Seis meses de sintomas de covid-19: 'Não sei como vou melhorar'
Monique Jackson contraiu covid-19 no início da pandemia e, quase seis meses depois, continua mal. Uma das milhares de pacientes afetadas por esse quadro, ela tem mantido um diário ilustrado sobre seus sintomas e suas tentativas vãs de obter tratamento.
Há cerca de um ano, ela assistiu a uma palestra do TED sobre cogumelos e ficou fascinada. O reino Fungi, afirmava o palestrante, é a original "world wide web" (ou rede mundial de computadores, na tradução corrente), com redes que percorrem florestas inteiras e permitem às árvores que ajudem umas as outras em caso de problema.
Nesses dias, em sua 24ª semana seguida de luta contra a covid-19, isso é algo em que pensa bastante.
Ela aparentemente tem o que se chama de "covid de cauda longa", uma reação específica ao vírus que os médicos ainda estão longe de entender. Ela ficou doente em março, num quadro que parecia uma versão branda da doença, mas seus sintomas nunca foram embora. Meses depois, ela ainda tenta entender o que está acontecendo com seu corpo.
Monique é extrovertida, e quase hiperativa, segundo suas palavras. Em tempos normais, ela pratica boxe tailandês e jiu-jitsu, e pedala quase 20 km por dia para ir e voltar de seu emprego em uma galeria de arte no centro de Londres.
Mas, nos últimos meses, sua vida se transformou completamente. Agora, ela tem uma lista em seu quarto para lembrá-la de guardar energia suficiente a cada dia para escovar os dentes.
"Eu não sou uma pessoa preguiçosa", diz. Alguns dias, no entanto, tudo que ela consegue fazer é descer as escadas.
Enquanto seu corpo se recusa a colaborar, ela encontrou uma válvula de escape no Instagram, onde começou um diário ilustrado de seus sintomas.
Ela usa o diário para falar sobre essa nova condição e se conectar com outras pessoas na mesma posição, os "long-haulers" (algo como "os que enfrentam longas jornadas").
Muitos elementos do novo coronavírus ainda confundem os médicos, e a covid-19 "de cauda longa" é uma das características mais intrigantes da pandemia. Por que algumas pessoas contraem uma versão do vírus que simplesmente não vai embora, mesmo sendo geralmente pessoas que foram só levemente afetadas?
Monique ficou doente na mesma época que uma amiga, depois que fizeram uma viagem de trem juntas. No início, elas se mantinham em contato, seus sintomas estavam praticamente no mesmo ritmo, mas depois interromperam o contato por um tempo.
"Eu tive que parar, era muito assustador", diz Monique.
Durante as primeiras duas semanas, ela se sentiu doente — estava tão cansada que mal conseguia se levantar da cama. Ainda estava frio em Londres, mas ela estava vestindo pouca roupa e segurava um saco de gelo na cabeça para se refrescar. Ela não mediu sua temperatura, mas acha que estava com febre.
"Eu sei que é estranho falar 'eu acho' sobre isso, mas muito do que eu passo é isso, eu acho, mas simplesmente não sei."
Na segunda semana, ela começou a ter dificuldade para respirar. Uma ambulância chegou para atendê-la, mas seus níveis de oxigenação estavam normais. "Eles me disseram que eu estava tendo um ataque de pânico, provavelmente disparado pelos sintomas." Ela não chegou a ser testada para covid-19 porque, em março, o Reino Unido restringia os testes apenas para os casos mais graves.
Ela tentou se tratar com remédios naturais. Comeu alho cru e pimentas inteiras, e se lembra de ter pensado na estranheza de não sentir nenhum gosto. E ela estava exausta.
Depois de duas semanas, alguns sintomas sumiram, mas acabaram substituídos. "Senti um aperto no centro do peito. E ele se transformou no que parecia uma espécie de queimação", diz ela. "Era uma, no lado esquerdo, de ranger os dentes. Achei que estava tendo um ataque cardíaco."
Ela ligou para a emergência, e eles recomendaram que ela tomasse paracetamol. Disseram a ela que o medicamento parecia fazer a dor desaparecer em algumas pessoas, embora não entendessem direito os motivos.
O paracetamol funcionou, mas assim que a dor passou, seu estômago e garganta começaram a queimar "como fogo" quando comia. Os médicos pensaram que ela estava com uma úlcera. Só tempos depois se descobriu que problemas gástricos eram um dos sintomas associados à covid-19.
Cerca de seis semanas depois, Monique começou a ter sensações de queimação ao urinar e dores nas costas. O médico prescreveu três antibióticos diferentes antes de concluir que não era uma infecção bacteriana.
"Foi apenas uma agonia", diz ela. "E, de repente, simplesmente desapareceu."
Monique se afastou das redes sociais. Até ouvir podcasts se tornou difícil porque qualquer menção à covid-19 a deixava ansiosa e afetava sua respiração. Viciada em notícias, ela simplesmente não conseguia lidar com isso.
Temia que, caso acessasse as redes sociais, veria uma postagem atrás da outra sobre mortes e cadáveres. Encontrou consolo nas compras online, mas mesmo ao colocar tamanho de vestidos nas buscas a levavam a histórias de terror sobre novos sintomas da doença. "Na verdade, estava com medo de entrar no Google."
