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Médicos temem que população flexibilize uso da máscara 'onde não se deve'

Máscara ainda é necessária em ambientes fechados e em locais abertos com aglomeração - iStock
Máscara ainda é necessária em ambientes fechados e em locais abertos com aglomeração Imagem: iStock

Nathan Lopes

Do UOL, em São Paulo

24/11/2021 13h58Atualizada em 24/11/2021 14h39

Médicos consultados pelo UOL não acreditam haver problema em se desobrigar o uso de máscaras em ambientes abertos sem aglomeração neste momento. O receio que eles têm é do reflexo que isso terá no uso do equipamento de proteção em cenários em que ele ainda se faz necessário: locais abertos com outras pessoas ao redor e ambientes fechados.

"Cada vez que isso se torna oficial, nós passamos a ter o não uso de máscara como norma. Isso pode fazer com que mais pessoas se exponham", diz Carlos Magno Fortaleza, presidente da SPI (Sociedade Paulista de Infectologia) e professor da Unesp (Universidade Estadual Paulista).

"Será que a população vai acompanhar e entender que é só em espaço aberto? E que não vai se desobrigar de usar máscaras em ambientes fechados, o que ainda não é recomendado?", questiona Flávio da Fonseca, virologista da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e presidente da Sociedade Brasileira de Virologia. "É um impacto que uma flexibilização dessas traz onde não se deve flexibilizar."

Hoje, o governo de São Paulo anunciou que o uso de máscara não será mais obrigatório em ambientes abertos sem aglomeração a partir de 11 de dezembro.

Sem riscos se não tiver aglomeração

"Tem que ser ambientes abertos E sem aglomeração", faz questão de reforçar o chefe da infectologia da Unesp, Alexandre Naime, consultor sobre covid-19 da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia) e da AMB (Associação Médica Brasileira). "Se estou na praia, em um parque, uma avenida e não tiver ninguém por perto, não há nenhum problema."

Naime diz que "nunca foi proibitivo, do ponto de vista científico, deixar de usar máscara em um ambiente aberto sem aglomeração". "Isso nunca foi perigoso, mesmo durante os piores meses da pandemia." Ele completa dizendo entender que as medidas mais rígidas eram necessárias para que a população entendesse a importância do uso da máscara nos cenários de risco, que são as aglomerações e os ambientes fechados.

Simbolismo

Pelo fato de parte da população já não utilizar a máscara, mesmo ela ainda sendo essencial em ambientes de aglomeração e locais fechados, os especialistas acreditam que seria melhor ter cautela na flexibilização — assim como pedir que a decisão seja revista caso haja uma piora dos números da pandemia até 11 de dezembro.

"Eu entendo que liberar o uso de máscaras tenha um impacto mais simbólico. No entanto, eu esperaria um pouco mais", diz Fortaleza, que teme um surgimento de variantes e de novos focos de surtos.

"Esse vírus surfa nas oportunidades que a gente dá para ele", diz Fonseca. "Desobrigar o uso de máscara é uma oportunidade que ele vai saber explorar se tiver condições."

Sem dados para avaliar

O infectologista Marcos Boulos, professor da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo), se preocupa em razão do exemplo que vem da Europa, em que países estão voltando a tomar medidas para frear a disseminação do vírus. "Tivemos praticamente dois anos de paciência. Por que agora, no finalzinho, acelerar?"

Consultora da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia) e infectologista da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), Raquel Stucchi é favorável a que se espere chegar a 80% da população com esquema vacinal completo. Hoje, o estado de São Paulo tem cerca de 75%.

Boulos concorda. Ele avalia que "estamos indo bem" na melhora da situação da pandemia, mas poderíamos aguardar apenas mais um pouco. "Espera chegar lá [nos 80%]."

Para Stucchi, olhar para vacinação é importante porque, como o Brasil tem histórico de ter testado pouco a população ao longo de toda a pandemia, a referência que temos sobre a circulação do novo coronavírus é frágil.

"Os parâmetros que a gente usava para verificar a gravidade da pandemia, que era internação e óbitos, não são mais úteis porque a vacina diminui a forma grave da doença e diminuindo a mortalidade", diz Stucchi. "Esses casos leves não estão sendo diagnosticados pela nossa baixa testagem."

Por essa razão, em um contexto em que o país não tem certeza sobre a realidade da pandemia, se faz ainda mais importante a dose de reforço da vacinação contra a covid-19 para que essa flexibilização não traga retrocessos. "Fundamental para que isso se mantenha", diz Naime, sobre a melhora nos números da pandemia no Brasil.