Kotscho: O que levou o 'imperador do Japão' a pensar em ser candidato?

"E por que não?", poderiam responder os seguidores do todo poderoso presidente da Câmara, o alagoano Arthur César Pereira de Lira, que acabou de abocanhar esta semana mais uma joia da coroa: o comando da Caixa Econômica Federal, principal gestor e financiador das políticas públicas do governo federal.

A lista de territórios já conquistados no atual governo é longa, a ponto de ser tratado como um primeiro-ministro de fato, que divide o poder meio a meio com Lula 3, em troca de votos do seu Centrão, que já controla o plenário da Câmara, o Incra, a Codevasf, a CBTU, o Dnocs e até o porto de Maceió.

Só por curiosidade, depois de ler uma pesquisa do Instituto Paraná Pesquisas sobre a eleição presidencial de 2026, Lira comentou com seus aliados que gostaria de ver seu nome incluído na próxima lista de candidatos para saber como se sairia, informou a colunista Bela Megale, no Globo de quinta-feira. Lira nunca teve tanto poder como agora nem no governo de Jair Bolsonaro, que o ajudou a se eleger presidente da Câmara pela primeira vez, em 2021, legítimo herdeiro político da tropa de choque de Eduardo Cunha, um fantasma que continua assombrando o PT.

Lira se apressou a desmentir a notícia no mesmo dia, garantindo que será apenas candidato a senador por Alagoas em 2026. Mas muita gente ficou com a pulga atrás da orelha. Parece mesmo que o poder lhe subiu à cabeça.

Nem faz muito tempo, em maio de 2022, o mesmo Lula, que agora lhe cede os anéis para não entregar os dedos, em meio à discussão do projeto de semipresidencialismo que Lira pretendia aprovar, o acusou de se comportar como "imperador do Japão" para tirar o poder do presidente, então Jair Bolsonaro. Disse Lula:

"Se a gente ganhar as eleições e o atual presidente da Câmara continuar com o poder imperial, ele já está querendo criar o semipresidencialismo. Ele já quer tirar o poder do presidente para que o poder fique na Câmara dos Deputados e ele aja como se fosse o imperador do Japão".

O Japão, como sabemos, é uma monarquia constitucional com regime parlamentar democrático. Tem um chefe de governo, o primeiro-ministro, e um chefe de Estado, posto ocupado pelo imperador Naruhito, que tem uma função apenas cerimonial.

Reeleito para o comando das Câmara no início do governo Lula, com a ajuda do PT, ele não só manteve os cargos que já tinha com o presidente anterior, como avançou sobre outros, em ministérios, autarquias e estatais, e está de olho agora na Fundação Nacional da Saúde (Funasa), sem abrir mão do orçamento secreto cada vez maior e das emendas de relator, o núcleo do seu poder.

Na pesquisa que animou Lira, Lula aparece com 36,6% das intenções de votos e o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, seria seu principal concorrente em 2026, com 12,7% dos votos. Com Bolsonaro fora de combate até 2030, por decisão do Tribunal Superior Eleitoral, abriu-se uma avenida de oportunidades na faixa que vai da direita à extrema-direita para as próximas eleições.

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É nesse vácuo de lideranças competitivas no campo conservador para enfrentar Lula ou quem for seu candidato em 2026, que Arthur Lira deve ter pensado em se apresentar. Poderia até lançar o slogan "Chega de intermediários, Lira para presidente".

Como controla as três principais bancadas temáticas da Câmara — do boi, da bíblia e da bala —, apoio parlamentar certamente não lhe faltaria, assim como tem também bom trânsito no mercado da Faria Lima e no meio empresarial, da mesma forma como Bolsonaro tinha quando se lançou candidato em 2018, e ninguém levava sua candidatura a sério, a não ser alguns setores de imprensa que logo o normalizaram com a teoria da "difícil escolha".

De quase desconhecido da maioria do eleitorado no início da campanha a líder nas pesquisas, depois da facada de Juiz de Fora e da prisão de Lula, foi um salto no escuro que ninguém imaginava. Bom lembrar que somos um país imprevisível e ainda faltam mais de três anos para a próxima eleição.

Para demonstrar ao governo todo seu poder, como se ainda precisasse disso, no mesmo dia em que Lula demitiu a presidente da Caixa, Rita Serrano, posto cobiçado havia meses pelo Centrão, Lira desempacou a pauta econômica do governo e botou para votar a taxação dos super-ricos e das offshores, aprovada por 323 a 119, que é agora, no papel, mais ou menos a base de apoio de Lula na Câmara.

Mas isso não garante nada. A cada votação, haverá nova pressão por cargos e emendas, um saco sem fundo do que se pode chamar de semiparlamentarismo chantagista, que tomou o lugar do presidencialismo de coalizão dos dois primeiros mandatos de Lula. É a versão parlamentar do "dá ou desce". Vai chegar uma hora em que faltarão anéis e dedos para entregar ao Centrão, de olho gordo no momento para abocanhar a maior parte do orçamento de 2024.

Com as chaves dos cofres públicos nas mãos da turma de Lira, a cadeira presidencial poderá passar a ser apenas um mero detalhe na hierarquia do poder, uma fotografia na parede, se o presidente Lula não reagir a tempo contra o avanço do "imperador do Japão".

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Opinião

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