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Atendimento básico tem baixa demanda e profissionais com falta de proteção

Na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Pedreira, na zona sul de São Paulo, poucas pessoas aguardavam na recepção - Cleber Souza/UOL
Na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Pedreira, na zona sul de São Paulo, poucas pessoas aguardavam na recepção Imagem: Cleber Souza/UOL

Flávio Costa, Cleber Souza e Talyta Vespa

Do UOL, em São Paulo

21/03/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Reportagem do UOL visita sete unidades de atendimento básico em São Paulo e constata que o movimento de pacientes não atingiu níveis alarmantes
  • Profissionais de saúde demonstram preocupação em relação à quantidade de equipamentos de proteção para evitar a contaminação pelo novo coronavírus
  • De acordo com um médico, em alguns locais não há triagem entre os pacientes, e pessoas com quadro gripal ficam na recepção, ao lado das demais
  • A Secretaria Municipal da Saúde afirmou que "o atendimento prioritário para crises respiratórias é necessário e padrão em todas as unidades"

Embora unidades de atendimento básico em São Paulo visitadas pela reportagem do UOL apresentem baixa demanda de pacientes, profissionais de saúde demonstram preocupação em relação à quantidade de equipamentos de proteção para evitar a contaminação pelo novo coronavírus.

Um médico que trabalha em três unidades públicas de saúde — Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) de Mauá e Santo André, na região metropolitana, e no pronto-socorro de Santana, zona norte — revelou um quadro preocupante nos bastidores do atendimento. "Falta EPI (Equipamento de Proteção Individual) para a equipe médica, falta máscara, falta tudo. Não tem local adequado para fazer a coleta", afirma ele, que pediu para seu nome não ser publicado.

"No Pronto-Socorro de Santana, a mesma sala que era utilizada para atendimento médico também é utilizada para fazer a coleta [de amostras para exame]. Agora eles reservaram uma enfermaria exclusiva para casos de Covid-19, a doença provocada pelo coronavírus."

De acordo com o médico, em alguns locais não há triagem entre os pacientes, e pessoas com quadro gripal ficam na recepção, ao lado das demais.

A Secretaria Municipal da Saúde da Prefeitura de São Paulo afirmou ao UOL que "o atendimento prioritário para crises respiratórias é necessário e padrão em todas as unidades. Tudo depende de uma adaptação, claro, então estamos nos organizando para isso".

Em sete locais visitados pela reportagem, o movimento de pacientes não indicou níveis alarmantes.

Clima aparentemente tranquilo na Lapa

As filas que, normalmente, se estendem até o estacionamento do Pronto-Socorro Municipal da Lapa estavam vazias ontem.

Em frente à recepção, onde se aglomeram diariamente pacientes de toda a zona oeste de São Paulo, a reportagem encontrou mais da metade das cadeiras desocupadas.

Entre os poucos pacientes que aguardavam atendimento, o assunto "coronavírus" era unânime. E, entre os funcionários, a informação que circula é que o pouco movimento é reflexo do pânico das pessoas a respeito da covid-19, doença causada pelo vírus.

Abordada pela reportagem, uma enfermeira do pronto socorro da Lapa que, em pé e de máscara, recepciona os pacientes que chegam, afirma que o movimento caiu consideravelmente na última semana.

O UOL conversou com um dos funcionários do hospital, que preferiu não se identificar por medo de retaliação. Ele conta que apenas médicos e alguns recepcionistas receberam máscara para proteção.

Há profissionais de outras áreas, como, por exemplo, os que atuam na rouparia da unidade, que tiveram a proteção negada.

"Um colega pediu máscara à administração do hospital, já que ele cuida das roupas utilizadas pelos pacientes. Como resposta, ouviu que apenas médicos — que têm contato direto com pessoas doentes — é que vão receber o acessório."

Procurada pela reportagem, a Secretaria Municipal da Saúde da Prefeitura de São Paulo informou que apuraria o caso, mas não se manifestou até o momento da publicação deste texto.

No Rio Pequeno, mães com seus bebês

Assim que chegou à UBS de Rio Pequeno, na extrema zona oeste da cidade, a reportagem do UOL se deparou com um estacionamento vazio. À frente da porta de pronto atendimento, poucas mães com crianças aguardam atendimento.

"Os meses de março e abril são os que mais lotam esse hospital. Só que nessa semana, por aqui, o movimento quase não existe. No pronto-socorro, ele também está menor, só que ainda tem gente vindo. Principalmente, mães com crianças", diz uma funcionária que preferiu não se identificar.

