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Com discurso em tom eleitoral, Eduardo Leite renuncia ao governo do RS

Lucas Borges Teixeira

Do UOL, em São Paulo

28/03/2022 14h39Atualizada em 28/03/2022 17h24

O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), anunciou a renúncia ao cargo na tarde de hoje (28). Em tom eleitoral, ele confirmou que não deixaria o PSDB e, sem falar diretamente em planos futuros, disse que estava deixando o governo para respeitar a legislação eleitoral e "se sente preparado para ser presidente".

O anúncio, feito em vídeo transmitido em coletiva no Palácio Piratini, já era esperado por tucanos e pessoas próximas. Em seu discurso, ele argumentou que, apesar de as prévias tucanas terem escolhido o governador paulista João Doria como pré-candidato, há "novos atores" no jogo, referindo-se à possível aliança com MDB e União Brasil. O vice, Ranolfo Vieira Júnior (PSDB), deverá assumir o posto na próxima quinta-feira (31).

Eu me sinto preparado, me sinto em condições, tenho vontade, tenho disposição de ser, sim, presidente. Mas ninguém é candidato pela mera vontade pessoal. Uma candidatura à presidência é um projeto que tem de ser construindo coletivamente e eu estarei me apresentando, se entenderem que nesta função eu deva colaborar.
Eduardo Leite, durante renúncia ao Palácio Piratini

Derrotado nas prévias do partido, Leite tem sido estimulado por membros do partido a seguir como pré-candidato e chegou a ser sondado por outras siglas. Segundo as regras da Justiça Eleitoral, qualquer comandante do Executivo deve entregar o cargo para se candidatar a outro cargo até o sábado (2). Pré-candidato tucano ao Planalto, Doria deverá repassar o cargo a Rodrigo Garcia (PSDB), que tentará reeleição em outubro.

Em seu discurso, Leite não disse que tentará concorrer ao Planalto, mas se referiu a uma "construção nacional" em diversos momentos.

"Eu atendo ao que a legislação eleitoral exige: renunciar ao mandato de governador para estar na política atuando nessa eleição, que é decisiva, buscando dar toda a a colaboração que eu puder para ajudar o país nesse momento crítico", declarou.

"A renúncia me abre muitas possibilidades e não me retira nenhuma", afirmou Leite. "Renunciar ao mandato me abre diversas possibilidades, todas elas, então é neste momento que eu me abro para me apresentar e esteja onde mais possa dar minha contribuição."

Como na disputa pelas prévias, Leite seguiu falando em união e disse ter ligado para Doria. "Reafirmamos que estamos com o mesmo sentimento. Eu respeito as prévias. Elas aconteceram, são legítimas, mas não é sobre projeto pessoal, é sobre Brasil", afirmou o gaúcho.

"Precisamos de uma alternativa que fale de futuro, e que construa esse futuro. precisamos que o Brasil cumpra esse futuro", disse Leite sem citar a pré-candidatura de Doria.

Na manhã de ontem (27), o paulista já havia criticado uma possível tentativa de Leite em se tornar candidato, o que chamou de "golpe" e "uma tentativa torpe, vil, de corroer a democracia e fragilizar o PSDB".

"As prévias deram ao partido um candidato, não um partido para o candidato", argumentou Leite.

Pré-candidato?

No vídeo, transmitido antes de Leite receber jornalistas, ele fala que que não está se despedindo "mas se apresentando". Em tom de pré-candidato, ele afirmou que deverá rodar o país para ouvir eleitores e acompanhar as decisões do PSDB.

Há uma conversa bem adiantada entre MDB, União Brasil, PSDB e federação com Cidadania. Então, tem novos atores nesse processo no qual o PSDB discutiu a sua candidatura presidencial. As prévias não perdem a legitimidade, mas elas não têm a exclusividade na medida que novos atores se envolvem. Isso vai ser discutido no momento que a política proporciona.
Eduardo Leite, durante renúncia ao Palácio Piratini

"Naturalmente nós temos nossas inspiração de forma individual, a vontade de estar protagonizando naquele caminho que escolhemos atuar. É claro que desejo dar minha contribuição como presidente da República", respondeu Leite sobre possível pré-candidatura.

