Com avanço pelo país, covid-19 já mata mais no interior do que nas capitais
O avanço da covid-19 pelo país fez com que o total de mortes pela doença no interior já supere a as capitais desde o primeiro óbito, em março. Segundo dados do Ministério da Saúde, o interior registrava até a terça-feira (7) 34 mil mortes em cidades do interior, contra 31 mil das capitais e do Distrito Federal —o que representa 52,2% do total de óbitos.
A virada na curva aconteceu na semana epidemiológica 26, que vai de 21 a 27 de junho. Segundo o boletim do ministério de 1º de julho, dos 26 estados, 17 já têm mais mortes no interior que nas capitais. Acre, Alagoas, Amazonas, Amapá, Bahia, Ceará, Pernambuco, Rondônia e Roraima ainda têm suas capitais com a maioria em óbitos por covid-19. O Distrito Federal não entra nessa conta por concentrar apenas Brasília.
A maior concentração percentual de mortos no interior de um estado está em Santa Catarina, onde apenas 5% dos óbitos estão na capital, Florianópolis. Palmas vem em seguida, com 9,6% das mortes no Tocantins.
A interiorização também pode ser vista em número de municípios que registraram mortes até 27 de junho. Até a data foram 2.551 cidades com óbitos confirmados pela doença (ou 45,8% do total brasileiro).
Espalhamento maior
Hoje no país, nenhuma cidade com mais de 25 mil habitantes está livre de ter pelo menos um caso. Segundo o ministério, dos 4.143 municípios com porte populacional de até 25 mil habitantes, apenas 536 (12,9%) não apresentam casos confirmados de covid-19.
Nas 17 cidades com mais de um milhão de habitantes —que inclui 14 capitais, Guarulhos, Campinas (ambas em SP) e São Gonçalo (RJ)—, a prevalência da doença era de 9.000 casos por milhão de habitantes. Nas cidades de média porte, entre 500 mil e 999 mil moradores, essa taxa cai para 7.300 por milhão.
A interiorização está levando cidades a voltarem atrás em medidas de flexibilização de isolamento, como ocorreu esta semana em Campinas. Maior cidade do estado fora da Grande São Paulo, o município estava na fase 2 (laranja) com comércios de ruas, shoppings e concessionárias autorizadas a funcionar. A região voltou à fase 1 (vermelha) e só pode abrir serviços essenciais.
Um dos indicativos de alta é o número de testes feitos na cidade. Somente nas seis unidades do Grupo Sabin, a procura por testes no modelo RT-PCR teve crescimento de 195% no últimos três meses. "O aumento dos testes é um indicativo da interiorização da pandemia, pois as pessoas com sintomas e/ou que tenham tido contato com outras pessoas com diagnóstico da covid-19 buscam o laboratório para realização dos exames para que possam confirmar se estão com a doença, no caso do [teste] RT-PCR, ou se já tiveram contato com o vírus, no caso das sorologias", afirma o gestor do grupo, o médico Alex Galoro.
Mortes concentradas nas capitais
Segundo o pesquisador e coordenador do comitê científico do Consórcio Nordeste, Miguel Nicolelis, o número de mortes no interior demorou a ultrapassar o de capitais porque muitos casos graves são internados nas capitais por conta da falta de UTIs (Unidades de Terapia Intensiva) em locais menores —o que obriga cidades a "exportarem" pacientes. Consequentemente, isso causa mortes nas capitais de pacientes que vêm de fora.
"É natural haver uma concentração de mortes onde há mais leitos de UTI, onde tem mais recursos. E quando você divide em três categorias —capital, cidades da região metropolitana e interior—, o efeito bumerangue fica mais claro."
Em São Paulo isso já está claro: o interior está começando a duplicar a velocidade de casos em relação à capital. Em vários lugares do Nordeste os casos também estão crescendo mais rapidamente"
Miguel Nicolelis, coordenador do comitê científico do Consórcio Nordeste
Efeito ciclone
Em número de casos, o interior ultrapassou o total de casos das capitais bem antes das mortes, na semana 21, encerrada em 23 de maio. "A única conclusão que tiro disso é que os casos aumentam no interior, mas os casos mais graves voltam para capitais, onde as pessoas morrem. É o efeito bumerangue", diz Nicolelis.
No cenário atual da epidemia no Brasil, ele diz que há também o "efeito ciclone" nos estados. "Isso ocorre porque as pessoas começam a vir do interior para a capital em busca de atendimento com mais alguém, e nesse traslado elas podem infectar outras pessoas. E aí essas pessoas voltam para o interior, e infectam outras lá. Daí se cria um efeito sem fim, vira um círculo vicioso", conta.
Para Nicolelis, como o novo coronavírus se espalhou pelo país basicamente por meio das rodovias, é necessário fazer bloqueios em estradas para evitar que cidades ainda mais frágeis sejam atingidas. "Estamos estudando o que tem de ser bloqueado de tráfego para evitar espalhamento do vírus ainda maior pelo Brasil. Ainda dá tempo, mas requer uma ação sincronizada entre os estados e regiões", afirma.
Como alertou em boletim científico do comitê na semana passada, Nicolelis afirma que ainda não há como flexibilizar o isolamento social com segurança, nem mesmo nas capitais que conseguiram reduzir por várias semanas o número de casos e mortes, como ocorreu Fortaleza.
"Conversando com gente de várias capitais do Nordeste, a ocupação de pessoas internadas do interior aumentou muito, e está aumentando. Por isso alertamos que não dava para flexibilizar isolamento com 80% dos leitos ocupados: se tiver outra onda vinda do interior, você não dá conta."
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