O difícil regresso (forçado) de refugiados à Síria de Assad

O difícil regresso (forçado) de refugiados à Síria de Assad - Grupos de direitos humanos denunciam aumento de deportações por parte de Turquia e Líbano. Apesar de vida difícil no exterior, maioria não quer voltar à Síria -seja por questões econômicas ou de segurança.Quando as forças de segurança turcas detiveram Abdul Qader Basmaji, em março deste ano, não deu nem tempo do refugiado sírio ir a um caixa eletrônico em Istambul para sacar suas economias antes de ser levado para um centro de deportação.

Alguns dias depois, o homem de 25 anos chegou à fronteira entre a Turquia e a região de Idlib, no noroeste da Síria.

Basmaji ri amargamente quando lhe perguntam se ele foi compensado por ter perdido o emprego, apartamento, amigos e economias. "Ninguém me reembolsou", disse ele à DW na cidade de Idlib, acrescentando que, pelo menos, as autoridades turcas não solicitaram que ele mesmo arcasse com os custos da deportação.

Se tivesse dinheiro suficiente para voltar, Basmaji retornaria imediatamente à sua vida de refugiado em Istambul.

Agora, dez anos depois de fugir de sua cidade natal, Aleppo, após protestar contra o presidente sírio Bashar al-Assad, ele se vê de volta à Síria com apenas o que tinha no bolso no dia em que foi detido.

"Com uma grave crise econômica, sanções, falta de reconstrução, acesso limitado a serviços básicos e oportunidades de emprego, retornar à Síria muitas vezes significa voltar à estaca zero", afirma Nanar Hawach, analista sênior para a Síria do Grupo de Crise Internacional (International Crisis Group), uma organização independente que trabalha na prevenção e resolução de conflitos.

Turquia deportou mais de 57 mil desde 2023

Após o início da guerra na Síria em 2011, cerca de 3,6 milhões de sírios fugiram para a Turquia.

Mas nem todos ficaram e os grupos de direitos humanos observaram recentemente um aumento nos retornos forçados.

Continua após a publicidade

Desde janeiro de 2023, mais de 57 mil sírios foram deportados para a região de Idlib, que é o último reduto das milícias e da oposição na Síria.

A região também se tornou conhecida por suas terríveis circunstâncias econômicas e humanitárias, que se intensificaram ainda mais após o terremoto mortal de fevereiro de 2023.

Devido à alta taxa de desemprego na região, Basmaji não consegue encontrar um emprego estável e faz bicos na construção civil. "Não é o suficiente para pagar as contas", afirma.

Ele também não pode se juntar à sua família em Aleppo, já que a cidade foi recapturada há muito tempo pelas forças sírias.

"Na melhor das hipóteses, eles me forçarão a entrar no exército, onde serei morto ou terei de matar outros sírios; na pior, desaparecerei e morrerei na prisão", diz ele pragmático.

Serviço militar obrigatório

Continua após a publicidade

Na Síria, homens com menos de 42 anos de idade são obrigados a servir no Exército por tempo indeterminado.

"O alistamento não significa apenas que a vida dos homens está em perigo, mas também afeta financeiramente famílias inteiras, pois sem o salário do alistado, a família não consegue cobrir seus itens básicos de alimentação", explica Hawach.

"Atualmente há conversas em Damasco para tentar aliviar as preocupações dos repatriados em relação ao alistamento e às questões de segurança", diz Hawach à DW.

No entanto, há também outros aspectos que provavelmente continuarão a reduzir o número de repatriados do sexo masculino.

Embora muitos sírios tenham perdido suas propriedades durante a guerra devido à destruição, ao confisco ou à falta de documentação, os repatriados são especialmente vulneráveis, relata Hawach.

"O apoio financeiro aos repatriados é quase inexistente", afirma.

Continua após a publicidade

A Agência da ONU para Refugiados (Acnur) tem dito repetidamente que a Síria ainda não é suficientemente segura.

Além disso, a Rede Síria de Direitos Humanos (Syrian Network for Human Rights) afirma que milhares de repatriados voluntários e não voluntários foram presos após retornar da Turquia e do Líbano.

Deportações forçadas também no Líbano

A situação no Líbano é diferente, pois o país compartilha quase 400 km de fronteira com as áreas sírias sob o controle de al-Assad.

"A Segurança Geral do Líbano financia as viagens de retorno à fronteira depois de acertar os nomes dos repatriados com o regime de al-Assad", diz à DW Muhsen AlMustafa, pesquisador de segurança e forças armadas na Síria do Centro de estudos estratégicos Omran, um think tank com sede em Istambul.

E apesar das autoridades libanesas afirmarem que o retorno dos refugiados sírios é totalmente voluntário, a organização de direitos humanos Access, com sede em Beirute, documentou 763 casos de deportação forçada para a Síria em 2023 e outros 433 entre janeiro e maio de 2024.

Continua após a publicidade

Um dos deportados foi Trad, de 27 anos, detido por não ter uma autorização oficial de residência. "As autoridades exigiram uma fiança de 750 milhões de libras libanesas (R$ 46,6 mil) para libertá-lo", conta o pai dele, Mamdouh, de 63 anos, à DW em Beirute.

Depois que ele pagou a fiança e foi buscar o filho, as autoridades o informaram que Trad já havia sido deportado para a Síria.

"Desde então, ele desapareceu", diz preocupado.

As esperanças de Mamdouh estão nas ONGs de direitos humanos e na ONU, que vêm pedindo a governos como os da Turquia e do Líbano que garantam que os recursos internacionais que recebem não sejam destinados para violações de direitos, e que se procure uma solução política para o conflito na Síria.

Colaborou Rola Farhat, da DW no Líbano.

Autor: Jennifer Holleis

Deixe seu comentário

Só para assinantes