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Flávio Bolsonaro ressurge em CPI, vira alvo de Renan e contra-ataca Witzel

Hanrrikson de Andrade e Luciana Amaral

Do UOL, em Brasília

16/06/2021 19h43Atualizada em 16/06/2021 20h07

Depois de ajudar a eleger Wilson Witzel para o governo do Rio de Janeiro em 2018, Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) reencontrou hoje o ex-aliado, agora rival declarado, durante oitiva da CPI da Covid, no Senado Federal. A audiência foi marcada por confrontos entre eles.

O filho de Jair Bolsonaro (sem partido), que havia se ausentado da comissão nas últimas semanas, ressurgiu e, no decorrer dos trabalhos, foi chamado de "mimado" por Witzel. Em resposta, visivelmente irritado, o congressista acusou o desafeto de recorrer a "mentira deslavada" e de ter "enganado o eleitor" fluminense.

O relator, Renan Calheiros (MDB-AL), também visto como inimigo político pela família Bolsonaro, protagonizou duelo à parte com Flávio. Ao formular perguntas para o ex-governador do Rio, o emedebista abordou temas sem relação direta com a covid-19, como a investigação da "rachadinha" no caso Queiroz e um suposto vínculo a milícias no estado.

A relação entre Calheiros e Flávio tem sido conturbada desde o começo da CPI. Há exatamente um mês, eles tiveram uma acalorada discussão durante o depoimento do publicitário Fábio Wajngarten, ex-chefe da Secom (Secretaria Especial de Comunicação Social) da Presidência da República.

O filho do presidente chamou o veterano parlamentar de "vagabundo". "Imagina um cidadão honesto dizendo a verdade ser preso por um vagabundo como Renan Calheiros", declarou Flávio em defesa de Wajngarten, em 12 de maio. O mesmo termo já havia sido utilizado por Bolsonaro, o pai, para se referir ao relator da CPI.

No embate hoje com Witzel, Flávio ficou em situação desconfortável em pelo menos dois momentos mais tensos. Depois de provocações de parte a parte, o ex-governador fluminense disse que o ex-aliado, caso fosse "um pouquinho mais educado e menos mimado", agiria com mais respeito durante o depoimento. O congressista rebateu: "Experiência não tem a ver com idade".

Posteriormente, ao longo das perguntas feitas por Renan a Witzel, Flávio foi exposto à medida que o relator fez menção direta ao caso Fabrício Queiroz (ex-assessor do senador alvo de suspeita de corrupção). O relator reproduziu trecho de uma entrevista antiga do ex-governador na qual ele defendia a prisão do filho de Bolsonaro.

Flávio tentou interromper Renan ao reclamar com o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM). "O que é que isso tem a ver com covid?", questionou. Aziz respondeu: "Para mim, nada. (...) Mas é a pergunta do relator e eu não posso intervir na pergunta de nenhum senador aqui. Para mim, absolutamente nada, mas o que eu posso fazer?".

Witzel disse ainda que, à época da campanha eleitoral de 2018, foi procurado por Flávio para "dar a ele tempo de televisão" [em referência ao horário eleitoral gratuito], "porque ele não tinha tempo de televisão".

"Na verdade, quem procurou o então candidato Wilson Witzel, que foi membro da magistratura federal, a quem ele queria dar o braço para poder dar à própria campanha dele uma alavancada, porque ele estava em quarto, quinto nas pesquisas, foi ele", comentou o depoente.

Aliança rompida

A aliança entre os dois foi costurada no auge do chamado "bolsonarismo", quando a campanha de Jair Bolsonaro à Presidência da República decolou. Além de chegar ao segundo turno e derrotar o candidato do PT, Fernando Haddad, a ascensão do então deputado federal, associado ao movimento conservador, ajudou a eleger centenas de políticos pelo país que se utilizaram do mesmo ideário.

No Rio, o ex-juiz federal Witzel, até então estreante na política e desconhecido do grande público, subiu de forma meteórica nas pesquisas eleitorais pouco antes do primeiro turno. A escalada coincidiu com o período em que ele começou a fazer campanha ao lado de Flávio e aderiu de corpo e alma ao "bolsonarismo".

A aliança foi rompida em 2020, durante a pandemia da covid-19, quando Witzel começou a se articular nos bastidores para concorrer à Presidência da República e virou adversário da família Bolsonaro.

Direito de resposta

Ao fim das indagações do relator Renan Calheiros, Omar Aziz concedeu direito de resposta a Flávio.

"Esse conchavo dessa pessoa com outra aqui [referindo-se a Witzel e Renan] que é suspeita de desviar R$700 milhões na saúde do Rio de Janeiro, em plena pandemia... Como diz o colega e amigo senador Eduardo Girão [Podemos-CE], isso não é corrupção, isso é assassinato. E tem, sim, o depoente a mão suja de sangue entre esses quase 500 mil mortos."

"Esse, sim, é o culpado. E vem aqui e cria um monte de narrativa mentirosa. E eu faço questão de desmascarar, porque ele foi eleito mentindo, enganando a população do Rio de Janeiro, e se revelou depois que sentou naquela cadeira de governador."

O senador acusou o depoente de criar uma "narrativa" de perseguição. "Porque essa narrativa de que há uma mobilização para persegui-lo, isso não existe. É mentira deslavada! Só que você enganou o eleitor do Rio; os senadores, você não vai enganar, não."

'Terceiro tempo'

O bate-boca entre Flávio e Witzel continuou mesmo após o fim do depoimento à CPI. Em declarações à imprensa, eles seguiram trocando farpas.

O filho de Jair Bolsonaro chegou a abrir uma transmissão ao vivo nas redes sociais para comentar as declarações do adversário. Até então, o parlamentar não havia se comportado de tal maneira nas audiências da CPI.

"Na campanha eleitoral, o ex-governador corria atrás da gente de tudo quanto era jeito, implorava pelo nosso apoio. Ele diz que se converteu [à religião evangélica], não está parecendo muito não, continua um grande mentiroso", declarou Flávio.

"Continua uma pessoa arrogante, que não tem nenhum compromisso com a verdade. Ele veio para cá com uma narrativa de perseguido político, só que ele mente tanto que ele esqueceu de falar que a investigação contra ele começou com a Polícia Civil do estado do RJ e o Ministério Público estadual."

Governistas veem parcialidade

Senadores governistas voltaram a se reclamar do que chamam de "parcialidade" da CPI depois de Witzel interromper o depoimento quando havia começado a ser mais questionado sobre a suposta corrupção na administração estadual em meio à pandemia.

O senador Eduardo Girão (Podemos-CE) afirmou que Witzel "veio fazer o jogo do relator e do presidente da comissão para dizer coisas que queriam ouvir e, na hora em que começam senadores que pensam diferente e querem investigar não apenas o governo federal, mas também estados e municípios, ele vai embora".

"Picar a mula numa hora dessa é algo que a gente não deve fazer, sair, fugir. O povo ficou sem respostas em relação a isso. É muito triste o que aconteceu hoje, mas é a cara dessa CPI. Acho que hoje caiu a máscara", disse.

O senador Carlos Portinho (PL-RJ), aliado de Bolsonaro no Rio, afirmou que, "se a CPI quiser morrer abraçada" com Witzel, "é uma boa oportunidade".