Collor: Divergência entre Bolsonaro e Mandetta reduz adesão a isolamento
O ex-presidente da República e atual senador Fernando Collor de Mello (PROS-AL) disse hoje, em entrevista ao jornalista e colunista do UOL Josias de Souza, que a divergência entre o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta reduziu a adesão ao isolamento social como forma de combate à disseminação do novo coronavírus.
"A divergência entre o ministro da Saúde e o presidente causou confusão na cabeça das pessoas. E está fazendo, não tenho a menor dúvida, com que esses índices do isolamento social venham caindo ao longo do tempo, contradizendo todas as recomendações médicas. Mas por que isso? Porque algumas pessoas disseram que iriam seguir o presidente porque ele é o presidente", afirmou.
"O presidente, da mesma forma que disse que não entendia de economia, disse que não entendia de saúde, de educação. Então, se ele disse que não entendia de saúde e educação, deu carta branca para esses ministros. Ele chega e nos deixa durante 30 dias com um ministro que falava da necessidade de distanciamento social, porque contra esse vírus não temos vacina, remédio. A única coisa que temos de plausível é o distanciamento e isolamento social. Então, ele quebra a palavra do ministro, que estava amparado pelas recomendações da OMS, e faz exatamente o contrário. O ministro falando para não ir para aglomerações e ele participando de aglomerações", diz.
E continua: "Quando os ministros fazem uma coisa diferente do que o presidente está fazendo, [significa que] está faltando liderança, o exercício da liderança para que cheguem a um entendimento".
Mandetta acabou substituído por Nelson Teich no comando da pasta em meio à pandemia. Bolsonaro defende o isolamento vertical, restrito apenas a idosos e grupos de risco, enquanto o ex-ministro era favorável ao isolamento social.
Tal postura tem gerado confrontos também com governadores, principalmente os de São Paulo (João Doria) e Rio de Janeiro (Wilson Witzel). Para Collor, este embate também é prejudicial ao país.
"O presidente não pode se indispor com os governadores. Como briga contra governadores? Não são governadores de estados pequenos, já ofendeu o governador da Paraíba, de São Paulo, do Rio de Janeiro, de vários estados. Como pode um presidente de uma República federativa tratar os chefes dos entes federados como ele trata?", questionou Collor.
Witzel segue se recuperando da covid-19 e Doria já foi chamado de leviano pelo presidente. De acordo com balanço divulgado ontem pelo Ministério da Saúde, o Brasil já registrou 4.543 mortes e 66.501 casos oficiais.
Aproximação tardia com Centrão
Ainda durante a entrevista, o senador afirmou que é "equivocado" o movimento de aproximação do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) com o Centrão. "É tardio (movimento com Centrão). Demorou demais e agora de afogadilho iniciar esse tipo de contato. Não são tão agradáveis essas investidas que o presidente está fazendo. Está fazendo de um modo equivocado, presidente da Câmara não está participando", disse.
Bolsonaro vem se aproximando do Centrão para ter uma base maior em votações na Câmara. Uma das medidas vem sendo as reuniões com líderes dos partidos para discutir nomes para o segundo escalão do governo.
Collor critica, ainda, "desencontros" na atual gestão. "Veja quantos conflitos [estão existindo] com essa questão das fake news, investigações levadas a efeitos dentro do STF. Veja quantos problemas nós estamos vivenciando e todos esses problemas se locomovem na direção do autor e do foco, o executivo, e autores são pessoas muito próximas do presidente, são filhos do presidente. O presidente da República tem o núcleo duro das decisões dele, é formado por ele e pelos filhos dele", diz.
Impeachment à vista
É, entre outras causas, por causa desse comportamento, analisa o senador, que, segundo ele, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) caminha para um processo de impeachment. De acordo com o ex-presidente, que foi alvo de uma ação semelhante em 1992 e renunciou ao cargo antes da conclusão, a abertura do inquérito contra Bolsonaro é o primeiro passo para o processo. Ontem, o ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou a abertura de investigação para apurar as denúncias feitas por Sergio Moro, ex-ministro da Justiça e Segurança Pública.
"Quando digo [que o impeachment] é imprevisível, me refiro à maneira pela qual ele terá o desenlace", diz. "Pelo que já vivi isso são favas contadas. Se houver manifestação do Supremo (Tribunal Federal) indo para o Congresso, será autorizado esse processo imediatamente", analisou Collor.
De acordo com o senador, ainda há dependência do oferecimento de denúncia, mas se isso ocorrer o quadro político deve encaminhar a ação para o impeachment. "É imprevisível se vai ser de um lado ou do outro; mas que é um desenlace anunciado, é", disse Collor. De acordo com Collor, o presidente retomou a prática do "toma lá dá cá", que Bolsonaro criticou durante sua campanha presidencial no ano passado.
"Sofri o que sofri, o meu impedimento, e tomei uma lição. Governo que não tem maioria no Congresso Nacional, no sistema presidencialista, não consegue terminar o seu mandato", disse. "Esse filme que eu já vi. Essa falta de entendimento com o Congresso, já vi no que isso resultou. E não gostei do que vi, não tenho nenhum gosto que aconteça novamente". Mesmo assim, na avaliação do senador, Bolsonaro "tem que ajudar" a melhorar a situação, afirma.
Mesmo assim, na avaliação do senador, Bolsonaro "tem que ajudar" a melhorar a situação. "O presidente cria conflitos do nada", disse.
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