Espanha vive ano conturbado na política que é apenas uma prévia de 2019
Rafael Cañas.
Madri, 20 dez (EFE).- A Espanha fecha um ano político muito conturbado, com a primeira moção de censura bem-sucedida da democracia, além do desafio independentista na Catalunha e do crescimento da extrema-direita, enquanto o país se prepara para um 2019 ainda mais intenso.
O ano que está acabando é apenas uma prévia do que vem, já que é praticamente certo que haverá eleições legislativas antecipadas, além dos pleitos local, regional e europeu já previstos para 26 de maio e do início do julgamento dos líderes independentistas catalães.
O ano de 2018, que esteve marcado desde o princípio pela questão da Catalunha, sofreu uma mudança brusca com a sentença em maio do famoso caso de corrupção Gurtel, que condenou o então governante Partido Popular (PP, conservador) como beneficiado econômico deste esquema corrupto.
Após essa sentença, o líder do Partido Socialista (PSOE, a principal legenda opositora), Pedro Sánchez, apresentou uma moção de censura contra o presidente de governo, Mariano Rajoy.
Sánchez recebeu o apoio de uma aliança heterogênea com a esquerda do Unidos Podemos, regionalistas das Ilhas Canárias e nacionalistas e independentistas bascos e catalães, chegando ao poder em junho.
Mas o PSOE só tem 84 das 350 cadeiras do Congresso, o que forma um governo "muito frágil", disse à Agência Efe Jaime Ferri, diretor do Departamento de Ciência Política e Sociologia da Universidade Complutense de Madri.
Assim, cada medida legislativa requer negociações árduas com vários partidos, às vezes, inclusive com os liberais do Ciudadanos (C's), normalmente mais alinhados com a direita na oposição.
Essa mudança à frente do governo foi totalmente inesperada e gerou um autêntico tsunami político cujos efeitos ainda não terminaram de se dissipar.
Após o fim brusco de seus seis anos e meio à frente do governo, Rajoy deixou a política e foi sucedido no comando do PP, também de forma inesperada, por Pablo Casado, um jovem de 37 anos que venceu a mais experiente ex-vice-presidente Soraya Sáenz de Santamaría.
Casado iniciou uma política de oposição implacável que acusa continuamente Sánchez de depender dos independentistas catalães e do antigo braço político do extinto grupo terrorista basco ETA.
Assim, o tom do debate político tornou-se muito virulento. Para Ferri, isto se deve ao fato de o cenário do centro e da direita ter se tornado "muito volátil", com Ciudadanos, PP e o partido de extrema-direita Vox lutando para aglutinar votos opositores, o que fez com que a linguagem passasse a expressar "posições mais radicais".
Sánchez, por sua vez, nomeou um governo com técnicos respeitados e figuras muito bem avaliadas, e lançou uma ambiciosa agenda social para reverter os cortes sociais aplicados por Rajoy.
O presidente de governo também deu início à medida legislativa para remover os restos mortais do ditador Francisco Franco de seu túmulo, que fica em um monumento estatal.
No entanto, o professor Ferri acredita que o governo foi "muito acanhado" com algumas dessas medidas, anunciadas rapidamente para "ganhar imagem" sem estarem totalmente fechadas as alianças parlamentares e os textos legislativos para colocá-las em prática.
Ao invés de ouvir as vozes que sugeriam a convocação de eleições após o verão europeu, aproveitando o seu bom momento nas pesquisas, Sánchez decidiu se manter acima da onda política favorável.
Mas o líder socialista está atado porque seu apoio parlamentar é muito frágil e depende de dois partidos independentistas catalães (ERC e PdeCAT), que rejeitaram apoiar o orçamento se o governo não ceder às suas exigências ilegais, como a libertação dos líderes independentistas presos e um referendo de autodeterminação.
Nesse contexto, as eleições regionais da Andaluzia em 2 de dezembro se apresentavam como um termômetro da situação, e a temperatura mostrou uma mudança radical.
Em uma região governada pelo PSOE durante os 36 anos de sua autonomia política, a esquerda perdeu pela primeira vez a maioria e o partido de extrema-direita Vox, que até então tinha apoio residual, alcançou quase 11% dos votos e 12 das 109 cadeiras.
Apesar de parte desse resultado ser atribuído a um voto de castigo sobre os partidos tradicionais, a Espanha se viu de repente diante de um súbito crescimento da extrema-direita, do qual acreditava ser imune apesar da tendência em outros países europeus.
Assim, Ferri considera que 2019 é "imprevisível", ainda mais com o início do julgamento dos líderes independentistas catalães.
Por isso, o professor acredita que Sánchez buscará "um respiro", seja com a aprovação do orçamento na última hora, o que lhe daria até um ano e meio de margem, ou com grandes medidas sociais como o aumento de 22,3% no salário mínimo.
Este ano também ficou marcado pela dissolução final do ETA, após cinco décadas de atividade terrorista e mais de 850 assassinatos, segundo os números oficiais. O grupo terrorista basco já tinha declarado o cessar definitivo da violência em 2011.
Além disso, em 2018 foi comemorado o 40º aniversário da Constituição democrática. Em comparação com a unidade política da época de sua promulgação, agora se destaca o consenso "zero" sobre uma possível reforma que todos pedem, mas sobre a qual ninguém coincide, outro símbolo da grande divisão nos discursos políticos. EFE
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