Falhas de planejamento causam desperdício de vacinas no Rio
Enfermeiros da cidade do Rio de Janeiro estão recorrendo ao sindicato da categoria (Sindenfrj) para denunciar desperdício de vacinas contra covid-19. O órgão, que recebeu até o momento oito denúncias, e infectologistas consultados pelo UOL veem falhas de planejamento em unidades de saúde por trás dos descartes de imunizantes.
"Foi perda de vacina. Enquanto a gente vive um momento de tão poucas doses, ficamos pasmos de ver esse desprezo. É falta de organização", diz Mônica Armada, presidente do Sindenfrj. A SMS (Secretaria Municipal de Saúde) afirmou, por meio de nota, que para evitar desperdício "está excepcionalmente indicada a aplicação em outros profissionais da própria unidade".
Entre as denúncias recebidas pelo sindicato, enfermeiros de uma Clínica da Família da zona oeste relataram que praticamente um vidro inteiro do imunizante Oxford/AstraZeneca —que contém o equivalente a dez doses— foi descartado com vacina por falta de uso.
"O frasco tem dez doses, teve clínica que só usou uma, ou seja, nove foram descartadas. Eu liguei imediatamente para o secretário de Saúde [Daniel Soranz]", disse Mônica Armada.
A determinação era, até então, imunizar profissionais de saúde com 60 anos ou mais, porém o fluxo desse público-alvo está pequeno. Segundo orientação da fabricante, após a abertura do frasco da vacina, as doses devem ser usadas em até 6 horas —depois disso, a vacina pode perder propriedades farmacológicas ou potência, não devendo portanto ser mais usada.
"A orientação que nós tivemos era de dar a dose apenas para esse público-alvo. Jogamos fora porque ficamos com medo de vacinar uma outra pessoa e depois nos chamarem atenção ou até sermos demitidos. Mas isso é um absurdo, isso parte o coração", relatou ao UOL um profissional de saúde que pediu para não ser identificado.
No final do turno não se abre um novo frasco para aplicar uma ou duas doses. Se tiverem oito pessoas na fila, pega outras duas, como um cuidador dos idosos, e vacina. Não é para desperdiçar, não é para jogar fora. Os gestores [das unidades de saúde] não leram nem o informe técnico. Isso para mim é muito grave, é erro de procedimento.
Alberto Chebabo, infectologista
O que diz a secretaria
A SMS disse que, caso haja sobra de doses, para evitar desperdício, "está excepcionalmente indicada a aplicação em outros profissionais da própria unidade, mas essa situação deve ser realizada sob supervisão, para garantir que de fato se tratem de doses excedentes à demanda do dia". A secretaria orientou ainda que, no final do dia, "em vez de abrirem novos frascos da Oxford/AstraZeneca, as unidades usem a CoronaVac" —o frasco contém uma dose.
O UOL procurou o Coren-RJ (Conselho Regional de Enfermagem), que informou que não recebeu denúncias.
Perda de vacinas após queda de luz
Além dos descartes, a queda de luz no Hospital Federal de Bonsucesso, na zona norte, no último domingo (24), que afetou ala em que estava armazenadas 700 doses da CoronaVac, também foi alvo de críticas de infectologistas. Os imunizantes passam agora por uma análise para saber se não foram comprometidos.
"Quando você se propõe a trabalhar com a vacina, tem que ter as condições de armazenamento necessárias, como sistemas 'no break' [equipamento que mantém aparelhos ligados quando há queda ou variações de energia]. Seja o lugar que for, precisa ter isso para manter o frio que ela [vacina] necessita ou então serão desperdiçadas", diz a infectologista Tânia Vergara.
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