Agressão de chefe da PRF a frentista causa perda de R$ 50 mil ao governo
O paranaense Silvinei Vasques, de 46 anos, escolhido por Jair Bolsonaro (sem partido) para comandar a PRF (Polícia Rodoviária Federal), causou um prejuízo de mais de R$ 50 mil à União. O motivo da dívida: a administração federal foi obrigada a indenizar um frentista que foi agredido pelo servidor após se recusar a lavar um carro da corporação.
Silvinei foi condenado pela Justiça Federal de Santa Catarina em 2017, mas vem recorrendo desde então na tentativa de não assumir o ônus gerado aos cofres públicos. Em 2019, ele entrou com uma apelação no TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) —desde então, o caso aguarda uma definição.
Em resposta ao UOL, a Polícia Rodoviária Federal informou que o atual diretor-geral tem direito à ampla defesa, e que, caso seja "condenado em todas as instâncias, o mesmo irá arcar, de forma imediata, com o dever de ressarcir a União".
O ato de violência narrado na decisão judicial ocorreu na cidade de Cristalina, em Goiás, em 2000. À época, Silvinei e outros policiais rodoviários pararam com cinco carros em serviço em um posto de gasolina. O acusado teria então solicitado que o frentista, cuja identidade será preservada, limpasse uma das viaturas —serviço além do limite de suas obrigações.
Diante da negativa do frentista, Silvinei teria dado socos no funcionário do posto.
"Conforme consta no referido processo judicial, como no posto de gasolina não tinha como norma fazer a lavagem de veículos policiais, [o frentista] negou-se a proceder conforme lhe foi solicitado e neste momento sofreu agressão física cometida pelo réu Silvinei Vasques, mediante socos em seu abdômen e suas costas, sendo que os demais policiais presentes não fizeram nada para cessar as agressões", diz o texto da sentença.
"Com tal atitude praticada pelo réu, [a vítima] se sentiu humilhada, levando o mesmo a registrar boletim de ocorrência por conta da agressão sofrida, bem como necessitou se ausentar do trabalho e adquirir medicamentos para tratar as lesões corporais sofridas."
O frentista acionou a Justiça de Goiás e pediu uma indenização por danos morais de R$ 100 mil. A ação correu em âmbito estadual até 2012, quando houve a primeira condenação, pela qual a União foi obrigada a pagar valor fixado em R$ 20 mil.
A execução da dívida ocorreu no ano seguinte e, considerando o período de retroatividade, o montante foi atualizado para R$ 52.973,76 (incluindo os honorário advocatícios).
Depois de pagar a indenização, a União decidiu cobrar o valor de Silvinei e recorreu à Justiça de Santa Catarina, estado em que o servidor fez carreira na PRF e chegou à superintendência da unidade regional em 2011. O processo resultou em condenação em 2017. À época, com a atualização dos valores, o policial foi sentenciado a ressarcir os cofres em R$ 71.142,83.
Ou seja, considerando que a decisão é de quatro anos atrás, o valor atualizado da dívida seria ainda maior caso os recursos de Silvinei sejam negados pelo TRF-4. Segundo o Portal da Transparência do governo federal, o salário líquido pago ao agente público em fevereiro de 2021 (última data disponível) foi de R$ 17.434,34.
'Bolsonarista' dentro da PRF
O UOL apurou com fontes da AGU (Advocacia-Geral da União) que, embora tenha obtido uma decisão favorável anteriormente há quatro anos, o governo não tem dado tanta "ênfase" à resolução do caso durante a gestão Bolsonaro —iniciada em janeiro de 2019.
Silvinei é considerado um "bolsonarista" dentro da PRF e tem relações diretas com a base política do presidente no Rio de Janeiro, em especial com o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ).
Segundo avaliações internas e relatos de outros dirigentes da corporação, depois de acumular problemas judiciais em Santa Catarina —onde foi denunciado pelo Ministério Público Federal por corrupção, mas o processo terminou com a absolvição dele e de outros réus—, o servidor vem desfrutando de uma suposta "ascensão meteórica" nos últimos dois anos.
Antes de assumir o cargo de diretor-geral, Silvinei era superintendente da Polícia Rodoviária Federal no Rio de Janeiro —uma das unidades da instituição de maior visibilidade no território nacional. Ele assumiu a função em abril de 2019 depois de liderar no estado uma operação contra o crime organizado.
O desempenho operacional se deu em paralelo com as atividades políticas do policial, que estreitou laços com Flávio Bolsonaro por intermédio do deputado estadual bolsonarista Charlles Batista (PSL-RJ) —também agente da PRF. Silvinei também buscou criar laços com o governador eleito, Wilson Witzel (PSC), e assim conseguiu uma indicação para integrar o conselho da Emop (Empresa de Obras Públicas no Estado).
Sob alegação de lealdade a Flávio Bolsonaro, o agente deixou o cargo na Emop em novembro de 2019, depois que o presidente entrou em rota de colisão com Witzel, seu ex-aliado, o que provocou um racha dentro do PSL (antigo partido do filho e do presidente) e isolou ainda mais o governador eleito (um ano depois, ele seria afastado do cargo devido a indícios de corrupção).
Silvinei também buscou uma aproximação com o então prefeito, Marcelo Crivella (Republicanos), correligionário de Flávio e aliado do presidente da República. Na condição de superintendente da PRF no Rio, o agente apareceu em vários eventos ao lado do político, e a parceria resultou em iniciativas de cooperação. Uma delas foi um convênio para criação do programa "Alerta Brasil", que previa a integração entre os sistemas de inteligência da PRF e as câmeras da prefeitura.
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