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Pacientes com sequelas da covid-19 lotam UTI de hospital em Manaus

Familiares choram ao receber notícia que parente internado morreu de coronavírus no Hospital Delphina Aziz. Cena aconteceu ainda em maio, nos primeiros meses da pandemia - EDMAR BARROS/ESTADÃO CONTEÚDO
Familiares choram ao receber notícia que parente internado morreu de coronavírus no Hospital Delphina Aziz. Cena aconteceu ainda em maio, nos primeiros meses da pandemia Imagem: EDMAR BARROS/ESTADÃO CONTEÚDO

Bruno Tadeu, especial para o Estadão, e Ludimila Honorato

Manaus e São Paulo

29/10/2020 13h18

Referência no tratamento contra a covid-19 em Manaus, o Hospital Delphina Aziz tinha 96% de ocupação dos leitos de UTI na última segunda-feira (26). Das 90 vagas, aproximadamente 60% estão ocupadas por pacientes que não têm mais a doença, mas continuam em recuperação das sequelas deixadas pela doença, como dificuldades de respirar e problemas renais. No Amazonas, houve restrição à circulação de acompanhantes e visitantes em hospitais e unidades de saúde para evitar o avanço da transmissão.

"É um paciente que teve seu quadro de diabete agravado, é um paciente que teve a questão renal comprometida... Tem paciente que está há mais de quatro meses lá no Hospital Delphina Aziz, e precisa de um leito de UTI", disse o governador Wilson Lima (PSC) esta semana. O Amazonas foi um dos Estados mais atingidos pela pandemia, com quase 4.480 mortes.

Conforme a Secretaria da Saúde, a reabilitação é feita com acompanhamento de equipe multidisciplinar, de Enfermagem, Fonoaudiologia, Nutrição e Psicologia. O fluxo de acesso ao ambulatório ocorre com entradas de pacientes que estavam internados no próprio hospital e vindos de outras unidades. Nos hospitais de referência para a covid do estado, visitas foram suspensas. O mesmo vale para unidades em que não há separação do fluxo para outros doentes e acompanhantes.

O coordenador de fisioterapia do Delphina Aziz, Érick Paiva, explica que o perfil que precisa desse atendimento é um paciente que ficou enfraquecido, em decorrência da doença e do longo período de internação. A faixa etária mais comum é entre 45 e 60 anos.

"São pacientes que, por causa da covid-19, tiveram internação prolongada, e em decorrência disso tiveram um declínio funcional muito grande, perderam capacidade de independência. Então, nossa proposta é reabilitá-los em cima dessas funcionalidades", afirmou.

Ele explica, ainda, que a maioria dos pacientes até consegue se manter respirando normalmente, em repouso. Quando é exigida demanda metabólica um pouco maior, como caminhar, escovar o dente em pé e tomar banho, os pacientes começam a apresentar desconforto, cansaço, tendo de interromper a atividade para recuperar o fôlego - e é em cima desses pontos que o profissional atua.

Aos 69 anos, a funcionária pública afastada Terezinha Roberta Matias lida diariamente com o tratamento de uma fibrose pulmonar. O filho Celio Matias, de 36, preferiu evitar a internação hospitalar da mãe e optou pelo tratamento em casa.

"Pagamos um aparelho chamado concentrador de oxigênio para ela. Tem dias que dá crise de falta de ar. Às vezes, o paladar ainda tem falhas, mas também tem dias que ela está bem", disse ele.

Para o infectologista Bernardino Albuquerque, da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), o aumento de casos de sequelas da covid - cardíacas, pulmonares e renais, entre outras - é motivo de alerta. É importante, defende o médico, uma estratégia de "criar locais onde se possa acompanhar esses pacientes, não somente de forma hospitalar, mas ambulatorial, para que se tenha um êxito maior".

Internações

Conforme o governo, até anteontem 77% dos leitos de UTI e 70% dos leitos clínicos estavam ocupados. O estado evita considerar uma segunda onda de infecções no Amazonas, como na Europa, mas prorrogou o fechamento de bares e balneários por mais 30 dias.

Henrique Pereira, especialista da Ufam, diz que houve uma "explosão" de internações em Manaus nas duas últimas semanas. "O número de internações diárias em Manaus, em outubro, apresenta valores duas a três vezes maiores do que em julho, agosto e setembro."

Segundo ele, média móvel de sete dias ficava próxima a 15, até o mês passado, mas agora está em torno de 30. Ele diz que não houve aumento na mesma proporção de óbitos, mas isso é esperado em duas semanas.

Para Albuquerque, apesar da alta, não é segunda onda. Mas, diante da flexibilização do isolamento, ele sugere cautela. "Temos de nos preparar para que o segundo momento não aconteça como o primeiro."