Marçal naufraga abraçado a bolsonaristas e deve ficar inelegível por 8 anos
O fato de Pablo Marçal ter ficado fora do segundo turno à Prefeitura de São Paulo é um alívio para a democracia, mas também para a Justiça Eleitoral. Mas a sua votação expressiva é um alerta de que São Paulo quase chancelou uma candidatura que atualizou o bolsonarismo mais radical empunhando a mentira como método e a agressão como caminho.
Não havia outra opção para a Justiça a não ser cassação de sua candidatura ou de seu mandato, caso eleito, após ele ter tentado manipular a eleição divulgando um laudo falso que vinculava Guilherme Boulos ao uso de cocaína. Como uma decisão final da Justiça seria tomada só após o segundo turno, o risco de que a cassação levasse a novas manifestações violentas por parte da extrema direita era real.
Devido à sabedoria de parte do eleitorado paulistano, ele foi excluído pelas urnas, ficando em terceiro lugar, menos de um ponto atrás de Boulos, que disputará com o prefeito Ricardo Nunes o segundo turno. Ironicamente, o laudo falso contribuiu com a própria derrota. Se não tivesse divulgado a fake grotesca na sua rede, é provável que teria terminado à frente do deputado e não 56.853 votos atrás.
Um alívio para a instituição comandada pela ministra Cármen Lúcia, que poderá processá-lo, condená-lo e declará-lo inelegível por oito anos sem o risco de algo parecido com um 8 de janeiro. Se quiser ser presidente, como já declarou, ele provavelmente terá que esperar as eleições de 2034.
Marçal espancou diariamente a democracia enquanto foi candidato. Acusou Tabata Amaral de ser responsável pelo suicídio do próprio pai, Guilherme Boulos de ser usuário de drogas proibidas, José Luís Datena de ser um estuprador e prometeu prender Ricardo Nunes. Além disso, baseou sua campanha num ecossistema ilegal que remunerava quem produzisse material irregular de campanha que o beneficiava.
Quando a Justiça Eleitoral agia para evitar que continuasse atacando a lisura das eleições, ele dava de ombros, encontrava um subterfúgio e atropelava a decisão. A não punição de Pablo Marçal, portanto, significará uma luz verde para que os candidatos nas próximas eleições adotem o mesmo ecossistema. O mínimo que se espera do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo e do Tribunal Superior Eleitoral é a cassação e a inelegibilidade, conforme já preveem a lei e a jurisprudência.
Ter Pablo Marçal fora do segundo turno também significa a possibilidade, mesmo que remota, de o debate público ocorrer em torno de propostas e ideias mais do que de ataques pessoais e baixaria. Agoram, mesmo que duro e áspero, a disputa pode, ao menos, ficar dentro do campo democrático. Só o fato de não haver o risco de São Paulo eleger uma pessoa que, em nome da democracia, espanque a democracia, já é um alívio.
Não menos importante é que a derrota de Marçal também afasta a cúpula do seu partido de aluguel, o PRTB, de ter acesso direto ao maior orçamento municipal do país. O presidente da agremiação, Leonardo Avalanche, entre outros membros que ocuparam altos cargos, são acusados de terem relação com o Primeiro Comando da Capital. Ou seja, o voto evitou que PCC, que já lava dinheiro via companhia de ônibus na capital, adentrasse as portas do Palácio Matarazzo.
Importante ressaltar que nomes do bolsonarismo-raiz que se juntaram a Pablo Marçal, como os dos deputados federais Nikolas Ferreira (PL-MG), Carla Zambelli (PL-SP) e Ricardo Salles (Novo-SP), também perdem junto com o coach. Eles fizeram um movimento à revelia de seus partidos para estarem junto com aquele que promete renovar a extrema direita. Agora, é justo que também amarguem a derrota.
Mas que ninguém se engane. O tamanho de sua votação (28%) mostra que é grande o desafio para fortalecer as instituições e consolidar a democracia no Brasil.
Quase um terço dos eleitores da maior cidade do país chancela uma pessoa que agiu de forma violenta, desonesta e ilegal. Parte deles porque acha que pode ganhar dinheiro com isso, parte porque caiu no lero-lero de coach de vida, parte porque acha engraçado, parte porque quer que tudo vá para o espaço.
Em tempo: Jair Bolsonaro evitou entrar de cabeça na eleição de Nunes, que seu partido apoia, com medo que seus seguidores mais radicais, que apoiaram o coach, lhes dessem as costas. Agora que Marçal perdeu, ele sai da toca. Não se sabe o que o Bolsonaro fará, mas, para Nunes, talvez seja melhor ficar longe dele, que tem na capital uma alta rejeição. E fala demais.