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CPI da Covid: PGR pede que STF arquive apurações abertas contra Bolsonaro

26.mai.2021 - O presidente Jair Bolsonaro ao lado do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, durante evento no Planalto  - Myke Sena/Ministério da Saúde
26.mai.2021 - O presidente Jair Bolsonaro ao lado do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, durante evento no Planalto Imagem: Myke Sena/Ministério da Saúde

Paulo Roberto Netto e Weudson Ribeiro

do UOL, em Brasília

25/07/2022 16h40

A PGR (Procuradoria-Geral da República) pediu o arquivamento de cinco das sete apurações instauradas no Supremo Tribunal Federal contra o presidente Jair Bolsonaro (PL) a partir do relatório final da CPI da Covid. Os procedimentos apuravam supostos crimes de epidemia, prevaricação, infração de medida sanitária, charlatanismo e emprego irregular de verba pública.

As manifestações foram assinadas pela vice-procuradora-geral Lindôra Araújo. Em um caso, que apura suposta prática de incitação ao crime, a PGR prorrogou o procedimento por mais 90 dias. Este se torna agora o último caso contra o presidente derivado da CPI ainda aberto na PGR.

A PGR também pediu o arquivamento de procedimentos contra: Marcelo Queiroga (ministro da Saúde), Wagner Rosário (ministro da Controladoria-Geral da União), general Walter Braga Netto (ex-ministro da Casa Civil), Eduardo Pazuello (ex-ministro da Saúde), Antônio Élcio Franco Filho (ex-secretário executivo da Saúde), Heitor Freire de Abreu (ex-subchefe de Monitoramento da Casa Civil), Hélio Angotti Netto (secretário de Ciência e Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos em Saúde do Ministério da Saúde) e Osmar Terra (deputado federal).

Os casos envolvendo Pazuello, Queiroga e Rosário dizem respeito a suposta prevaricação no caso Covaxin. Um procedimento envolvendo o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), foi enviado à primeira instância após a PGR considerar que não há indícios de envolvimento do parlamentar no caso. Ele foi indicado por formação de organização criminosa.

Crime de epidemia

Nas cinco apurações sobre Bolsonaro, a PGR indica que houve "atipicidade" de conduta, ou seja, os fatos narrados envolvendo o presidente não configurariam o crime pelo qual foi indiciado. Um exemplo é o caso do crime de epidemia, fruto da insistência de Bolsonaro no chamado "tratamento precoce" e na omissão de sua gestão no combate à pandemia.

Segundo Lindôra, as provas apresentadas pela CPI "não foram capazes de confirmar a presença das elementares típicas do crime de epidemia" supostamente cometido por Bolsonaro. "Porquanto, ainda que se possa eventualmente discordar de medidas políticas e/ou sanitárias que tenham sido adotadas, nenhum deles propagou germes patogênicos", disse.

Em relação à insistência do tratamento precoce, à base de cloroquina e hidroxicloroquina, ambas sem eficácia contra covid-19, Lindôra apontou que a situação da pandemia na ocasião era de "absoluta incerteza a respeito da doença e de seu tratamento".

Vivia-se um instante sanitário crítico e decisões inevitavelmente precisaram ser tomadas, razão pela qual foi buscada uma alternativa com aquilo que estava disponível no momento. Assim, não se pode dizer que o agir dos gestores públicos tenha sido direcionado a causar uma epidemia - que, frise-se, já existia -, tampouco que tenham eles propagado qualquer agente patogênico"
Lindôra Araújo, vice-procuradora-geral da República

Charlatanismo

A defesa da cloroquina também fez Bolsonaro responder a uma apuração por suposto crime de charlatanismo. Ao arquivar o processo, Lindôra disse que para o crime ser atribuído a alguém, é preciso que ocorra dolo (intenção), o que não ocorreu na situação envolvendo o presidente.

Isso porque, segundo a PGR, o uso de cloroquina não foi defendida somente pelo presidente, pois foi alvo de "vastas pesquisas pela comunidade médica", e porque não há provas de que Bolsonaro tivesse conhecimento da ineficácia dos medicamentos.

