Mundurukus reagem a estudo sobre mercúrio: 'A gente vai morrer de fome'
O caminho para Sawré Muybu, aldeia munduruku a uma hora de Itaituba (PA), é feito de lancha. A água do rio Tapajós é levemente esverdeada no início da travessia, mas, à medida que a lancha se aproxima da área de garimpo, vai ganhando uma coloração branca.
"É a lama do garimpo", diz a liderança Alessandra Munduruku.
Uma pesquisa da Fiocruz iniciada em 2019 analisou fios de cabelo de 200 indígenas de três aldeias mundurukus: Sawré Muybu, Poxo Muybu e Sawré Aboy.
Todos os testados apresentam algum grau de mercúrio no organismo. A substância é utilizada no garimpo ilegal.
"A gente vai morrer de fome"
A indígena Maria Leusa descobriu que seu leite materno está contaminado pelo mercúrio e tem prejudicado a saúde de seu filho.
Liderança respeitada, ela já sofreu ameaças de morte, teve a sua casa queimada por garimpeiros em Jacareacanga (PA) e chegou a ter uma arma apontada para sua cabeça.
Mercúrio no leite materno e pescado. Crianças de 10 anos de idade chegaram a registrar uma concentração muito alta, de 18,9 mcg/g de mercúrio. Isso acontece porque o mercúrio pode ser passado por mães lactantes aos bebês através da amamentação, e também pelo pescado, que é a base da nutrição munduruku.
A pesquisa também quantificou a concentração de mercúrio nas espécies de peixes consumidas pelo povo indígena. Piranha-preta, peixe-cachorro e mandubé apresentaram concentração perigosa do metal.
"A gente está morrendo sem perceber. O que a gente vai comer agora? O que as grávidas vão dar pros seus filhos se não for o leite ou peixe? A gente vai morrer de fome", diz a indígena.
O resultado do estudo, produzido a partir de um pedido dos próprios indígenas, foi apresentado à Aldeia Sawré Muybu em uma assembleia em setembro do ano passado.
Os valores de referência variam de 1 a 20 mcg/g, com a seguinte classificação:
- Baixo: de 1 a 2mcg/g;
- Aceitável: de 2 a 6 mcg/g;
- Alto: de 6 a 10 mcg/g e
- Muito alto: de 10 a 20 mcg/g.
Sintomas. Aldira Akai, 32, relata sentir dores de cabeça, no corpo e episódios de esquecimento. O laudo que recebeu indica 8,9 mcg de mercúrio por grama de cabelo. O número é considerado alto na tabela da Fiocruz.
A análise permite avaliar o nível de mercúrio absorvido pelo organismo nos 30 dias anteriores à coleta.
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