Nestlé acusada de pôr açúcar em Mucilon e Ninho: por que duplo padrão choca

Produtos da Nestlé destinados a bebês, como Mucilon e Ninho, contêm açúcar adicionado e isso só acontece em países em desenvolvimento, incluindo o Brasil —o segundo maior mercado dessa linha de produtos.

A denúncia feita nesta quarta-feira (17) pela organização investigativa suíça Public Eye e pela Ibfan (Rede Internacional em Defesa do Direito de Amamentar) provocou repúdio por escancarar um "duplo padrão que não pode ser justificado", segundo Nigel Rollins, médico da OMS, ao jornal britânico The Guardian.

O que é o duplo padrão

Os mesmos produtos da empresa são vendidos com diferenças gritantes nos países desenvolvidos e subdesenvolvidos.

A ONG enviou amostras do cereal infantil Cerelac (vendido como Mucilon no Brasil) e do leite em pó Nido (Ninho) vendidos na Ásia, África e América Latina a um laboratório belga para exames:

  • Cerelac/Mucilon: 108 dos 115 produtos examinados continham adição de açúcar.
  • No Brasil, 6 de 8 produtos da linha Mucilon tinham em média 3 gramas de açúcar por porção.
  • Nas Filipinas, chegou a 7,3 g/porção e na Nigéria, 6,8 g.
  • Leite Nido/Ninho: 21 dos 29 produtos analisados contém açúcar adicionado.
  • No Brasil, a versão de 1 a 3 anos não contém açúcar adicionado.
  • No Panamá, continha 5,3 g/porção e na Nicarágua chegou a 4,7 g.

Nos principais mercados europeus da Nestlé, incluindo a Suíça, onde fica a sede da empresa, não há adição de açúcar nas fórmulas para crianças pequenas.

Embora alguns cereais destinados a crianças mais velhas contenham açúcar adicionado, não há nenhuma adição em produtos destinados a bebês entre 6 meses e 1 ano, segundo a análise da ONG.

Além disso, a informação não aparece no rótulo dos produtos.

Por que duplo padrão choca

Crianças menores de 2 anos não devem ingerir nenhum tipo de açúcar, indica o Guia Alimentar Para Crianças Brasileiras Menores de 2 Anos, do Ministério da Saúde.

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A adição de açúcar "é extremamente preocupante", ressalta o epidemiologista Rodrigo Vianna, professor do departamento de nutrição da Universidade Federal da Paraíba, citado pela ONG:

O açúcar não deve ser adicionado a alimentos destinados a bebês e crianças pequenas porque é desnecessário e altamente viciante. As crianças procurarão cada vez mais alimentos açucarados, iniciando um ciclo negativo que aumenta o risco de distúrbios alimentares na idade adulta, como a obesidade, bem como outras doenças crônicas como a diabetes ou hipertensão."

A própria Nestlé diz em seu site que: "O ideal é evitar consumir esses ingredientes [açúcar] na infância, pois o sabor doce pode influenciar a preferência da criança por esse tipo de alimento no futuro".

Mas, a pediatra e professora Karen Hofman, do Centro de Economia da Saúde e Ciência da Decisão da Universidade de Witwaterstand, em Joanesburgo, na África do Sul, vai além:

Não entendo porque os produtos a venda na África do Sul devem ser diferentes dos vendidos em locais de alta renda. É uma forma de colonização, e não deve ser tolerada. Não há razão válida para acrescentar açúcar a comida de bebê em lugar nenhum.

O que diz a Nestlé

Ao UOL, a Nestlé afirmou que Mucilon tem produtos com e sem açúcares adicionados, de acordo com os limites estabelecidos como seguros pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). "Variações nas receitas entre países dependem de vários fatores, incluindo regulamentos e disponibilidade de ingredientes, por exemplo, e não comprometem a qualidade e a segurança dos nossos produtos", disse a companhia. (Com DW)

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