Assédio e ameaça: prefeito da Grande SP é alvo de 40 denúncias na Câmara
O prefeito de Mogi das Cruzes, Caio Cesar Machado da Cunha (Podemos), é alvo de ações na Justiça e de ao menos 40 denúncias na Câmara Municipal. Os servidores o acusam de assédio moral, perseguição e ameaça — um deles diz que foi ameçado de morte. A prefeitura nega.
O que aconteceu
O UOL ouviu quatro servidores que afirmam que existe uma perseguição contra pessoas que, na avaliação de Cunha e sua equipe, seriam ligadas ao governo anterior. Os servidores citam uma lista com nomes "malvistos", situações vexatórias, transferências que teriam o objetivo de "punir" os funcionários e até ameaça de morte.
Os vereadores formaram, em maio, uma comissão especial para ouvir os relatos de assédio moral. Os servidores já falaram de pressão e perseguição no ambiente de trabalho. A expectativa é que os trabalhos da comissão sejam encerrados em novembro.
A prefeitura refuta as acusações dos servidores e informou que não é de seu conhecimento que 40 denúncias de assédio moral tenham sido apresentadas à Câmara Municipal.
Cunha quebrou uma hegemonia de 20 anos do PSDB em Mogi das Cruzes. Desde 2001, os tucanos ocupavam os cargos de prefeito ou vice na cidade. Junji Abe governou de 2001 a 2008, José Pereira foi vice entre 2009 e 2016 e Marcus Melo foi prefeito entre 2017 e 2020. Já Cunha era vereador desde 2013.
Algumas pessoas têm até medo de conversar e uma das funcionárias chorou no depoimento ao comentar a perseguição.
Francimário Vieira (PL), vereador
Servidor relata ameaça de morte
Ameaçado de morte pelo prefeito, Rodrigo Bus se afastou com depressão. Ele trabalhava com finanças na Secretaria de Educação. Em fevereiro de 2021, após desentendimentos com a chefe Marilu Beranger (indicada por Cunha), Bus teve um encontro com o prefeito e afirmou que Cunha disse que o jogaria do alto da sede do órgão.
O servidor foi, então, deslocado para cuidar de um campo de futebol desativado, virou alvo de dois processos disciplinares e pediu licença por depressão. O caso foi parar na Justiça, que suspendeu a transferência de Bus sob multa diária de R$ 1.000 — mas a prefeitura ainda não cumpriu a decisão, de junho de 2021.
O prefeito deu outra versão da história a um programa de rádio. Em entrevista à Metropolitana FM de Mogi em 9 de maio de 2021, Cunha relatou que, antes de sua visita, Bus havia brincado com sua então chefe sobre jogá-la do alto da sede da secretaria.
Segundo Cunha, a situação o motivou a pedir o afastamento do servidor. O prefeito confirma que informou verbalmente a Bus sobre a transferência. Nessa conversa, o prefeito admite ter feito menção à brincadeira que o servidor teria feito com sua chefe. Bus nega que a conversa tenha se dado nesses termos.
Achei muito estranho ser abordado pelo prefeito e sofrer afastamento. Num caso como esse, o previsto seria a abertura de um procedimento administrativo e não um afastamento verbal, como aconteceu. Fui dispensado e não me indicaram nem para onde devia ir. O procedimento não foi correto desde o começo.
Rodrigo Bus
Agora, a prefeitura disse que a denúncia de Bus "não foi comprovada". Em nota, a administração municipal informou que o "processo administrativo seguirá até que os fatos sejam esclarecidos". No processo movido pelo funcionário, a prefeitura argumenta ainda que o servidor não estaria em depressão, já que seu tratamento está baseado apenas em remédios fitoterápicos.
Casal se diz vítima de retaliações
Berenice e Elias de Oliveira foram transferidos após denúncias ao Ministério Público. Ela trabalhava no atendimento ao público e, em maio de 2022, descobriu que três servidoras de sua seção haviam sido promovidas em segredo e tido seus salários triplicados — sem mudarem de função. Berenice denunciou a situação, junto com o marido Elias. Em outubro, foi transferida para Secretaria de Assistência Social sem maiores explicações.
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Quero receberElias de Oliveira trabalhava como guarda ambiental e foi transferido para um prédio desativado após a denúncia. Ele passou a trabalhar no Centro de Acolhimento — onde atuou como vigia e era o único obrigado a bater ponto no horário de almoço, em um relógio que ficava a dez minutos de caminhada.
"Não houve qualquer promoção ou salários triplicados", diz a prefeitura sobre a denúncia de Elias e Berenice. O município informou ainda que "a denúncia infundada foi arquivada pelo Ministério Público". O MP confirmou que o caso foi arquivado. Elias fez nova representação no mês passado.
Minhas três colegas que foram promovidas em segredo eram próximas dos chefes da minha seção, que tinham sido indicados pelo atual prefeito. No fim, desenvolvi até uma gastrite por conta de todo desgaste que vivi em função dessa situação.
Berenice de Oliveira
Quando fui transferido da Patrulha Ambiental, um abaixo-assinado com o nome de quase mil moradores foi organizado pedindo ao prefeito que revisse a decisão. Houve também uma mobilização por parte dos vereadores e do Conselho de Segurança Municipal. Eu não tinha noção de que era tão querido. Mesmo assim, nada surtiu efeito.
Elias de Oliveira, em entrevista ao UOL
'Lista vermelha' na secretaria
Outro servidor, Sergio Passos, foi transferido em 2021, à revelia, para o Centro Esportivo Parque da Cidade. Para Passos, a mudança ocorreu porque ele é visto como amigo de membros do governo anterior. Antes, ele cuidava da gestão de projetos na Secretaria de Esportes. Após reclamar da situação na internet, sofreu nova transferência e pediu afastamento por um ano devido a uma crise nervosa e depressão.
Realocado na secretaria, ele descobriu que havia uma relação de funcionários malvistos — que havia sido elaborada pelo então secretário de Cunha, Danilo Luque, para ser repassada a seu sucessor, Ewerton Komatsubara. O UOL teve acesso a essa lista, que tinha dez nomes. O servidor permanece afastado das funções até hoje e move ação de assédio moral contra a prefeitura. Ele pede indenização de R$ 50 mil pelos danos morais sofridos.
Minha carreira estava em ascensão e foi interrompida por um motivo fútil. Eu não tomei partido de nenhum dos lados durante as eleições de 2020. Criou-se um clima de guerra na prefeitura, no qual alguns funcionários de carreira passaram a ser vistos como inimigos, uma caça às bruxas mesmo. O meu sentimento era o de estar sendo caçado.
Sergio Passos
Ao assumir, Cunha exonerou 160 comissionados sem avisar os respectivos chefes. A troca de servidores é normal em mudanças de governo, mas o método não foi bem-visto na administração mogiana. Os demitidos recebiam ligações do departamento de Recursos Humanos e solicitação de saída imediata do local de trabalho.
Há cerca de 30 processos internos na prefeitura ligados a assédio moral. Represento seis funcionários da prefeitura na Justiça em casos ligados ao mesmo problema e sei de pelo menos sete servidores que foram vítimas de assédio e não procuraram a Justiça por medo de retaliação. Um deles não consegue mais sequer se aproximar da sede da administração municipal.
Advogado Marcos Soares, advogado
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