Com fim da pandemia incerto, 2022 terá menos mortes, dizem cientistas
A pandemia entrou em seu terceiro ano no Brasil com número de casos de covid-19 explodindo, mas, ao mesmo tempo, com esperança de dias melhores.
Especialistas em saúde preveem um cenário com menos mortes neste ano, mas de incertezas em relação ao fim da pandemia devido à onda de ômicron e a um eventual surgimento de novas variantes do coronavírus. A previsão de menor letalidade tem como base o avanço da vacinação.
Para Ana Brito, pesquisadora da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) Pernambuco, o cenário de 2022 é "bem melhor que o do ano passado".
"Nós agora temos instrumentos e um arsenal terapêutico e profilático suficiente para interromper a transmissão desse vírus, ou seja, para que toda população do mundo seja vacinada. Isso é fundamental", afirma a epidemiologista.
A gente só vai conseguir interromper a transmissão desse vírus quando toda a população do planeta estiver vacinada por uma razão muito simples: assim o vírus não vai ter mais pessoas suscetíveis ao adoecimento. E a velocidade de vacinação é determinante para que a gente possa interromper a doença também".
Ana Brito, pesquisadora da Fiocruz
A bióloga e divulgadora científica Natália Pasternak prevê que 2022 seja o último ano de "estado global pandêmico". "A pandemia como um fenômeno global provavelmente vai acabar, mas isso não quer dizer que o vírus vai embora: a gente vai continuar vendo surtos endêmicos, locais, sazonais."
"À medida que a gente avança na vacinação, principalmente em países como o Brasil, de alta aceitação das vacinas, vai diminuindo os impactos da pandemia. O vírus continua lá, mas ele vai causar muito menos estrago", diz a fundadora e primeira presidente do Instituto Questão de Ciência.
Vacinação global
Natália Pasternak diz que 2022 traz boas notícias no que se refere à expansão da vacinação no mundo, graças a iniciativas filantrópicas que tentam corrigir a desigualdade vacinal —e que ameaça todo o planeta com o surgimento de novas variantes.
2022 vai ser um ano para resolver o problema social, para que as vacinas cheguem em quem precisa, e fazer elas chegarem na quantidade necessária. Esse é o nosso maior desafio."
Natália Pasternak, bióloga
O Brasil tem atualmente quase 70% da população imunizada com as duas doses ou a dose única, segundo levantamento feito pelo consórcio de veículos de imprensa do qual o UOL faz parte.
Mas, por mais que o país avance em imunização em 2022, a vacinação também precisa alcançar mais pessoas no mundo para "proteger" o Brasil.
"Só vamos ter uma tranquilidade maior quando o planeta estiver todo vacinado. E quando falo vacinado, ressalte-se, é estar em dia. Nesse momento reforça a necessidade urgente das pessoas que estão na época de fazerem a três doses, que a proteção é muito maior", diz Isabella Ballalai, vice-presidente da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações).
Para ela, o poder de mutação do coronavírus é surpreendente --e isso pode gerar mudanças no comportamento da doença causada por ele no ser humano.
"A boa notícia é a percepção de que estamos mais perto de uma situação confortável, apesar do momento que a gente vive, com casos aumentados por causa da ômicron. As vacinas vão reduzir hospitalizações e mortes, e este ano vamos iniciar a vacinação das crianças, que é muito importante", diz.
Incerteza ainda assusta
O cientista Miguel Nicolelis é mais prudente em suas previsões para 2022 e afirma que, no momento, não é possível traçar cenários.
"Eu li esses dias um artigo de especialistas britânicos no 'The Guardian', e eles foram categóricos em dizer que não dá pra fazer uma previsão. Não tem bola de cristal, nem tem modelo matemático. Tanto pode acabar, como uma mutação do vírus pode piorar. Não existe uma linha reta em evolução natural, depende de várias condições. Previsão agora é chute", diz.
Para Nicolelis, a melhor notícia de 2021 --e que vai ajudar muito neste ano-- é que as vacinas mostraram que funcionam.
"Elas estão impedindo casos graves, mas a ômicron tem uma taxa de transmissão maior. Têm pessoas falando que há um lado positivo nela, que é o fim do túnel, e isso não tem nenhuma lógica", afirma ele.
O presidente da SBV (Sociedade Brasileira de Virologia), Flavio Fonseca, segue raciocínio parecido.
Para ele, o fato de a última pandemia —da gripe espanhola— ter durado três anos não é parâmetro de comparação com a situação atual. "Isso foi há cem anos. hoje estamos em condições muito diferentes: o trânsito global é intenso e imparável. Além do mais, três anos não é um número canônico para início e fim de pandemias."
Ele lembra que hoje não há mais distâncias superiores a 24 horas entre lugares do mundo.
"Você tem um fenômeno de espalhamento em uma velocidade muito grande, como ocorre com a ômicron. Ela pode significar o início do fim [da pandemia] porque ela é uma variante extremamente infecciosa, com baixa letalidade --e isso pode representar uma evolução natural. Mas eu acho muito pouco provável que [o surgimento de variantes] se encerre em 2022", completa.
Para ele, novas variantes do coronavírus ainda devem aparecer.
Quanto mais um vírus se multiplica, mais surgem variantes e mais elas são selecionadas. A tendência é que novas surjam --como temos alguns indícios de surgimento de novas. Por isso, sou cauteloso em relação a este ano. O que acho é que a gente está, sim, em direção ao fim. Se vai ser em 2022 ou 2023, não sei."
Flavio Fonseca, da Sociedade Brasileira de Virologia
Combate ao negacionismo
Antônio Lima Neto, epidemiologista, professor e pesquisador da Unifor (Universidade de Fortaleza), diz que tanto os mais otimistas quanto os mais realistas têm "razão em alguns pontos".
No caso dos otimistas, ele diz que a aposta é de que a ômicron ajude na missão de tornar a doença com letalidade menor.
"Nunca se viu, talvez, um vírus com esse poder de transmissão, mas que indica também que provavelmente ela seria menos virulenta porque tem uma capacidade menor de infectar o tecido pulmonar. Pode ser a evolução dele para conviver melhor e matar menos o seu hospedeiro", diz.
Ele admite contudo que ainda é cedo para cantar vitória. "Diria que os mais realistas respeitam a imprevisibilidade da dinâmica do vírus. A principal questão é que nada impede que outras variantes venham seguindo a diminuição da virulência. Ela pode vir com mais agressividade", diz.
Sobre o Brasil, acho que, em 2022, a gente depende da própria evolução do vírus. A gente está vacinando e tentando superar o discurso negacionista das autoridades nacionais e construir um plano de vacinação para a população como um todo; e, no futuro, até discutir já um plano de vacinação para o ano que vem."
Antônio Lima Neto, epidemiologista
Já Ligia Bahia, médica especialista em saúde pública e professora da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), diz que uma certeza este ano é que "as altas taxas de mortalidade ficarão apenas na história".
"Estamos enfrentando o vírus com medidas que impedem sua circulação, inclusive com vacinas. Ficará da experiência o aprendizado sobre a vinculação entre as pessoas, das barreiras sociais e do mito sobre a imunidade absoluta", destaca.
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