Depois de um tempo, pediu a um amigo que lhe contasse o que estava acontecendo no mundo. Uma das primeiras coisas que ouviu é que havia uma proporção maior de mortes de pessoas negras e de origens étnicas minoritárias. Monique é mestiça e estava com medo.
"Parecia um filme de terror onde todos os negros morrem."
No decorrer das semanas, alguns sintomas foram novamente substituídos por outros, e a situação foi ficando cada vez mais bizarra. Uma dor na nuca era acompanhada por uma estranha sensação na orelha. Suas mãos ficavam azuis, e ela precisava sacudi-las com força para que o sangue voltasse a elas.
"Continuei ligando para o médico para falar sobre novos sintomas e me perguntaram: 'Como está sua saúde mental?'", relata. "A conclusão é que esses sintomas não eram tratáveis ou não eram 'reais'."
Ela tinha erupções cutâneas estranhas por todo o corpo, seus dedos dos pés ficavam vermelhos, ela acordava com dores agudas em diferentes partes do corpo.
Uma noite, enquanto falava com uma amiga por telefone, sentiu o lado direito do rosto cair. Ela foi direto para o espelho, mas seu rosto parecia normal. Estava preocupada que estivesse tendo um derrame, mas os médicos não encontraram nenhuma evidência de que ela tenha sofrido um.
Monique também tinha sensações estranhas por todo o corpo. Às vezes, parecia que alguém estava agarrando a perna dela com as mãos ou os cabelos sendo arrastados pelo rosto, até mesmo dentro da boca.
Ela passou muito tempo tentando explicar a médicos o que estava acontecendo com ela. Em geral, tinha apenas cinco ou dez minutos por telefone para tentar retransmitir tudo o que estava acontecendo em seu corpo. Mas nunca era suficiente.
"Se eles me dissessem que eu tinha covid-19, mas não tinham ideia de como tratar, teria sido tudo bem."
Ela hesita ao falar sobre seu tratamento, reluta em criticar os profissionais de saúde do NHS (sistema britânico de saúde pública), muitos dos quais foram bastante cuidadosos. Mas, para Monique, o sistema não consegue lidar com pessoas em sua situação.
Foram nove semanas até que Monique pudesse ser testada para coronavírus (o resultado foi negativo, mas não significa que não teve a doença). Nesse ínterim, ela temia ter passado o vírus para outras pessoas.
O governo britânico recomenda que as pessoas se isolem por sete dias ou até os sintomas sumirem. Mas o que fazer se eles nunca forem embora?
As pessoas que dividem a mesma casa que ela desenvolveram métodos para evitar contato, como os pontos da porta da geladeira que poderiam ser tocados por cada uma delas.
Passaram também a comer sozinhas em seus quartos.
Um dia, ela foi tomar um pouco de ar fresco em um parque perto de sua casa com um amigo quando uma criança pequena correu para perto dela. Monique deu um pulo para se afastar, e deixou a mãe indignada. "A criança não estava perto de você!" Monique tentou explicar que não tinha medo de contrair o vírus, mas sim de transmiti-lo. Pessoas doentes deveriam ficar em casa, respondeu a mãe da criança.
Ela espera que seu diário ajude as pessoas a entender que nem sempre é tão simples.
Enquanto alguns amigos faziam de tudo para ajudá-la, Monique notou que outros estavam ficando de saco cheio. Nada do que estava acontecendo com ela fazia sentido para ninguém. "Uma pessoa me disse que eu estava ficando obcecada em ter covid-19."
Quatro meses depois dos primeiros sintomas, ela decidiu mudar de casa. Estava muito difícil cumprir com as tarefas domésticas, e seria melhor ficar próxima do suporte familiar.
Havia uma melhora do fôlego dela, e, agora em julho, já conseguia subir uma escada sem precisar parar. Mas, depois de usar o aspirador de pó por cinco minutos para tentar limpar seu quarto, ela colapsou por falta de ar.
Depois do episódio, passou três semanas de cama. E Monique não tem ideia de como ficar melhor.
Os médicos ainda não sabem como ajudar as pessoas cujos sintomas de covid-19 simplesmente não vão embora.
"Tem sido um pouco sobre o que eu posso ou não fazer, e ser flexível sobre meus planos porque meu corpo apenas não se importa com o que eu planejei."
Monique passou a tratar também sua saúde mental, algo que lhe dá ferramentas para a nova realidade de sua vida. Uma coisa que ela não esperava é que a doença a fizesse se conectar com outros entusiastas de cogumelos.
Eles têm propriedades antivirais, escreve ela em uma de suas postagens. Mas também são parte de algo muito maior e mais bonito, diz ela.
Eles são parte do micélio, uma rede subterrânea que se conecta com raízes de árvores próximas e troca nutrientes entre elas. Muitos especialistas no reino Fungi acreditam que essas estruturas ajudam as árvores a se comunicarem entre si, levando nutrientes de uma saudável para outra doente.
Isso faz com o que Monique se lembre dos amigos que deixavam comida em sua porta, mês após mês. Pessoas com as quais contou muito desde que ficou doente.
"Isolada no meu quarto", ela escreveu no Instagram, "fez com que eu me sentisse mais conectada do que nunca".
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