"O Presidente da República Jair Messias Bolsonaro tanto confiava na eficácia dos referidos medicamentos que, quando testou positivo para a covid-19 em 7 de julho de 2020, ele próprio afirmou que fez uso da cloroquina no tratamento médico", apontou.

Uso de máscaras

Lindôra usou argumentos semelhantes ao arquivar o procedimento aberto contra Bolsonaro por infração de medida sanitária. Neste caso, o presidente foi indiciado por sucessivamente deixar de usar máscaras de proteção, mesmo o seu uso ser previsto por determinações oficiais.

Segundo a vice-procuradora, a conduta de Bolsonaro "reforça um padrão" que guarda "sintonia" com o seu agir político desde o início da pandemia. "O que indica não haver a autoridade requerida agido com a intenção de gerar risco não tolerado a terceiros", disse.

Pelo que se tem notícia, o Chefe do Executivo assim procedeu não por desconsiderar a gravidade da doença ou a crise sanitária, mas porque, na compreensão dele, estavam em jogo diversos outros fatores num cenário macro, como a economia do país. A discordância desse posicionamento, se merece alguma reprovação, deve ser dirimida no campo político, não no processo penal"
Lindôra Araújo, vice-procuradora-geral

Emprego irregular de verba

Na quarta manifestação enviada ao STF, Lindôra também pediu o arquivamento de um procedimento que apurava suposto emprego irregular de verba pública do governo na compra de medicamentos sem eficácia contra a covid. Assim como nas anteriores, a vice-procuradora não viu crime que justificasse a abertura de um inquérito.

Para Lindôra, as condutas atribuídas como crime se deram em um contexto de pandemia, em que havia urgência no combate à doença.

"Os dados demonstram o aumento das demandas pelos fármacos cloroquina e hidroxicloroquina durante o ano de 2020, em razão da epidemia, mas não permitem inferir desvios na aplicação das verbas em desacordo com a legislação vigente, já que foram utilizadas rubricas orçamentárias destinadas à aquisição de medicamentos no âmbito do Ministério da Saúde", disse Lindôra.

A vice-PGR afirmou ainda que, na época, a aquisição das medicamentos se basearam em estudos "até então existentes que apontavam a possibilidade de os medicamentos em apreço auxiliarem no tratamento" da covid-19.

Prevaricação

Na quinta e última apuração arquivada, que mirava suposta prevaricação de Bolsonaro no caso Covaxin, a PGR relembrou que um inquérito que mirava Bolsonaro por não acionar autoridades sobre supostas irregularidades na compra da vacina indiana foi arquivado em abril.

"À luz dessas circunstâncias, levando-se em consideração que o indiciamento do Presidente da República Jair Messias Bolsonaro pela CPI da Pandemia deu-se com referência aos mesmos fatos apurados no bojo do Inquérito 4.875/DF, os quais já foram investigados pela autoridade policial e examinados pelo órgão ministerial, há de ser arquivada esta petição em relação ao Chefe do Poder Executivo da União", escreveu a PGR.

Além de Bolsonaro, também responderam ao procedimento o ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, e o atual titular da pasta, Marcelo Queiroga, além do ex-secretário executivo do ministério, Antônio Elcio Franco Filho.

Relatório final da CPI da Covid acusava o grupo de prevaricação, crime cometido quando um servidor ou autoridade pública retarda ou deixa de praticar um ato de ofício que seria de sua responsabilidade para satisfazer interesse pessoal.

No caso, os senadores afirmam que, mesmo sabendo das supostas irregularidades na compra da vacina indiana Covaxin, o governo não acionou as autoridades competentes.

Em relação a Pazuello, a PGR informou que o mesmo procedimento apurava suposta prevaricação no colapso do sistema de saúde de Manaus (AM), em janeiro de 2021. Neste caso, a PGR diz que há um inquérito instaurado no Supremo, que corre sob sigilo, que continua a apurar o caso. "De modo que não há outras providências a serem adotadas a respeito nos presentes autos", disse.

Um procedimento que mirava o ministro da Controladoria-Geral da União, Wagner Rosário, também foi arquivado pela PGR. Segundo Lindôra, não há indícios de omissão de Rosário na apuração de irregularidades na contratação da Precisa Medicamentos, farmacêutica responsável pela venda da Covaxin.