Em Alagoas, Bolsonaro relança viaduto já inaugurado por Renan Filho em 2020
Em meio à CPI da Covid, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) desembarca hoje em Alagoas para participar de três solenidades oficiais, entre elas a "inauguração" de um viaduto que está aberto ao público desde dezembro de 2020.
A chegada de Bolsonaro coincide com um momento de acirramento entre o presidente e o relator da Comissão Parlamentar de Inquérito, o senador alagoano Renan Calheiros (MDB), que também é pai do governador do estado. Ontem, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), que é filho do presidente, foi à CPI chamou Renan de "vagabundo".
Segundo apurou o UOL, o governador Renan Filho (MDB) não vai participar de nenhum evento no estado com o presidente.
"A vinda de Bolsonaro a Alagoas tem uma estratégia política por trás. Primeiro, é uma resposta, uma afronta a Renan Calheiros pelo seu comportamento na relatoria da CPI. É também uma forma de dizer que tem aliados no estado, que tem alguma força política e mandar o recado: mexer com Bolsonaro vai respingar politicamente em cima dos Renans", explica a cientista política Luciana Santana, da Ufal (Universidade Federal de Alagoas).
A presença de Bolsonaro, oficialmente, foi motivada por um convite do prefeito de Maceió, João Henrique Caldas, o JHC (PSB), para inaugurar 500 casas de um conjunto residencial no bairro do Benedito Bentes. JHC é adversário político dos Calheiros e cotado para disputar a sucessão ao governo.
A agenda de Bolsonaro incluiu também "inaugurar" o viaduto da PRF, no bairro do Tabuleiro do Martins, que foi aberto ao trânsito em 23 de dezembro de 2020. A obra, que inclui também pequenos túneis, foi inaugurada à época em cerimônia pelo governador e aliados.
O viaduto custou R$ 102 milhões e era um sonho antigo da capital alagoana. Serviu para desafogar o trânsito em uma das áreas mais críticas da cidade.
O empreendimento teve investimento do governo federal de R$ 77,4 milhões (todos empenhados na gestão de Dilma Rousseff e Michel Temer), com contrapartida de R$ 25 milhões do governo do estado.
Em nota enviada após a publicação da reportagem, o Ministério da Infraestrutura disse que o complexo viário não estava pronto e o governador Renan Filho só inaugurou a obra parcialmente. "O novo complexo conta com três níveis, incluindo uma rotatória no plano da rodovia, dois mergulhos de trincheira no subsolo, além da passagem superior do viaduto. A liberação, em dezembro, consistiu em parte da passagem superior, com duas faixas de cada lado, uma faixa em cada trincheira do subsolo, além de segmento da rotatória."
Além da capital, Bolsonaro vai a São José da Tapera, no sertão alagoano, inaugurar à tarde o trecho 4 do Canal do Sertão (uma pequena transposição do rio São Francisco pelo sertão). Apesar de não ter tido um ato formal de abertura de comportas, esse trecho entrou em operação em abril, segundo o governo do estado.
Iniciada no governo Lula, a obra tem o maior aporte de recursos federais no estado e concluiu mais uma etapa, que incluiu canais do km 92 ao km 123 do projeto.
Carona em obras e no bolsonarismo
Luciana Santana lembra que as tais "inaugurações", além de já prontas e em operação, não são fruto da atual gestão.
Bolsonaro já vem sendo conhecido por inaugurar obras que não foram iniciadas em seu governo. No Nordeste, tem tentado fazer isso de uma forma muito mais intensa, porque é uma região que ele tem menos força política.
Luciana Santana, cientista política
Pesquisa Datafolha divulgada ontem apontou rejeição de 62% a Bolsonaro no Nordeste.
Maceió deu a maior votação a Bolsonaro no Nordeste no segundo turno de 2018. Não à toa, a presença do presidente já tem ato marcado de apoio no aeroporto.
"Maceió é um dos municípios nordestinos que tem um movimento forte de apoio, com políticos sempre organizando manifestações pró-Bolsonaro. Então, eu diria que, do Nordeste, é a capital que tem o contingente maior de bolsonaristas —e isso faz com que seja uma porta de entrada também para o Bolsonaro", explica.
Para o cientista político Ranulfo Paranhos, também da Ufal, a visita neste momento não se justifica com objetivo de angariar votos ou reforçar laços com seu público, mas mais como uma resposta a Calheiros.
Alagoas é um colégio eleitoral pequeno, corresponde a mais ou menos 2,6% do colégio eleitoral nacional. É um esforço com baixa racionalidade do ponto de vista eleitoral. É muito mais no sentido de vingança, no sentido de tentar retirar bases do próprio Renan Calheiros e de Renan Filho.
Ranulfo Paranhos, cientista político
Prefeito do PSB aliado de Bolsonaro?
O prefeito de Maceió, do PSB, será o anfitrião do presidente. JHC se classifica como um político independente, mas se mostra sempre muito mais apoiador de Bolsonaro. Um exemplo tem relação com as vacinas contra a covid: quando elas chegam, agradece ao Ministério da Saúde. Quando faltam, cobra o governo do estado.
"JHC nunca se pautou nem se posicionou como sendo da oposição ao governo federal, como o PSB tem feito. A gente não sabe se ele é realmente bolsonarista, se ele defende esse governo ou não", afirma o cientista político Ranulfo Paranhos.
Para ele, o prefeito, aos 33 anos, é um político ainda jovem e que nunca demonstrou laços ideológicos com a esquerda. Apesar do convite a Bolsonaro, Paranhos ainda diz que a visita não deve ser vista como uma aliança ou ingresso no bolsonarismo.
"Quer dizer que, se a cidade precisar, vai buscar junto ao governo federal os recursos necessários, porque tem boas relações, não é oposição", finaliza.
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