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Morte de britânico após parar de comer encerra caso, mas não polêmica sobre eutanásia

Tony Nicklinson antes e depois do derrame - PA
Tony Nicklinson antes e depois do derrame Imagem: PA

23/08/2012 06h35

A polícia britânica anunciou que não abrirá inquérito para investigar a morte de Tony Nicklinson, que sofria da síndrome do encarceramento e morreu na quarta-feira (22), segundo a família, após parar de comer por vários dias e contrair pneumonia. A decisão encerra a trágica jornada do britânico, mas o caso continua alimentado a polêmica sobre o suicídio assistido no país.

Ao se referir a uma das poucas saídas "legais" à disposição de Tony Nicklinson, parar de comer, o jornal The Times escreveu que ele havia implorado para não ter de seguir o "caminho cruel e árduo da inanição".

"Este caso aterrorizador deveria levar os deputados a criar a "Lei de Nicklinson" para dar a outros a opção legal pela qual ele suplicou", disse o jornal Independent.

"Chegou a hora de conversar sobre a morte", conclui um editorial no jornal The Guardian.

Tony Nicklinson, de 58 anos, travava uma batalha legal pelo direito ao suicídio assistido. Pelas regras atuais da Grã-Bretanha, médicos ou parentes que ajudarem alguém a se matar podem ser acusados de homicídio.

Nicklinson ficou paralisado do pescoço para baixo após sofrer um derrame durante uma viagem de negócios à Grécia em 2005. Suas faculdades mentais continuaram intactas, e o britânico se transformou em um ativista pelo direito de doentes terminais ou de pessoas em situação semelhante à sua de morrer com auxílio de médicos.

Em um artigo escrito para a BBC, Nicklinson disse viver um pesadelo. A impossibilidade física de se matar o condenava "a uma 'vida' de sofrimento crescente", segundo ele.

A opção de parar de comer já havia sido apresentada pela família durante a entrevista coletiva concedida após a derrota na Justiça britânica de seu pedido de suicídio assistido na semana passada.

Na ocasião, o britânico, que se comunicava com piscadas de olhos por meio de um computador especial, chorou, enquanto sua esposa, Jane, explicava aos repórteres presentes que Nicklinson considerava apelar da decisão, mas também contemplava a inanição.

Sofrimento

Segundo a advogada da família, Saimo Chahal, a família dispunha de uma medida legal que impedia que ele recebesse cuidados médicos que prolongassem sua vida.

"Jane me disse que Tony piorou rapidamente desde o fim de semana, tendo contraído pneumonia... e também recusava comida desde a semana passada", disse a advogada em declarações à imprensa.

"Jane disse que, após Tony receber a decisão judicial negativa, ele pareceu entregar os pontos", completou.

A morte encerra mais um capítulo da polêmica questão do suicídio assistido, mas o sofrimento de Nicklinson e de sua família deve alimentar o debate sobre mudanças na lei, segundo Penney Lewis, especialista em Direito do Centro de Direito Médico e Ética do King's College, em Londres.

Na decisão da semana passada, referente ao caso de Nicklinson, a Justiça negou o pedido, considerando que a lei britânica é clara ao considerar a eutanásia um crime de homicídio.

Isso porque Nicklinson não seria capaz de ingerir sozinho drogas letais, mesmo que elas fossem preparadas por outra pessoa. Ou seja, sua morte teria de ser decorrente de um ato praticado por alguém.

Quantidade x qualidade

Na ocasião, um dos juízes afirmou que uma decisão favorável a Nicklinson "teria tido consequências muito além dos casos atuais". "Ao fazer o que Tony (Nicklinson) quer, a corte estaria promovendo uma grande mudança na lei. E não cabe à corte decidir se a lei sobre morte assistida deve ser mudada. Segundo nosso regime, isso é um assunto para o Parlamento", afirmou o juiz.

Lauren, uma das duas filhas de Nicklinson, afirmou que a família continuaria lutando para que seu pai tivesse "uma morte sem dor e em paz". E rejeitou os argumentos dos críticos da eutanásia, dizendo que "a vida não deveria ser medida apenas em quantidade, mas em qualidade".

Pelo Twitter, na manhã de quarta-feira, Beth, a outra filha de Nicklinson, disse que, antes de morrer, ele pediu que o microblog fosse atualizado com a mensagem: "Adeus, mundo, minha hora chegou. Eu me diverti".

Sua filha Beth escreveu pelo microblog que "não poderia ter pedido um pai melhor, tão forte. Você agora está em paz, e nós ficaremos bem".