número diário de mortes por coronavírus aumenta rapidamente, Bolsonaro tem se preocupado em reabrir cultos para conquistar apoiadores religiosos.

"Para preservar seu poder em 2021 e manter vivas suas aspirações de reeleição em 2022, Bolsonaro está brincando com o fogo", alertou o cientista político. "As próximas semanas serão dramáticas: enquanto uma projeção da Universidade de Washington afirma que, na pior das hipóteses, o Brasil poderia terminar a primeira metade de 2021 com quase 600.000 mortes por covid, Bolsonaro continua a promover o caos, em vez de trabalhar para obter vacinas e apoiar medidas de distanciamento social. Esse é o ambiente ideal para seus sonhos autoritários", pontuou.

No texto, Estrada colocou que todos os setores da sociedade precisam se mobilizar para combater o crescente autoritarismo no Brasil. O colunista pede que os cidadãos não normalizem a presença das forças militares na vida pública e que os governadores percam o medo de bater de frente com o mandante federal. "O ex-presidente Lula, que conseguiu capitalizar positivamente em seu retorno à arena política, deve manter sua posição de abertura e diálogo para oferecer uma solução política para a dramática situação do país. Este não é o momento de pensar em uma 'terceira via' entre Lula e Bolsonaro, mas de agir para salvar vidas e evitar o deslizamento do Brasil em direção ao autoritarismo", afirmou.