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Guerra da Rússia-Ucrânia

Notícias do conflito entre Rússia e Ucrânia


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Apoio de países ocidentais à Ucrânia está perdendo força?

Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky - Ukrainian Presidential Press Service/Handout via REUTERS
Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky Imagem: Ukrainian Presidential Press Service/Handout via REUTERS

Paul Adams - Repórter da BBC News

08/06/2022 06h17

À medida que a Rússia consegue algum progresso em Donbass, estariam surgindo divergências no consenso ocidental sobre a Ucrânia?

Com as forças russas avançando lentamente na região leste de Donbass e especialistas militares falando de uma longa guerra de desgaste, fissuras parecem ter começado a aparecer no apoio do Ocidente à Ucrânia.

Enquanto dirige a ação da Rússia dos luxuosos salões do Kremlin, o que Vladimir Putin pensa sobre os intensos debates ocidentais sobre a melhor forma de apoiar a Ucrânia e até que ponto a Rússia deve ser punida?

Em um canto, ele vê governos do Reino Unido, da Polônia e no Báltico defendendo que a Rússia seja firmemente derrotada.

"Precisamos garantir que a Rússia seja expulsa da Ucrânia pelos ucranianos", disse a secretária britânica de Relações Exteriores, Liz Truss, na semana passada.

"A integridade do território ucraniano é inegociável."

Do outro lado, Putin vê líderes na França, Alemanha e Itália pedindo uma abordagem diferente.

No início de maio, o presidente da França, Emmanuel Macron, fez um apelo para que houvesse um cessar-fogo entre a Rússia e a Ucrânia. Ele pediu que o Ocidente "não ceda à tentação da humilhação, nem ao espírito de vingança".

No dia seguinte, o primeiro-ministro da Itália, Mario Draghi, falando na Casa Branca, disse que as pessoas na Europa querem "imaginar a possibilidade de haver um cessar-fogo com negociações críveis".

Depois que Macron e o chanceler alemão, Olaf Scholz, conversaram por 80 minutos com Putin no sábado, com o objetivo de convencê-lo a permitir que a Ucrânia exporte grãos pelo Mar Negro, o vice-primeiro-ministro da Letônia fez críticas pesadas aos ocidentais nas redes sociais.

"Parece que há uma série de chamados líderes ocidentais que possuem a necessidade explícita de auto-humilhação, em combinação com um total distanciamento da realidade política", tuitou Artis Pabriks.

Sinais contraditórios

Mas para o Kremlin, o que realmente interessa é o presidente dos EUA.

Mas Joe Biden enviou recados diferentes em momentos distintos. Em março ele chamou Putin de "criminoso de guerra", parecendo sugerir a necessidade de mudança de regime em Moscou. Esta semana ele parecia relutante em enviar sistemas de foguetes à Ucrânia "que possam atacar a Rússia".

O ex-primeiro-ministro e ex-presidente russo Dmitry Medvedev chamou essa declaração de "racional". Mas a decisão dos EUA anunciada na quarta-feira de enviar um sistema de foguetes mais avançado para a Ucrânia foi descrita pelo Kremlin como "jogar gasolina no fogo".

Com o costume do presidente dos EUA de falar de improviso, geralmente cabe ao seu secretário de Estado, Anthony Blinken, apresentar a posição oficial do governo.

Em uma recente reunião de ministros das Relações Exteriores da Otan em Berlim, Blinken disse que os EUA e seus parceiros estão "focados em dar à Ucrânia a mão mais forte possível no campo de batalha e em qualquer mesa de negociações, para que o país possa repelir a agressão russa e defender sua independência e soberania".

São palavras fortes, mas como exatamente se define "a mão mais forte possível"? E o que significa defender "plenamente" a independência e a soberania da Ucrânia?

As divergências estão começando a minar o consenso ocidental sobre a Ucrânia?

"Você só precisa olhar para a dificuldade que foi se chegar ao embargo do petróleo", diz Ian Bond, diretor de política externa do Centro para a Reforma Europeia, referindo-se às semanas difíceis de negociação que resultaram no embargo parcial da União Europeia ao petróleo russo nesta semana.

A noção de que a UE passará a sancionar também o gás russo já foi abandonada. Os países bálticos e a Polônia gostariam que isso acontecesse rapidamente, mas a primeira-ministra da Estônia, Kaja Kallas, admitiu esta semana que "todas as próximas sanções serão mais difíceis".

O chanceler da Áustria, Karl Nehammer, disse que um embargo de gás "não será um problema no próximo pacote de sanções".

Mais armas

O Ocidente prometeu muito, argumenta Kiev, mas cumpriu pouco.

As promessas americanas e alemãs desta semana de fornecer artilharia avançada com múltiplos foguetes e sistemas de defesa aérea e radar certamente ajudarão a atender às demandas urgentes dos comandantes ucranianos.

Mas as alegações de que os alemães estão se arrastando em relação a compromissos anteriores e a insistência de Joe Biden de que as armas dos EUA sejam usadas apenas para atingir alvos russos dentro da Ucrânia fazem com que alguns se perguntem por que o Ocidente procura impor limites ao esforço de guerra da Ucrânia enquanto a Rússia não observa nenhum limite.

"Há uma espécie de calibragem acontecendo", diz Ian Bond. "Como se estivéssemos dizendo 'queremos que os ucranianos ganhem a guerra, mas não muito'."

Acredita-se que Putin começou a guerra confiante de que o Ocidente não resistiria — que os membros da Otan, recém humilhados no Afeganistão, evitariam um novo imbróglio internacional.

Alguns relatórios recentes de Moscou sugerem uma crescente confiança, gerada pelo sucesso gradual no campo de batalha e a crença, nas palavras de uma fonte citada pelo site Meduza, de que "mais cedo ou mais tarde, a Europa se cansará de ajudar".

O Kremlin pode ter se animado com a advertência do governo britânico desta semana de que até seis milhões de lares britânicos podem enfrentar cortes de energia se a Rússia fechar o fornecimento de gás neste inverno.

A insatisfação da opinião pública no Ocidente poderia minar o apoio à Ucrânia?

É um perigo que a Diretora de Inteligência Nacional dos EUA, Avril Haines, explicou aos membros do Congresso no mês passado.

"Ele [Putin] provavelmente está contando que a determinação dos EUA e da UE vai se esvair", disse ela aos membros do Comitê de Serviços Armados do Senado, "à medida que a escassez de alimentos, a inflação e os preços da energia pioram".

Apesar de todas as ansiedades, o consenso ocidental sobre a Ucrânia permanece intacto.

Mas as rachaduras que existem ainda podem se ampliar.

"Se qualquer um dos lados começar a obter ganhos decisivos, isso pode virar um problema", diz Ian Bond.

"Se os russos romperem completamente as linhas ucranianas no leste e começarem a se dirigir para o rio Dnieper, a questão de quanto território a Ucrânia deveria estar disposta a sacrificar para alcançar um cessar-fogo vai crescer na agenda."

Da mesma forma, se as forças ucranianas começarem a expulsar os russos, diz Ian Bond, "haverá vozes no Ocidente dizendo 'não tente recapturar partes do Donbass que os russos controlam desde 2014'".

Não é um debate que parece muito relevante ainda, mas quando o veterano diplomata americano Henry Kissinger sugeriu em Davos que a Ucrânia deveria considerar ceder território para fazer a paz com a Rússia, ele recebeu uma resposta furiosa na Ucrânia.

É um sinal de que debates intensos ainda estão por vir.