Coronavírus: Chile mantém baixo número de mortes, mas respiradores são 'calcanhar de Aquiles'
A pandemia de coronavírus não dá trégua, e na América Latina os governos correm contra o relógio para evitar que seus sistemas de saúde entrem em colapso como ocorreu em países europeus ou em Nova York, nos Estados Unidos.
Nesta luta, há alguns países que parecem ter conseguido, até agora, adotar estratégias bem-sucedidas para conter ou mitigar a disseminação do vírus e o número de mortes em decorrência da doença causada pelo vírus, a covid-19.
Esse é o caso do Chile. De um lado, há um grande número de casos confirmados (o segundo da região em termos absolutos), mas de outro apresenta uma das taxas de letalidade mais baixas da região.
Para entender o que há por trás do caso chileno, primeiro é preciso analisar alguns números.
Segundo dados oficiais do Ministério de Saúde do Chile, desde o primeiro caso em 3 de março até 5 de abril, foram confirmados 4.471 diagnósticos da covid-19 e 34 mortes.
Assim, em pouco mais de um mês, a chamada taxa de mortalidade seria em torno de 0,8%. Ela é menor que a de países com estratégias bastante elogiadas, como Coreia do Sul (1,8%), Alemanha (1,6%) e Japão (2,3%), ou de países latino-americanos, como Brasil (4,3%), México (4,4%) e Uruguai (1,5%).
Mas é importante lembrar que essas comparações não são recomendadas porque o número de testes diagnósticos realizados em cada país varia muito, e interfere tanto no registro de infectados quanto no de mortos.
Há também um descompasso temporal entre o número de pessoas com a doença neste momento e quantas dentre elas ainda vão morrer nas semanas seguintes ou não.
Se formos analisar também a taxa de mortos (que tende a ter menos subnotificação) por 100 mil habitantes, o Chile tem 0,09 vítimas fatais a cada 100 mil habitantes, o Equador tem 0,7 e o Brasil, 0,23.
O que explica a aparentemente bem-sucedida estratégia chilena?
Testes, testes e mais testes
Uma das chaves para entender o que está acontecendo no Chile passa pela quantidade de testes realizados para detectar que está infectado com o novo coronavírus.
Segundo o governo chileno, são realizados cerca de 3.000 testes por dia, em média. É a maior cifra total por habitante na América Latina.
No Brasil, o Ministério da Saúde afirmou que já foram distribuídos 54 mil testes para os Estados, mas a pasta disse que não consegue precisar quantos foram de fato feitos até agora.
No dia 24, a pasta disse que o país conseguia então realizar 6,7 mil testes por dia e que seria necessário chegar a 50 mil para lidar com o pico da epidemia.
Naquele dia, o governo anunciou que foram comprados 4,3 milhões de testes, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e de empresas privadas, além de mais 600 mil doados pela Petrobrás, e outros 10 milhões estavam sendo negociados.
Em entrevista à BBC News Mundo, o serviço em espanhol da BBC, um representante da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) no Chile, Fernando Leanes, afirmou que, em comparação com o restante do continente, as autoridades chilenas estão realizando uma quantidade "impressionante" de testes.
O Chile conta hoje com 49 laboratórios para analisarem os testes, que são importantes não apenas para detectar um número mais preciso de casos no país quanto para rastreá-los e tentar evitar precocemente um espalhamento maior.
Por isso, a Organização Mundial da Saúde (OMS) tem insistido que aumentar a quantidade de testes é uma medida vital para enfrentar a covid-19.
No Chile, as pessoas diagnosticadas com a doença são monitoradas diariamente pelo Ministério da Saúde acerca do estado de saúde e do cumprimento (ou não) da quarentena obrigatória.
Além disso, as pessoas com as quais os infectados tiveram contato próximo também são submetidas a testes e monitoradas.
Sistema de saúde tem dado conta
Outro ponto que, segundo especialistas, ajuda a explicar a relativa baixa mortalidade é o bom funcionamento até agora do sistema de saúde do país, bastante criticado pela brutal desigualdade entre hospitais públicos e privados.
Vale lembrar que o Chile gasta US$ 2.229 per capita em saúde, a segunda maior cifra da região, atrás apenas de Cuba, mas ocupa o 15º no ranking de desiguldade na América latina.
Ainda que o sistema tenha dado conta até agora, especialistas afirmam que a prova de fogo ocorrerá até o fim de abril, quando o país deve enfrentar o pico de casos, segundo projeções.
"O país tem um sistema de saúde bastante renomado na área de doenças respiratórias", afirmou Leanes, da Opas.
A subsecretária de saúde do país, Paula Daza, ressalta também que o país tem se preparado desde o início para o pior cenário: ampliaram a rede de assistência, a capacitação dos profissionais e o número de leitos hospitalares, com a abertura antecipada de cinco hospitais.
'Calcanhar de Aquiles'
Mas a demanda por cuidados intensivos para pacientes graves tem aumentado.
E uma lacuna grave do sistema de saúde chileno é a oferta de respiradores mecânicos, que são essenciais para tratar os pacientes mais graves.
Isso poderia vir à tona durante o pico de casos, momento em que a demanda por leitos e respiradores pode saturar as redes pública e privada.
"O Chile não está imune a essa situação dramática. Devemos ser prudentes ao afirmar que a estratégia do Chile é bem-sucedida porque isso está só começando", afirma Daza.
E a economia?
A estratégia do Chile para tentar conter o avanço da doença envolve também distanciamento social.
O país suspendeu todas as aulas em escolas e universidades em 15 de março, 12 dias depois do primeiro caso registrado.
Três dias depois, o governo decretou estado de exceção constitucional, que permitiu restringir reuniões em espaços públicos, limitar o trânsito, adotar toques de recolher e fechar fronteiras, entre outras medidas.
Além disso, adotou também quarentenas obrigatórias em zonas consideradas estratégias, ou seja, que apresentavam um maior número de infecções.
Ainda que essas medidas tenham gerado controvérsia em alguns setores, com cobranças para que fosse estendido para todo o país ou críticas ao impacto econômico, um relatório do banco JP Morgan afirma que elas foram adotadas mais cedo que em outros países.
O Chile adotou esses isolamentos quando havia 75 casos confirmados no país, e a Itália, quando passava dos 3.000.
A mesma celeridade se deu com o fechamento de fronteiras. Para o JP Morgan, a "estratégia chilena continua mostrando resultados positivos, o que pode levar a uma menor interrupção da atividade econômica em comparação com outros países".
O Banco Central do Chile tem uma avaliação parecida. Por um lado, prevê que o PIB deve cair 2,5% em 2020, a maior queda desde os anos 1980. Mas por outro, projeta também que uma recuperação forte no último trimestre de 2020 e um crescimento no ano seguinte de algo entre 3,75% e 4,75%.
No Brasil, a projeção mais recente de analistas de mercado (6/4) é que a economia brasileira vai recuar 1,18% em 2020, mas o número tem sido revisto para baixo toda semana. No fim de fevereiro, previa-se um crescimento de 2,17%. Para 2021, o mercado mantém a mesma previsão: alta de 2,5%.
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