Nos comentários do YouTube, que exibiu a coletiva, a maioria dos apoiadores comentava "Leite presidente", enquanto alguns ainda pediam que ele ficasse no governo e buscasse reeleição, algo que descarta desde o primeiro ano de mandato. Entre as possibilidades especuladas para Leite seria assumir uma candidatura ao Senado, com chance de eleição, mas sem entrar em conflito interno. No estado, ele indicou o nome de Ranolfo como candidato do PSDB ao Piratini.

"Se outro projeto conquistar a preferência de liderar nacionalmente, nós vamos discutir em âmbito local onde melhor eu posso dar a contribuição", afirmou Leite.

Segundo fontes tucanas ouvidas pelo UOL, o principal grupo de apoio a Leite nas prévias, liderado pelo deputado Aécio Neves (PSDB-MG), pelo senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) e pelo ex-senador José Aníbal (PSDB-SP), segue como principal endosso a ele seguir como pré-candidato pelo partido.

Com a renúncia dentro da data prevista, Leite segue como nome elegível. Ele chegou a ser sondado por Gilberto Kassab, presidente do PSD, para se tornar o nome do partido, mas negou o convite no final da semana passada, dissuadido por caciques tucanos. Em seu discurso, ele agradeceu nominalmente o convite de Kassab.

Um dos principais argumentos do grupo mais próximo ao gaúcho é a estagnação de Doria como quinto colocado nas pesquisas. De acordo com o último DataFolha, divulgado na quinta (24), o paulista marcou apenas 2% das intenções de votos —situação semelhante às pesquisas de outros institutos, em que o paulista chega, no máximo, a 3% —enquanto a rejeição segue na faixa dos 30%, enquanto Leite ficou com 14%.

Com o fantasma de 2018 — quando Alckmin teve menos de 5% dos votos — ainda sondando o partido, a aposta para o grupo é que o nome de Leite, mais desconhecido, tem mais chance de atrair o eleitor indeciso e unir a almejada "terceira via", que rejeita o ex-presidente Lula (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL), os dois melhores cotados nas pesquisas. Há, no entanto, o problema das prévias.

Para muitos tucanos, a insistência pelo nome de Leite pode macular ainda mais a imagem do PSDB como partido rachado e que não respeita resultados de urnas. Para tantos outros, a pecha de mau perdedor poderia atrapalhar Leite em uma possível campanha.

Bruno Araújo, Doria e Eduardo Leite após anúncio da vitória do governador de de SP nas prévias - Reprodução - Reprodução
Bruno Araújo, Doria e Eduardo Leite após anúncio da vitória do governador de de SP nas prévias
Imagem: Reprodução

Briga nas prévias

As prévias do PSDB, realizadas em novembro de 2021, foram tumultuadas. Com problemas no aplicativo de votação, o pleito foi suspenso por uma semana e o resultado, previsto para uma super conferência no dia 20 de novembro, só saiu 27, com direito a troca de farpas entre as campanhas.

O partido divulgou que Doria ficou com 53,99% dos votos, enquanto Leite registrou 44,66% e o ex-senador Arthur Virgílio (PSDB-AM) marcou 1,35%.

Após o anúncio do resultado, os três candidatos se reuniram ao lado de Bruno Araújo, presidente da legenda, para pregar a união do partido, mas ficou notório entre os tucanos que o grupo de Leite não estava satisfeito com a condução da votação.

Durante a semana que separou a votação, Leite relembrou uma denúncia de compra de votos por parte de Doria e chegou a sugerir a suspensão da votação para retomada só em fevereiro deste ano.