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PA: Médicos de combate à covid-19 podem deixar UTIs por falta de pagamentos

Parte dos médicos que atuam no hospital de campanha Hangar, no Pará, estão sem receber salários - Agência Pará Divulgação
Parte dos médicos que atuam no hospital de campanha Hangar, no Pará, estão sem receber salários Imagem: Agência Pará Divulgação

Abinoan Santiago

Colaboração para o UOL, em Ponta Grossa

26/06/2020 19h06Atualizada em 29/06/2020 13h55

Médicos da linha de frente de combate ao novo coronavírus que atuam nos dois hospitais de campanha de Belém - Hangar e Abelardo Santos - estipularam como prazo limite o dia 30 de junho para receberem o salário pelos plantões atrasados. Eles ameaçam deixar os postos de trabalho a partir do dia seguinte se o pagamento continuar pendente. Segundo o Sindicato de Médicos do Pará, o atraso chega a até dois meses de salários. Já a entidade responsável pelo pagamento alega que deve apenas um mês.

A decisão de deixar o atendimento em caso o pagamento não seja realizado foi tomada ontem em assembleia virtual da categoria. O Sindmepa contabiliza 15 médicos que atuam no Hospital de Campanha Hangar sem receber desde abril. Outros 19, do Abelardo Santos, não receberam pelos serviços de maio. Eles são contratados pela Organização Social de Saúde (OSS) Santa Casa da Misericórdia Pacaembu.

Os médicos que ameaçam parar atendem Unidades de Terapia Intensivas (UTIs) e casos de emergência, diz o Sindmepa. Dados do governo local apontam que o Hospital Hangar tem hoje 235 pacientes internados com covid-19, sendo 63 deles em UTIs.

O contrato da entidade com o governo do Pará é de R$ 58,8 milhões. Desde a assinatura, em abril, o UOL verificou no Portal da Transparência que já foram pagos R$ 45.345.045 pela Secretaria de Saúde Pública. O último pagamento ocorreu em 22 de junho, no valor de R$ 6 milhões.

"Os médicos deram um prazo para resolverem o problema do pagamento. Isso vai até a próxima terça-feira à noite. São dois meses trabalhando em plena pandemia e alguns até adoeceram e não receberam. Como os médicos têm dois meses sem receber e precisam sustentar suas famílias, vão procurar outro lugar. Simplesmente não vão mais (trabalhar). Não tem nem contrato assinado, então não seria abandono", confirmou o diretor do Sindmepa, Wilton Cardoso.

O problema mobilizou o Ministério Público do Trabalho (MPT), que autuou hoje notícia de fato sobre o caso e acionará as partes envolvidas para uma audiência na próxima segunda-feira (29), apurou o UOL. A intenção é chegar a um acordo para que os atendimentos aos pacientes com o novo coronavírus não sejam interrompidos. O Pará conta com 96.472 casos confirmados e 4.803 óbitos em decorrência da covid-19.

Cubanos também não receberam

Contratados no fim de abril, os 86 médicos cubanos que atuam no combate à covid-19 no Pará também aguardam o pagamento.

A decisão do governo estadual de utilizar a mão de obra cubana foi tomada após parecer favorável dado pela Procuradoria-Geral do Estado, que traçou orientações técnicas para as contratações.

No caso dos profissionais estrangeiros, o Sindmepa afirma que não os representa porque eles ainda não possuem o Revalida, exame que reconhece o diploma de medicina obtido em outro país.

A reportagem, contudo, conversou com dois cubanos - que preferiram não se identificar para evitar "retaliações". Eles confirmaram que o pagamento de maio está atrasado. Os profissionais elaboraram uma carta, com a data de hoje, para entregá-la ao governador Helder Barbalho (MDB) para cobrar respostas sobre os salários.

"Fomos convocados pelo governo do Pará, e sem duvidar, deixamos para trás famílias, filhos e empregos, pois a nossa missão vai muito além de salvar vidas, levar conforto e saúde para o povo. (...) Muitos de nós adoeceram pela covid-19 e, ainda assim, estamos dispostos a ficar na linha de frente, expostos pela convivência em comum", afirmam os cubanos em carta, obtida pelo UOL.

"Fazemos um pedido para o senhor [governador], de interceder sobre a nossa situação, que é angustiante a espera, sem informações e sem resultado concretos", complementam os cubanos, que não mencionam eventuais paralisações dos serviços.

OSS alega 'problema administrativo'

A OSS Santa Casa da Misericórdia Pacaembu admitiu o atraso nos pagamentos, mas negou que são dois meses. A entidade diz que resta quitar apenas o mês de maio maio. Cada médico recebe R$ 1.800 por plantão de 12 horas trabalhadas.

"O que está atrasado são os plantões médicos de maio, que deveriam ser pagos até 12 de junho. Então são 14 dias de atraso", garantiu o administrador da OSS, Alex Marques Cruz.

A organização alega que atrasou os pagamentos por "problemas administrativos" após 30% dos funcionários que cuidam do trâmite interno adoecerem com covid-19. Questionada sobre os R$ 45 milhões já recebidos desde o início do contrato, a entidade confirma que a causa não é financeira.

"Aproximadamente 30% da área administrativa adquiriu a covid-19, inclusive, com funcionário indo a óbito. Isso deu um desfalque. São pessoas que ajudam nas planilhas de escalas e pagamento. Não conseguimos fechá-las para administrativamente pagar", afirmou Cruz, explicando que os médicos cubanos não receberam seus respectivos pagamentos pela mesma situação.

Sobre o prazo até 30 de junho dado pelos médicos brasileiros com salários atrasados, a OSS afirma que não poderá cumpri-lo. A previsão é resolver a pendência em 3 de julho.

"Eles param e vamos substituí-los. Não haverá desassistência alguma. Todos serão pagos porque é um direito", concluiu Cruz.

Secretária pede solução "com urgência"

Em nota, a Secretaria de Saúde do Pará (Sespa) afirmou que solicitou a resolução do problema "com urgência e dentro do prazo de sete dias".

"A Sespa esclarece que está em diálogo constante com a Organização Social Associação da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Pacaembu e reconhece o trabalho dos médicos e que está é uma demanda que precisa ser resolvida imediatamente", diz o comunicado.