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Ban Ki-moon deixa a ONU após uma década de luzes e sombras

31/12/2016 16h16

Mario Villar.

Nações Unidas, 31 dez (EFE).- Ban Ki-moon termina neste sábado seu mandato como secretário-geral das Nações Unidas após uma década de luzes e sombras à frente da organização internacional.

O diplomata coreano deixa seu posto ao português António Guterres, nomeado no último mês de outubro e que oficialmente inicia seu trabalho no dia 1º de janeiro.

Discreto e criticado por sua falta de carisma, Ban será recordado por sua defesa dos direitos humanos e do meio ambiente, mas também por seu pouco impacto na política internacional e pela lentidão de algumas de suas decisões.

Em seu legado se destacam principalmente dois grandes pactos internacionais: o Acordo de Paris contra a mudança climática e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.

Ban se erigiu desde o primeiro momento como um dos grandes defensores de um pacto global sobre o clima, alertando várias vezes para o enorme perigo do aquecimento global para todos os habitantes do planeta.

Após anos de complexas negociações, obteve seu objetivo em 2015, quando 197 países se comprometeram em Paris com medidas para limitar o aumento das temperaturas.

Também nesse ano Ban pôde ver concretizada outra de suas grandes metas com a aprovação da chamada Agenda 2030, o plano de desenvolvimento e contra a pobreza que substitui os Objetivos do Milênio.

A defesa dos direitos humanos - com uma atenção especial à situação da mulher e dos homossexuais - foi outro dos elementos centrais da gestão de Ban, que passará à história como o primeiro secretário-geral da ONU a declarar-se feminista.

No lado negativo, se algo foi criticado de forma generalizada foi sua falta de liderança.

Ban ganhou rapidamente o rótulo de "homem invisível" e, apesar de suas tentativas nos últimos meses, não foi capaz de mudá-lo em dez anos.

Limitado por sua falta de fluência em inglês e francês e seu estilo pausado, o coreano não conseguiu se transformar nunca em uma voz de verdadeiro peso no cenário internacional, apesar dos elogios que sua diplomacia discreta colheu em muitas ocasiões.

Sob sua liderança, a ONU não teve muito êxito em seus esforços em vários conflitos africanos, nem no processo de paz do Oriente Médio, nem perante a ameaça nuclear da Coreia do Norte.

No entanto, o maior ponto negro para muitos analistas foi a gestão dos conflitos abertos após as chamadas primaveras árabes, com a guerra síria no centro.

O próprio Ban reconheceu recentemente que "a continuação do pesadelo na Síria" é seu maior remorso.

O certo é que as Nações Unidas conviveram durante os últimos anos com potências cada vez mais divididas, algo que deixou o Conselho de Segurança com pés e mãos atados, e como consequência toda a organização, em muitas destas crises.

À medida que se aproximava do final de seu mandato, Ban foi se libertando também de suas próprias correntes e mostrando-se mais crítico perante as atitudes de certos governos.

Essa postura, que muitos críticos tinham lhe exigido durante anos, lhe fez deparar este ano com vários conflitos diplomáticos, ressaltando a dificuldade do posto e os malabarismos aos quais seus ocupantes se veem obrigados frequentemente.

No plano interno, Ban também foi criticado por sua gestão de vários problemas, como o surto de cólera no Haiti, que segundo vários estudos foi levado à ilha por "boinas azuis" da ONU em 2010.

Durante anos a organização se recusou a aceitar sua responsabilidade, fazendo valer sua imunidade perante os tribunais, até que finalmente neste ano assumiu que teve um papel na epidemia e anunciou novas medidas para ajudar os afetados.

A reputação das Nações Unidas e de suas forças de paz também sofreu após a divulgação de vários casos de abusos sexuais cometidos pelas tropas desdobradas na República Centro-Africana.

Ban tomou medidas, mas só quando o escândalo já era público, e depois que a ONU atuou contra o funcionário que vazou detalhes sobre o problema.

Após dez anos sem respiro, Ban deve tirar alguns dias de descanso antes de retornar à Coreia do Sul, que vive uma grave crise política e onde seu nome soa como um dos favoritos para concorrer à presidência.

Em seu último discurso nas Nações Unidas, na sexta-feira, para despedir-se do pessoal que o acompanhou durante dez anos, Ban declarou que teve que enfrentar muitos desafios e qualificou como um privilégio ter estado à frente da organização.

Também afirmou que durante sua gestão se empenhou em pôr sua voz para defender os sem voz, e pediu à ONU que batalhe por um de seus princípios: "seguir sonhando, seguir acreditando, e seguir trabalhando duro".