Pela 1ª vez, mortes pela covid no país superam a soma das outras doenças
O avanço da pandemia no Brasil fez com que a mortalidade pela covid-19 superasse, pela primeira vez, a soma de todas as mortes causadas por outras doenças em uma semana.
Os dados se referem à semana entre 28 de março e 3 de abril, quando os óbitos pela covid-19 responderam por 50,3% das mortes naturais no país, enquanto todas as outras doenças somadas responderam por 49,7%.
Os números são dos cartórios de registro civil e têm como base a causa da morte informada nos registros de óbitos (documento necessário para emissão da certidão de óbito). Nessa soma não estão incluídas as mortes por causas externas, ou seja, acidentes, homicídios e suicídios.
A participação da covid-19 nas mortes naturais mais do que dobrou desde o início do ano. Na primeira semana de 2021, o percentual era de 23,2% —próximo ao registrado em 2020 (a partir de 16 de março): 19%.
A primeira vez que esse índice ultrapassou 30 pontos percentuais foi na nona semana do ano (de 28 de fevereiro a 6 de março), quando ficou em 33,9%. A partir dali, a média disparou.
Até agora, o dia com mais mortes no país foi 22 de março, com 3.042 óbitos. O recorde de 2020, registrado em 21 de julho, era de 1.075 mortes pela covid-19.
Os dados dos cartórios classificam as mortes ocorridas em cada dia, diferentemente dos números apresentados pelo Ministério da Saúde e pelo consórcio de imprensa, do qual o UOL faz parte, que leva em conta as confirmações de óbitos naquela data pelas secretarias estaduais e traz muitas mortes ocorridas em dias anteriores, mas apenas confirmadas naquela data.
Principais causas de morte (28/3 - 3/4)*:
- Covid-19 - 16.558
- Pneumonia - 2.084
- Septicemia - 2.002
- Causas cardíacas inespecíficas - 1.454
- AVC (Acidente Vascular Cerebral) - 1.290
- Infarto - 1.263
- Insuficiência respiratória - 1.104
- Indeterminada - 108
- Outras causas - 7.036
- Total sem covid - 16.341
* Dados até 9/4 e sujeitos a novas inclusões
Os números dessa semana, entretanto, ainda terão pequenas ampliações, já que leva até 15 dias para os registros serem inseridos no portal da transparência da Arpen/Brasil (Associação Brasileira de Registradores de Pessoas Naturais).
"Eu não tenho notícia de uma doença que tenha causado mais de 50% das mortes em um único mês [no Brasil]. É realmente surpreendente que a gente tenha um predomínio tão grande de mortes causadas por uma doença que é prevenível", afirma a médica e pesquisadora Fernanda Grassi, da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) na Bahia.
Segundo ela, o índice alcançado pelo país é fruto de uma sucessão de erros e omissões nas ações de combate à pandemia. "Destaco mais o que não foi feito. Nós já estamos assistindo desde outubro do ano passado um aumento progressivo do número de casos e também de mortes. Há algum tempo deveriam ter sido tomadas medidas mais drásticas de restrição da mobilidade, de fechamento de serviços não essenciais. Isso na realidade nunca foi feito de maneira séria no país", diz.
Grassi ainda alerta que a curva ascendente do país deixa claro que abril deve ser ainda mais trágico.
O número de casos vem aumentando. O número de pacientes que estão esperando uma vaga na UTI está aumentando em quase todas as capitais. A epidemia está fora de controle. O cenário é catastrófico em todo o país.
Fernanda Grassi, pesquisadora da Fiocruz
Rondônia líder
O estado que registra o percentual mais alto de mortes por covid-19 na semana passada é Rondônia, que desde fevereiro enfrenta colapso do sistema de saúde. Entre 28 de março e 3 de abril, a covid-19 representou 64,6% de todos os óbitos por causas naturais.
Uma das vítimas foi o comerciante Wilson Thurmann, 59, de Nova Brasilândia D'Oeste. A morte do dono de uma sorveteria causou comoção na cidade.
Segundo a prefeitura, o microempresário morreu no dia 31 de março devido ao agravamento da doença, mas ele "aguardava na fila por uma vaga na UTI" (Unidade de Terapia Intensiva).
No estado, pacientes esperam vagas para serem internados e muitos não resistem. No final de fevereiro, o secretário de Saúde, Fernando Máximo, fez um apelo em tom firme, dizendo aos que teimavam em descumprir o isolamento que o estado não tinha "vaga para internar sua mãe".
Outra morte que causou comoção na semana foi a do professor universitário e jurista Stênio Castiel Gualberto, em 28 de março, em Porto Velho. "Ele era muito querido pela comunidade universitária e doutorando em ciência jurídica", lamentou, em nota, a Faculdade Católica de Rondônia, onde ele era coordenador do curso de direito.
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