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Maio tem recorde de doses, mas vacinação contra covid desacelera

Arquivo - Tomaz Silva/Agência Brasil
Imagem: Arquivo - Tomaz Silva/Agência Brasil

Nathan Lopes

Do UOL, em São Paulo

02/06/2021 04h00Atualizada em 02/06/2021 16h12

Resumo da notícia

  • Brasil bateu recorde no número de doses distribuídas em maio
  • Ritmo de vacinação, porém, caiu na comparação com abril
  • País vê estados com diferença entre doses distribuídas e aplicadas
  • Burocracia e falta de estrutura são pontos que explicam diferença

Maio terminou como o mês com mais doses de vacinas contra a covid-19 distribuídas pelo Ministério da Saúde, mas isso não resultou no aumento do ritmo de vacinação no Brasil —ao contrário, o que se viu foi uma desaceleração.

A média diária de aplicação de doses no mês passado foi menor do que a de abril. Foram 662.600 por dia contra 822.300 no mês anterior, queda de cerca de 19%.

Por outro lado, em maio, foram distribuídas 33,1 milhões de doses, segundo informações do Ministério da Saúde. Até então, o maior número havia sido em março, com 27,5 milhões. Em abril, foram 20,6 milhões.

Acumulado - doses aplicadas e distribuidas - Arte/UOL - Arte/UOL
Imagem: Arte/UOL

No total, quase 97 milhões de doses já foram repassadas pelo ministério a estados e municípios. Mas apenas sete em cada dez foram aplicadas no país.

Alguns estados têm enfrentado dificuldade para vacinar. O pior de todos é o Rio de Janeiro, que só aplicou 52%, pouco mais da metade das doses recebidas. Outros 11 estados fazem companhia aos fluminenses entre aqueles que estão abaixo da média nacional, de 70% das doses recebidas aplicadas.

Maio Doses distribuiIdas e aplicadas - Arte/UOL - Arte/UOL
Imagem: Arte/UOL

Alguns fatores podem explicar os motivos que travam o avanço da imunização:

  • o intervalo entre a distribuição e a aplicação das doses não é imediato, é normal haver um tempo entre a saída da vacina do laboratório e a chegada às cidades. Em alguns locais mais afastados, ele é ainda maior em razão de dificuldades logísticas;
  • burocracia para registrar que uma dose já foi aplicada;
  • estoque reservado para aplicação da segunda dose;
  • cidades que já cumpriram a meta inicial e não tinham mais como avançar no programa de imunização.

Demora para registrar doses aplicadas

Ao contrário de outras vacinas, a contra o novo coronavírus exige que a equipe de saúde cadastre uma série de informações via internet para que a dose aplicada seja oficialmente contabilizada.

"Agora, a gente precisa inserir CPF, nome, lote da vacina, quem aplicou. A informação torna-se mais complexa para subir para o Ministério da Saúde", diz Marcelo Cabral, secretário-executivo do Conectar (Consórcio Nacional de Vacinas das Cidades Brasileiras), que reúne cerca de 2.000 municípios.

Media diaria doses aplicadas - Arte/UOL - Arte/UOL
Imagem: Arte/UOL

"A gente tem observado que muitos municípios estão fazendo esse registro manual, criando aquelas pilhas de papel, para depois inserir no sistema. Isso não é incomum."

Cabral diz também que a diferença entre os números é, em parte, reflexo de questões logísticas e de reserva para completar esquema vacinal, ou seja, reservar a segunda dose para quem tomou a primeira.

RJ: a pior relação

Subsecretário de Vigilância em Saúde do Rio de Janeiro, Mário Sérgio Ribeiro aponta que problemas estruturais são a causa dessa diferença entre doses distribuídas e aplicadas no estado.

Algumas cidades têm demorado para lançar a aplicação da dose no sistema, alegando falta de pessoal ou de capacidade técnica para fazer o serviço de maneira mais rápida, segundo ele, que aponta haver cidades que demoram até três semanas para realizar o registro. "A gente está em uma distância muito grande entre o que foi aplicado e o que está no registro."

