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Erros cometidos pelo Brasil na pandemia são históricos, diz Nicolelis

Do UOL, em São Paulo*

05/06/2020 11h44Atualizada em 05/06/2020 21h14

O médico e neurocientista Miguel Nicolelis disse que a quantidade de erros que o Brasil cometeu no combate à pandemia do novo coronavírus vai "entrar para a história" e que os números de casos e óbitos registrados, apesar da subnotificação, já demonstram que o país vive a maior tragédia de sua história.

"A quantidade de erros é um caso histórico. Vai entrar para a história, vai haver uma descrição do grande fracasso do governo federal em lidar com a maior crise sanitária. Ouso dizer que esse evento vai entrar como a maior guerra da história do Brasil porque é uma guerra biológica e as pessoas não se deram conta", afirmou hoje em entrevista ao colunista do UOL Leonardo Sakamoto e ao jornalista Carlos Madeiro.

Estou falando, a gente vai contar essa história daqui a 50 anos e os erros crassos vão ser tão claros que as pessoas vão ler o livro e dizer 'eu não acredito nisso aqui'

Nicolelis é coordenador da Comissão Científica do Consórcio Nordeste, responsável pelo projeto Monitora Covid-19, aplicativo que orienta e informa a população sobre a doença em tempo real.

Para ele, não houve qualquer reação ou planejamento do governo federal e faltou uma mensagem coerente e unificada que mostrasse a importância do isolamento social, considerado pela comunidade científica como o método mais eficaz no combate à pandemia.

"Não há sistema hospitalar no mundo que dê conta da capacidade de reprodução desse vírus. Então, como não levamos a sério desde janeiro, não ajudamos estados e municípios do ponto de vista de um governo unificado, não criamos testagem eficiente em todo Brasil, não criamos equipamentos necessário e não tiramos vantagem do sistema de saúde, dos agentes de saúde que deveriam ser a primeira linha de defesa", afirmou.

Segundo ele, os números de mortos continuarão subindo e "vamos bater vários recordes diários". Apesar da afirmação, Nicolelis evita fazer projeções para o país.

"As previsões têm que ser muito cuidadosas porque, à medida que você avança no futuro, o erro aumenta", diz. O médico faz uma comparação com a previsão do tempo, que é mais fácil de ser feita para dias próximos, mas mais complicada quando se trata de semanas.

"Tem que tomar cuidado. Por isso que a gente não divulga como política a previsão de número de óbitos, por exemplo, para um futuro muito longo, porque pode causar uma situação de pânico. Todavia, é evidente que a curva brasileira está explodindo. Isso é unanimidade no mundo todo".

'Ajuda de R$ 600 é gota no oceano'

O médico classificou o auxílio emergencial de R$ 600 para ajudar os trabalhadores durante a crise gerada pela pandemia do coronavírus como uma "gota no oceano" e avaliou que o governo federal "enrolou e não fez nada".

Ele lembrou que nos Estados Unidos a ajuda foi de US$ 1.200 (cerca de R$ 5,9 mil) e disse que o Brasil deveria ter se preocupado com os parâmetros macroeconômicos depois da pandemia.

"É óbvio que para as pessoas ficarem em casa elas precisam sobreviver, poder comer, pagar contas (...) Você tem que dar condições mínimas para as pessoas ficarem em casa e isso é papel do governo federal", declarou

O governo federal do Brasil enrolou e não fez nada. A ajuda de R$ 600 é uma gota no oceano

Imagem do Brasil no exterior

Questionado sobre a imagem do Brasil no exterior, Nicolelis que é professor catedrático da faculdade de medicina da Universidade Duke, na Carolina do Norte (EUA), disse que a reputação dos cientistas do país é "excelente" e eles são considerados de "altíssimo nível internacional em todo o lugar do mundo".

Ele classificou a atual imagem do país no geral, no entanto, como "a pior que já vi na minha existência".

Tenho 59 anos. Viajo pelo mundo há 30 sem parar. Nunca vi o Brasil descer a patamares tão baixos de crítica, censura. Os maiores jornais do mundo definiram o presidente do Brasil como inimigo número 1 da pandemia no mundo

*Texto de Beatriz Sanz, Nathan Lopes e Stella Borges. Produção de Diego Henrique de Carvalho.