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A onda crescente de ataques explosivos que assusta a Suécia

Ataque em junho na cidade de Linkoping (acima) deixou 25 feridos - JEPPE GUSTAFSSON/AFP
Ataque em junho na cidade de Linkoping (acima) deixou 25 feridos Imagem: JEPPE GUSTAFSSON/AFP

Maddy Savage - Da BBC News em Estocolmo

12/11/2019 17h58

Até 2017, ataques com explosivos nem apareciam nas estatísticas criminais do país.

A Suécia tem visto um aumento sem precedentes de ataques com explosivos.

Antes mais restritas a cidades pequenas e subúrbios pobres, as explosões têm chegado a grandes cidades e suas zonas mais centrais. A capital, Estocolmo, foi alvo de três em apenas uma noite no mês de outubro.

Em um desses episódios, a porta da frente e as janelas do apartamento de Joel, de 22 anos, foram pelos ares em um ataque no distrito de Sodermalm, no norte da capital.

"Cresci aqui e a sensação que tenho é de que o ambiente foi violado", diz.

O esquadrão antibombas sueco foi acionado pelo menos 97 vezes nos nove primeiros meses deste ano.

O que está acontecendo?

Esse tipo de crime nem aparecia nas estatísticas do país antes de 2017.

Em 2018, entretanto, foram registradas 162 explosões. Apenas um em cada dez crimes cometidos no ano passado levaram a alguma condenação.

Neste ano, os ataques se intensificaram no segundo semestre — foram quase 30 apenas nos últimos dois meses.

"Explosivos improvisados e granadas" estão por trás da maior parte deles, diz Linda H. Straaf, chefe de inteligência do Departamento Operações da Polícia da Suécia.

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Edifício alvo de ataque com explosivos no distrito em Sodermalm, em Estocolmo
Imagem: BBC

Os ataques são geralmente perpetrados por gangues contra grupos rivais — ou contra amigos e parentes de desafetos, afirma a especialista.

Equipes da polícia sueca foram enviadas para países como Estados Unidos, Alemanha e Noruega em busca de treinamento e passaram a manter um intercâmbio de informações com especialistas das Forças Armadas suecas que tiveram experiência com bombas no Afeganistão e em países da África.

"É uma coisa nova na Suécia, por isso estamos buscando conhecimento em outras partes do mundo (que enfrentam problemas parecidos)", afirma Mats Lovning, chefe do Departamento Operações da Polícia da Suécia.

O criminologista Amir Rostami compara o país ao México, marcado pelo conflito entre facções criminosas — no caso, os cartéis de drogas — e que, como a Suécia, "não está envolvido exatamente em uma guerra ou tem um histórico de terrorismo".

Onde se concentram as explosões?

No início, a maioria dos ataques se concentrava em subúrbios povoados pela população de mais baixa renda em grandes cidades como Estocolmo, Gotemburgo e Malmo — que registrou três ataques em menos de 24 horas no começo de novembro.

Mas as explosões têm chegado a bairros de classe mais alta. Um ataque em outubro em uma área residencial em Bromma, no norte de Estocolmo, destruiu a entrada de um prédio de apartamentos, estilhaçou janelas e danificou carros.

Na cidade universitária de Lund, um jovem de 20 anos foi levado às pressas ao hospital após ficar ferido em uma explosão num supermercado. Outros 25 ficaram feridos em um ataque a um conjunto de apartamentos na cidade de Linkoping.

O distrito de Sodermalm, que abrigava parte da classe média de Estocolmo algumas décadas atrás, tem se tornado uma área cada vez mais gentrificada. Lojas vintage e restaurantes veganos hoje dividem espaço com blocos de apartamentos monocromáticos.

O edifício alvo de ataque em outubro fica próximo de uma escola e em frente a um parque.

"Logo depois do ataque, fui levar meus dois filhos à escola e vi que a polícia havia fechado a rua. Fiquei com muito medo", conta Malin Bradshaw, que mora próximo ao local.

A polícia ainda não divulgou potenciais suspeitos de serem autores do crime nem suas eventuais motivações.

"Se foi algo direcionado, honestamente isso nos faria sentir um pouco mais seguros, porque significaria que a intenção não foi ferir qualquer um", acrescenta Bradshaw, que torce para que a explosão não tenha sido um ataque aleatório.

As gangues suecas

A polícia sueca afirma que os criminosos por trás das explosões são os mesmos que estão por trás do aumento nos delitos com arma de fogo no país, boa parte envolvidos com tráfico de drogas.

As estatísticas suecas contabilizam 45 mortes por arma de fogo em 2018, contra 17 em 2011. Apesar do aumento, os números estão longe da realidade brasileira, que contabilizou 43,2 mil mortes por arma de fogo em 2018.

As razões para o uso de explosivo pelos criminosos, entretanto, ainda não estão claras.

As autoridades não divulgaram perfil de suspeitos ou de criminosos que já foram detidos. Linda H. Straaf, chefe do departamento de inteligência da Polícia, afirma, porém, que muitos dos ataques têm características em comum.

"Muitos cresceram na Suécia, em ambientes de maior vulnerabilidade social, e fazem parte da segunda ou terceira geração de famílias de imigrantes", ela diz.

O debate sobre imigração tem crescido à medida que o número de imigrantes pedindo asilo no país aumenta, tendo atingido os maiores níveis per capita da Europa desde o início da atual crise migratória, em 2015.

Nesse sentido, Straaf afirma que "não é correto" inferir que a chegada de novos imigrantes esteja ligada à atividade das facções criminosas.

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Ao contrário de outros episódios, explosões em Linkoping receberam ampla cobertura da imprensa sueca
Imagem: Getty Images

Mesmo sem muita clareza sobre quem são os autores, os ataques têm sido usados como argumento por cidadãos favoráveis a uma imposição maior de restrições para entrada de imigrantes no país.

"Essa situação pode piorar e se tornar ainda mais problemática no futuro", diz Mira Aksoy, que se define como uma escritora nacionalista e conservadora.

"Como eles vivem na mesma área, dividem as mesmas ideias, conectam-se de modo mais fácil. Eles não sentem que deveriam se tornar parte da Suécia, mantêm em suas comunidades segregadas e acabam se envolvendo em crimes."

Esse tipo de opinião tem ganhado força nos últimos anos e explica, em parte, porque o partido Democratas Suecos, de caráter nacionalista e anti-imigração, conquistou 18% dos votos nas eleições legislativas de 2018.

Para Malin Bradshaw, entretanto, o aumento na criminalidade está mais ligado a questões ligadas de renda das famílias.

O criminalista Amir Rostami, por sua vez, afirma que a etnicidade raramente tem um papel central no envolvimento de jovens com facções criminosas na Suécia. "Quando interrogo membros desses grupos... a gangue é o país deles, vira a identidade."

O debate também chegou à cobertura da imprensa sobre os casos. A emissora pública SVT foi criticada por não dar destaque aos episódios em seus principais telejornais.

"Acho que eles não fizeram um bom trabalho. Parece que tentaram diminuir o peso da notícia", argumenta a escritora Mira Aksoy.

Christian Christensen, professor do Departamento de Jornalismo da Universidade de Estocolmo, disse ter se surpreendido pelo fato de os ataques terem recebido pouco destaque na televisão nacional, mas pondera que houve extensa cobertura nos grandes jornais e em emissoras locais.

"O problema é que a Suécia é usada simbolicamente como evidência dos problemas relacionados à imigração, com políticas sociais de esquerda, muitas vezes de forma injusta", avalia.