O Brasil tem um sistema tripartite na gestão da saúde. No caso da vacinação, o governo federal fica responsável por comprar as doses, o estadual, por coordenar a imunização, e o municipal, pela aplicação.

Ribeiro diz que tem reclamado sobre a situação e feito o apelo para que os municípios mudem a situação, dizendo ter sugerido alternativas para que a situação mude, como a utilização de profissionais de outras secretarias municipais para lançar dados no sistema.

"A meu ver, não é justificativa plausível [a falta de pessoal]", diz, ao citar que cidades alegam que "falta digitador" para o serviço. "A gente só não entende por que o Rio de Janeiro continua nessa condição de último colocado no levantamento do registro", diz. "Fica feio."

O subsecretário também lembra que a demanda sobre as equipes que aplicam vacinas aumentou porque, simultaneamente à imunização contra a covid-19, são administradas doses contra a gripe. "É um problema crônico que está atingindo o estado do Rio de Janeiro."

Doses distribuidas numeros absolutos -  -

O Conectar diz que está pensando em como atuar para minimizar esse problema de defasagem entre a informação de doses distribuídas e aplicadas.

De acordo com o subsecretário do governo fluminense, "o fato de a gente não ter um registro alto não significa que vacinas não estejam sendo disponibilizadas". "Estão pingando as vacinas. O nosso problema é conseguir superar essa questão do registro", diz Ribeiro, que ressalta que a estatística é fator importante para estratégias de combate à pandemia.

Logística interfere

Problemas de estrutura e logística têm afetado estados do Norte do país, como Roraima e Amazonas.

"O nosso processo de vacinação no interior é muito mais demorado porque os nossos municípios são muito grandes", diz Cássio Espírito Santo, secretário-executivo de Assistência do Interior da Secretaria de Saúde do Amazonas. "São dias para chegar à área ribeirinha." Ele cita como exemplo a região de Palmeiras do Javari, onde, para chegar a vacina, "são seis dias subindo o rio".

Isoladas, algumas comunidades não têm como informar a aplicação da dose "porque não têm suporte de internet". "Mas o processo de vacinação vem ocorrendo no interior."

Falta de braços e negacionistas

Líder na relação de estados que mais aplicam doses, o Mato Grosso do Sul enfrentou um outro problema: não ter mais quem vacinar. Isso porque já havia imunizado as pessoas do grupo prioritário.

Desde a flexibilização, autorizada pelo Ministério da Saúde na semana passada, o estado pôde começar a vacinar por faixa etária. "Isso vai fazer avançar muito a imunização", diz o secretário de Saúde do estado, Geraldo Resende.

Antes da flexibilização, segundo o Cosems (Conselho de Secretários Municipais) do estado, nove cidades já haviam finalizado a aplicação da primeira dose dos grupos prioritários, por determinação do PNI (Programa Nacional de Imunizações). Agora, já começaram a vacinar de acordo com a faixa etária.

Pernambuco também espera acelerar a vacinação a partir da flexibilização. "Com a liberação, objetiva-se ampliar a imunização dos pernambucanos e, consequentemente, proteger mais pessoas, evitando deixar doses paradas", disse, em nota, a secretaria estadual.

Para ter uma alta relação entre doses distribuídas e aplicadas, Resende diz "não ter vergonha de ser uma espécie de bedel". "De ligar para prefeito, secretário municipal pedindo para avançar na imunização."

Segundo o secretário, uma outra dificuldade, mas em menor escala, esteve nas pessoas que não quiseram receber vacina. "Sabemos que estamos em um estado muito conservador, em que algumas pessoas que não seguem a recomendação de autoridades sanitárias", diz.

"Mas temos feito o apelo para a gente superar esses obstáculos, que têm um viés político, principalmente naqueles que negam a doença, o uso da vacina, uso de máscara. E que são responsáveis pelo momento que a gente vivencia."