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Alvo de um dos piores atentados,Somália vive no esquecimento

26/10/2017 16h10

SÃO PAULO, 26 OUT (ANSA) - Por Luciana Ribeiro - No dia 14 de outubro, a Somália foi palco do maior atentado de sua história.   

Ao todo, 358 pessoas morreram e mais de 270 ficaram feridas. Mas este não foi o único ataque. Há mais de 26 anos, o país vive uma constante guerra civil que, raramente, chega às primeiras páginas do noticiário internacional.   

Um caminhão, carregado com centenas de quilos de explosivos, atingiu um cruzamento movimentado em Mogadíscio. O ataque não foi reivindicado por nenhum jihadista, mas as autoridades somalis atribuíram a ofensiva ao grupo fundamentalista islâmico Al Shabab, que vem aumentando suas ações no centro e no sul do país nos últimos meses.   

A Somália é uma das nações que mais registram ataques terroristas no mundo (está na 7ª posição, atrás de Iraque, Afeganistão, Nigéria, Paquistão, Síria e Iêmen, de acordo com o Global Terrorism Index). Os combatentes do Al Shabab, ligado à Al-Qaeda, tentam derrubar o governo central apoiado pelas Organizações da Nações Unidas (ONU) e pela União Africana (UA), atacando bases militares e alvos civis.Para entender porque o país vive em constante conflito é preciso uma "compreensão da guerra civil na Somália, e da existência e tipo de ação de grupos como o Al Shabab", explicou o cientista político e professor de Relações Internacionais da Universidade Mackenzie Arnaldo Francisco Cardoso.   

"O país africano afirmou sua independência em 1º de julho de 1960, descolonização ocorrida num contexto de disputa ideológica da Guerra Fria cujos reflexos internos podem ser observados durante a guerra com a Etiópia em que a Somália, apoiada pelos Estados Unidos, foi derrotada pelo país vizinho apoiado pela União Soviética", acrescentou o cientista político.   

No entanto, o caos se instaurou mesmo a partir de 1991, quando o ditador Mohamed Siad Barre foi derrubado. Isso deixou o país sem um governo efetivo e em mãos de milícias radicais islâmicas, senhores da guerra que respondem aos interesses de um clã determinado e grupos armados.   

A última eleição realmente democrática na Somália aconteceu em 1969. Até os dias de hoje, "o país enfrenta desafios de produzir alguma coesão social que permita a existência de um governo central legítimo capaz de oferecer os serviços básicos para sua população e um ambiente propício para o desenvolvimento econômico e social", disse Cardoso.   

Além dos ataques terroristas, os jihadistas impedem o acesso de grupos humanitários, o que tem agravado a fome no país, atingido por uma forte seca. De acordo com dados da ONU, mais de 6 milhões de pessoas precisam de ajuda. Este número corresponde à quase metade da população da Somália.   

Neste ano, em fevereiro, o governo decretou catástrofe nacional.   

No mesmo mês, o país elegeu seu novo presidente após ter adiado as eleições por cinco vezes. O ex-primeiro-ministro Mohamed Abdullahi Farmajo foi eleito pelo Parlamento.   

"Um Estado falido é como a Somália é percebida pela comunidade internacional", disse o professor da Mackenzie, ressaltando que, desde os anos 1990, a ONU e a UA constituíram forças internacionais para Missões de Paz no país com o objetivo de "pacificar e promover o diálogo e cooperação". Mas não foram apenas os problemas humanitários que colocaram a Somália em evidência. "Depois do atentado de 11 de setembro de 2001, Estados falidos passaram a ser percebidos como ameaça a segurança internacional por se constituírem em ambiente propício para o desenvolvimento de grupos radicais que utilizam da violência e do terror para perseguir seus objetivos políticos", acrescentou Cardoso.   

Os extremistas são adeptos do wahabismo, versão fundamentalista da vertente sunita do Islã, enquanto a maioria dos somalis segue a linha do sufismo, considerada a "corrente mística e contemplativa" da religião. Al Shabab significa "A Juventude" em árabe. O grupo surgiu como uma ala radical da hoje extinta União das Cortes Islâmica da Somália em 2006, enquanto combatia forças etíopes que invadiram o país para apoiar o fraco governo interino.   

O grupo impôs uma versão rígida da sharia (lei islâmica) nas áreas sob o seu comando. Entre as principais regras estão o apedrejamento até a morte de mulheres acusadas de adultério, além do amputamento dos acusados de roubo.   

A onda de violência causada pelo Al Shabab e até mesmo a instabilidade do governo da Somália tem causado um aumento no número de deslocados que tentam fugir da guerra civil instaurada no país.   

"Nos últimos anos, os deslocados na Somália já passaram de três milhões, sendo uma parte significativa os que se lançam ao mar buscando refúgio em países da Europa, como a Itália", explicou o professor da Mackenzie.   

Durante os últimos cinco anos, quando a crise migratória no continente europeu aumentou consideravelmente, a Itália tem sido uma das principais portas de entrada para imigrantes ilegais.   

Neste ano, segundo a Agência Europeia de Guarda de Fronteira e Costeira (Frontex), o número de imigrantes ilegais que chegaram à Itália pelo Mediterrâneo foi de 99,8 mil pessoas.   

A crise na Somália, inclusive, tem sido uma das responsáveis pelo recebimento excessivo de refugiados no país da bota, o que elevou o número de crimes de ódio na Europa, praticados contra imigrantes e refugiados. (ANSA)
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