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Bolsonaro erra ao dizer que metade de imóveis pagos em cash é de ex-cunhado

Colunista do UOL e do UOL, em Brasília

01/09/2022 13h48Atualizada em 01/09/2022 18h06

O presidente Jair Bolsonaro (PL) voltou a comentar a reportagem do UOL que revelou que, ao longo das últimas três décadas, a família do candidato à reeleição comprou ao menos 51 imóveis em dinheiro vivo. Em entrevista à Jovem Pan, o candidato à reeleição disse que metade desses bens é de um "ex-cunhado" com quem ele não tem relações. "O que tenho a ver com ex-cunhado?", indagou.

A entrevista foi gravada ontem e deve ser exibida pela emissora na próxima segunda-feira (5). Um trecho do material foi divulgado hoje durante o programa Morning Show.

Por que faz isso em cima da minha família? Metade dos imóveis é de ex-cunhado meu. O que tenho a ver com ex-cunhado? Não vejo esse cara há um tempão."
Jair Bolsonaro

O presidente ainda erra ao afirmar que metade dos 51 imóveis pagos integralmente ou parcialmente com dinheiro em espécie pertencem ao cunhado José Orestes Fonseca e sua irmã, Maria Denise Bolsonaro.

De acordo com o levantamento patrimonial realizado pelo UOL, somente oito dos 51 imóveis pagos em dinheiro foram comprados por este braço da família.

Maria Denise, irmã de Bolsonaro, e José Orestes se casaram em 1980, sob o regime de comunhão universal. Atualmente os dois vivem separados, mas ainda brigam pela divisão dos bens.

Até que a disputa se resolva, do ponto de vista legal, o patrimônio ainda pertence a ambos —incluindo bens que tenham sido adquiridos recentemente.

O patrimônio abrange quase uma dezena de lojas, uma casa de veraneio à beira-mar em Cananéia, no litoral sul paulista, com lancha e jet-ski, e duas mansões localizadas dentro de uma área de mais de 20 mil metros quadrados no centro de Cajati, no interior de São Paulo.

Qual o problema de pagar em dinheiro vivo? O uso de dinheiro em espécie para transações imobiliárias pode indicar operações de lavagem de dinheiro ou ocultação de patrimônio. O Senado discute um projeto de lei que sugere a proibição desse tipo de operação, mas o texto está travado há quase um ano, aguardando a designação de relator para que tramite na CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania).

Ao mencionar a reportagem, Bolsonaro se equivocou e atribuiu o levantamento à Folha de S.Paulo — na verdade, a apuração é de colunistas do UOL. O presidente reclamou ainda de o texto ter mencionado a mãe, dona Olinda Bonturi Bolsonaro, que morreu em janeiro deste ano.

"Busca uma maneira, 30 dias antes, um levantamento feito pela Folha, que não tem qualquer credibilidade, me acusar disso. Bota minha mãe, que já faleceu, nesse rol também. Vem para cima de mim, vem para cima de mim e ponto final."

"Uma maneira de desgastar, não vão conseguir desgastar. Eles querem eleger você sabe bem, né? Não vai ter sucesso", completou.

Metade em dinheiro vivo. O UOL apurou que, desde os anos 1990 até os dias atuais, o presidente, irmãos e filhos negociaram 107 imóveis, dos quais pelo menos 51 foram adquiridos total ou parcialmente com uso de dinheiro vivo, segundo declaração dos próprios integrantes do clã.

Levantamento em cartórios. As compras registradas nos cartórios com o modo de pagamento "em moeda corrente nacional", expressão padronizada para repasses em espécie, totalizaram R$ 13,5 milhões. Em valores corrigidos pelo IPCA, este montante equivale, nos dias atuais, a R$ 25,6 milhões.

Não é possível saber a forma de pagamento de 26 imóveis, que somaram pagamentos de R$ 986 mil (ou R$ 1,99 milhão em valores corrigidos) porque esta informação não consta nos documentos de compra e venda. Transações por meio de cheque ou transferência bancária envolveram 30 imóveis, totalizando R$ 13,4 milhões (ou R$ 17,9 milhões corrigidos pelo IPCA).

Além dos documentos oficiais, a reportagem consultou chefes de cartório e também vendedores dos imóveis mais caros vendidos à família.

25 negócios levaram a investigações. Ao menos 25 deles foram comprados em situações que suscitaram investigações do Ministério Público do Rio e do Distrito Federal. Neste grupo, estão aquisições e vendas feitas pelo núcleo do presidente, seus filhos e suas ex-mulheres não necessariamente com o uso de dinheiro vivo, mas que se tornaram objeto de apurações como, por exemplo, no caso das "rachadinhas" (apropriação ilegal de salários de funcionários de gabinetes).

Antes da publicação da reportagem, o UOL perguntou ao presidente Jair Bolsonaro, por meio de sua assessoria, qual a razão da preferência da família pelas transações em dinheiro, mas ele não se manifestou.

1.105 páginas de 270 documentos. O levantamento considera o patrimônio construído no Rio de Janeiro, em São Paulo e em Brasília pelo presidente, seus três filhos mais velhos, mãe, cinco irmãos e duas ex-mulheres.

Nos últimos sete meses, a reportagem consultou 1.105 páginas de 270 documentos requeridos a cartórios de imóveis e registros de escritura em 16 municípios, 14 deles no estado de São Paulo. Percorreu pessoalmente 12 cidades para checar endereços e a destinação dada aos imóveis, além de consultar processos judiciais.

Até a mãe de Bolsonaro, Olinda, falecida em janeiro deste ano, aos 94 anos, teve os dois únicos imóveis adquiridos em seu nome quitados em espécie, em 2008 e 2009, em Miracatu, no interior de São Paulo. Entre os imóveis comprados com dinheiro vivo pela família, estão lojas, terrenos e casas diversas.