No pronto-socorro do Hospital Infantil Menino Jesus, no centro da capital paulista, a fila de espera estava pequena, comparada aos meses de março e abril, segundo uma funcionária do hospital. "Na parte do atendimento especializado, não tem quase ninguém", ela diz.

A funcionária, que usava máscara, explicou que a direção do hospital deu aos funcionários administrativos a opção de vestir ou não o acessório. "Como minha avó já é idosa e eu falo diretamente com o público, preferi usar".

Padrão varia na região metropolitana

O médico que atua em três unidades de saúde ressalta que, enquanto em alguns locais não há superlotação, em outros existem falhas.

"Tem determinações diferentes por diferentes secretarias municipais. Cada lugar tem um protocolo. Em Santo André tem um protocolo muito bem firmado para tudo. Eles firmaram uma série de medidas, lá é tudo muito organizado. Enquanto isso em Mauá, por exemplo, não tem nada. Não tem nada de proteção para a equipe médica. Nós temos que levar nossa proteção", afirmou.

O profissional de saúde ainda relata ter visto episódios de falta de preparo. "A gente teve um caso essa semana de uma paciente que teve contato direto com um caso confirmado [de coronavírus] e foi classificada como 'quem pode ficar até quatro horas à espera de atendimento'. E essa paciente ficou um total de sete horas junto a outros esperando atendimento, quando na verdade deveria ter sido colocada imediatamente em uma sala isolada."

O UOL entrou em contato por e-mail e telefone com a Prefeitura de Mauá, para que comentasse as críticas do médico entrevistado, mas não houve resposta até a publicação deste texto.

Tosse na fila de espera

De todas as unidades visitadas pelo UOL, a UPA da Barra Funda era a mais lotada. Ainda assim, segundo uma funcionária, muito menos cheia do que em dias comuns.

Entre os pacientes que esperavam atendimento, havia muitos que tossiam intensamente. Para os funcionários, não parecia fazer muita diferença: todos respeitavam a ordem das senhas, independentemente dos sintomas.

Por telefone, ao UOL, a assessoria de imprensa da Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo afirmou que há mais de 4 mil funcionários preparados para identificar os primeiros sintomas de coronavírus e prestar atendimento necessário aos pacientes.

Na zona sul de SP, UPAs vazias e organizadas

UPA de Santo Amaro, - Cleber Souza/UOL - Cleber Souza/UOL
Na UPA de Santo Amaro, pacientes aguardam o atendimento, alguns deles usam máscaras
Imagem: Cleber Souza/UOL

As UPAs da zona sul da capital paulista estavam vazias durante a visita da reportagem do UOL ontem. Pacientes com sintomas de gripe eram rapidamente atendidos.

Na UPA de Santo Amaro, funcionários da unidade usavam máscaras e roupas como forma de proteção. Logo na entrada, duas enfermeiras abordavam os pacientes que entravam e logo questionavam: "Está com sintomas de gripe?".

Se a resposta fosse positiva, esse paciente recebia atendimento prioritário, podendo ser encaminhado a um hospital referência da região.
Máscaras e roupas higienizadas eram fornecidas para quem demonstrasse sintomas de alguma síndrome respiratória.

"Em 30 minutos que ficamos aqui na porta, já apareceram cinco pessoas com sintomas de gripe. Estamos seguindo todo o protocolo de atendimento e, até o momento, temos material necessário para esse trabalho", disse uma funcionária que também não quis se identificar.

Aguardando a filha do lado de fora

Já na UPA Pedreira, também na zona sul, o vazio também é logo visto ao entrar na unidade. O tempo de espera foi de 40 minutos para atendimento. A única fila vista pela reportagem no local foi a da retirada de remédios na farmácia. Cerca de 15 pessoas estavam nela.

A reportagem esteve na UPA Campo Limpo, localizada no extremo sul de São Paulo, e presenciou um enfermeiro na porta da unidade executando o primeiro atendimento, com os seguintes questionamentos aos pacientes: "Quais os sintomas do(a) paciente?", "ele(a) chegou de viagem?", "tem ou teve febre por esses dias?".

Uma paciente, que não quis se identificar, estava aguardando sua filha. Segundo ela, acompanhantes estão sendo obrigados a aguardar do lado de fora para evitar aglomerações.

"Eles [funcionários da UPA] disseram que é precaução. Estou aqui há uns 30 minutos, e minha filha está lá dentro com máscara. Deram álcool em gel para ela. Está muito tranquilo. Ainda bem que as pessoas entenderam que não precisam ir até o hospital por qualquer coisa. Imagina agora, com todo esse perigo do vírus."