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Mendonça declara suspeição e não julgará ação contra dossiês antifascistas

17.dez.21 - Ministro André Mendonça no encerramento do ano do Judiciário, no STF - Rosinei Coutinho/STF
17.dez.21 - Ministro André Mendonça no encerramento do ano do Judiciário, no STF Imagem: Rosinei Coutinho/STF

Paulo Roberto Netto

Do UOL, em Brasília

06/05/2022 19h25Atualizada em 06/05/2022 19h30

O ministro André Mendonça, do STF (Supremo Tribunal Federal), declarou suspeição e não participará do julgamento que discute a legalidade dos dossiês elaborados pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) contra professores e servidores identificados com o movimento antifascista. A existência dos documentos foi revelada pelo UOL em 2020.

O julgamento é realizado no plenário virtual da Corte até a próxima sexta (13). A ministra Cármen Lúcia proferiu o primeiro voto contra os dossiês, afirmando que atividades de inteligência não podem ser usadas para perseguição política.

Em agosto de 2020, o Supremo suspendeu por 9 votos a 1 a elaboração dos documentos por considerar que houve desvio de finalidade.

Reportagem do UOL publicada em julho de 2020 revelou que o Ministério da Justiça e Segurança Pública produziu um dossiê com nomes e endereços de redes sociais de professores e servidores públicos que se identificavam como "antifascistas". Em alguns casos, foram feitas até fotografias dessas pessoas.

Mendonça era o ministro da Justiça e Segurança Pública à época da revelação da existência dos dossiês. A atividade era conduzida pela Seopi (Secretaria de Operações Integradas), na ocasião subordinada ao ministro.

A Rede Sustentabilidade entrou com ação no STF contra os dossiês e acusou o governo Bolsonaro de promover um "aparelhamento estatal" para realizar "perseguições políticas e ideológicas".

Ao todo, um grupo de 579 professores universitários e servidores teriam sido incluídos no dossiê.

No julgamento iniciado hoje, Cármen Lúcia se manifestou contra a produção dos dossiês. Em voto, a ministra afirma que não houve "contestação objetiva ou direta" do Ministério da Justiça em relação às notícias de elaboração dos documentos.

As atividades de inteligência, portanto, devem respeitar o regime democrático, no qual não se admite a perseguição de opositores e aparelhamento político do Estado. Aliás, o histórico de abusos relatados quanto ao serviço de inteligência acentua a imperiosidade do efetivo controle dessa atividade"
Cármen Lúcia, ministra do STF

A ministra afirmou que é preciso assegurar a "liberdade de manifestação política" para garantir o regime democrático. "É no debate político que a cidadania é exercida com o vigor de sua essência", disse.

O julgamento pode ser suspenso caso algum ministro peça vista (mais tempo de análise) ou destaque, manobra que leva a discussão para as sessões presenciais do Supremo.

Ministros viram desvio de finalidade

Na sessão que suspendeu a produção dos dossiês em 2020, ministros do Supremo afirmaram que a atividade caracteriza "desvio de finalidade". Apenas o ministro Marco Aurélio Mello na divergência.

"A mera possibilidade de existência do dossiê é risco ao qual nunca mais pretendemos nos submeter, acompanhando integralmente a relatora para deferir o pedido de imediata suspensão da produção e disseminação de conhecimentos e informações de inteligência estatal produzidos sobre integrantes do movimento antifascismo e professores universitários citados, por seu evidente desvio de finalidade", afirmou o ministro Edson Fachin.

O ministro Luís Roberto Barroso comparou a produção do dossiê à atuação dos órgãos de inteligência da ditadura militar (1964-1985). Para o ministro, levantamentos dessa natureza só se justificam se houvesse elementos sólidos para supor que o grupo tramava contra o Estado ou as instituições, o que não era o caso.

"O passado do Brasil condena em matéria de utilização indevida dos órgãos de segurança. Esse tipo de monitoramento para saber o que fazem eventuais adversários é completamente incompatível com a democracia", disse Barroso.