Análise: Ataques de Bolsonaro ofuscam balanço de viagem à Ásia
Jair Bolsonaro (PSL) mostrou-se surpreendentemente pragmático e não ideológico na viagem mais longa de seu mandato. Mas vídeo das "hienas" e live colérica prejudicam resultado final de giro pela China e Oriente Médio. O presidente deverá retornar a Brasília nesta sexta-feira (01/11), depois de um périplo de 12 dias pelo Oriente Médio e Extremo Oriente.
Quando ele partiu, o Senado havia acabado de votar a reforma da Previdência. Durante a viagem, o presidente postou um vídeo no Twitter comparando o Supremo Tribunal Federal e órgãos de imprensa a hienas. Ele logo se desculpou por seu erro. Depois disso, em transmissão de vídeo de um quarto de hotel em Riad, na Arábia Saudita, ele atacou a Rede Globo após o canal levar um ar uma reportagem que o associava ao assassinato da vereadora Marielle Franco.
Com isso, o presidente deu um tiro no pé: pois o balanço da viagem que o levou ao Japão, China e, por último, à Arábia Saudita, foi positivo - mas agora ele desviou o foco com seus ataques.
Na agenda de sua visita à China e ao Oriente Médio, constaram encontros com representantes de governos que Bolsonaro maltratou na campanha eleitoral. Isso se aplica especialmente ao Império do Meio, cuja fome de investimentos no Brasil chegou a ser motivo de chacota do atual presidente.
Mas os países árabes também ficaram indignados com a intenção de Bolsonaro de transferir a embaixada do Brasil para Jerusalém. Foi uma afronta a todos os Estados vizinhos de Israel na região, que representam um mercado importante e crescente para os agroexportadores do Brasil.
Em sua viagem, Bolsonaro se viu como um representante comercial brasileiro - no sentido literal da palavra: nos países financeiramente robustos, ele fez campanha em prol de investimentos nos inúmeros programas de infraestrutura e licitações para campos de petróleo e gás nos próximos meses.
Um fundo soberano da Arábia Saudita prometeu investimentos de 10 bilhões de dólares. Com esse dinheiro deverá ser construída, entre outros, a Ferrogrão, a ferrovia que deverá ligar o Mato Grosso ao Pará para transportar soja diretamente para os portos da Amazônia, de onde o produto será enviado para o exterior. No entanto, a promessa de investimento dos sauditas permaneceu pouco concreta.
Nem Bolsonaro nem os representantes do fundo soberano anunciaram pessoalmente o memorando de entendimento. Isso foi feito pelo ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, e por Onyx Lorenzoni, chefe da Casa Civil. Anteriormente, dois acordos de armamentos com Abu Dhabi também não chegaram a ser concretizados.
Na China, desde o início, não se esperava a assinatura de nenhum contrato concreto. A visita ali girou em torno, principalmente, de se construir inicialmente uma confiança mútua. Neste ano, Bolsonaro e Xi Jinping se encontrarão novamente na cúpula do Brics em Brasília.
Além disso, o Brasil e a China, com um volume de negócios de cerca de 100 bilhões de dólares, são parceiros comerciais tão importantes que os dois lados não devem ter nenhum interesse em continuar qualquer desavença. Em comparação: entre a União Europeia (EU) e o Brasil, o volume de comércio exterior é de 65 bilhões de dólares, ou seja, pouco mais de um terço a menos.
Bolsonaro foi recebido na China com altas honras: além do presidente Xi, ele também se reuniu com o primeiro-ministro, Li Keqiang, e com o presidente da Assembleia Popular da China, Li Zhanshu. Não se discutiu se a empresa de tecnologia chinesa Huawei poderá agora fornecer componentes para a instalação da rede de telefonia móvel G5 no Brasil, algo que uma firme oposição por parte dos EUA.
Os diplomatas brasileiros ficaram um tanto surpresos que Bolsonaro tenha abolido, provavelmente sem consulta prévia, a exigência de visto para cidadãos da China e dos países árabes visitados - sem insistir na reciprocidade, ou seja, sem negociar em troca o fim da exigência de visto para a entrada de brasileiros nesses Estados.
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